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Papers by Luis Sales Sales

Research paper thumbnail of A Memória, a história e o esquecimento - Paul Ricoeur

A Memória, a história e o esquecimento (2007) é a tradução brasileira de uma das últimas obras de... more A Memória, a história e o esquecimento (2007) é a tradução brasileira de uma das últimas obras de Paul Ricoeur (1913-2005). Como é característica de seu empreendimento teórico fragmentário, esta obra vem preencher certa "lacuna" no seu percurso intelectual mais recente. Memória e esquecimento, são "níveis in-termediários" entre a experiência temporal humana e a operação narrativa, temas amplamente discutidos em Tempo e narrativa, e Si-mesmo como um outro, obras com as quais podemos conceber um vínculo mais direto. Há certo exagero em ver neste livro uma espécie de "suma" do trabalho do autor, como menciona Mario Seligmann-Silva na orelha da tradução de Alain Fran-çois, embora haja uma continuidade de seu engajamento teórico mais reconhecido e uma reconciliação com as tradições fenomenológica e historiográfi ca da França. Há também a retomada de temas que estão em continuidade com seu projeto da juventude como Finitude e culpabilidade e a coletânea de ensaios História e ver-dade. Mas é claro que só devemos compreender essa retomada num movimento em espiral, após um longo desvio de percurso. A complexidade da obra exigiu que o autor inaugurasse um novo recurso, as "notas de orientação" que pipocam a cada novo capítulo. A parte dois e três é precedida também de um prelúdio que tem a intenção de apresentar a tensão entre memória e história e história e existência. Esse é o motivo de não haver prelúdio na primeira parte. Cada parte do livro, dividido em três capítulos, desenvolve níveis metodológi-cos distintos. A primeira parte é decisiva, uma vez que as aporias da memória reper-cutem em toda a obra. O mesmo pode ser dito do esquecimento, que é anunciado em todo o percurso e fi gura em pé de igualdade com memória e história, pois essa dupla dimensão do passado se perde quando há esquecimento. A primeira parte desenvolve uma fenomenologia da memória, que parte da convicção do autor, face a Husserl, da primazia da intencionalidade objetal sobre a problemática egológica. Essa decisão metodológica joga o problema do sujeito da memória para o último capítulo dessa primeira parte. No plano da memória, a primazia concedida durante muito tempo à questão "quem", à idéia de que o su-jeito gramatical da memória é o "eu", suscitou um grande impasse, com a entrada em cena da memória coletiva. Ricoeur parte primeiro da coisa ("o quê?") para, na seqüência, tratar da questão do sujeito ("quem?") que, então, será extensiva a todas as pessoas gramaticais, ao si, aos outros, aos estrangeiros, aos próximos, constituindo a memória coletiva de interesse particular para a história. A intencionalidade objetal da memória revela uma primeira aporia, o aspecto cognitivo e pragmático que remete ao uso dos termos gregos mnèmè e anamnèsis, os quais signifi cam, respectivamente, ter uma lembrança e ir em busca dessa lembrança. Assim, a memória é dada e exercida e a questão "o quê?" desdobra-se na questão "como?". Essa aporia subdivide os dois primeiros capítulos da primeira parte. Resenha Filosofi a Unisinos 9(3):281-283, set/dez 2008

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A Memória, a história e o esquecimento (2007) é a tradução brasileira de uma das últimas obras de... more A Memória, a história e o esquecimento (2007) é a tradução brasileira de uma das últimas obras de Paul Ricoeur (1913-2005). Como é característica de seu empreendimento teórico fragmentário, esta obra vem preencher certa "lacuna" no seu percurso intelectual mais recente. Memória e esquecimento, são "níveis in-termediários" entre a experiência temporal humana e a operação narrativa, temas amplamente discutidos em Tempo e narrativa, e Si-mesmo como um outro, obras com as quais podemos conceber um vínculo mais direto. Há certo exagero em ver neste livro uma espécie de "suma" do trabalho do autor, como menciona Mario Seligmann-Silva na orelha da tradução de Alain Fran-çois, embora haja uma continuidade de seu engajamento teórico mais reconhecido e uma reconciliação com as tradições fenomenológica e historiográfi ca da França. Há também a retomada de temas que estão em continuidade com seu projeto da juventude como Finitude e culpabilidade e a coletânea de ensaios História e ver-dade. Mas é claro que só devemos compreender essa retomada num movimento em espiral, após um longo desvio de percurso. A complexidade da obra exigiu que o autor inaugurasse um novo recurso, as "notas de orientação" que pipocam a cada novo capítulo. A parte dois e três é precedida também de um prelúdio que tem a intenção de apresentar a tensão entre memória e história e história e existência. Esse é o motivo de não haver prelúdio na primeira parte. Cada parte do livro, dividido em três capítulos, desenvolve níveis metodológi-cos distintos. A primeira parte é decisiva, uma vez que as aporias da memória reper-cutem em toda a obra. O mesmo pode ser dito do esquecimento, que é anunciado em todo o percurso e fi gura em pé de igualdade com memória e história, pois essa dupla dimensão do passado se perde quando há esquecimento. A primeira parte desenvolve uma fenomenologia da memória, que parte da convicção do autor, face a Husserl, da primazia da intencionalidade objetal sobre a problemática egológica. Essa decisão metodológica joga o problema do sujeito da memória para o último capítulo dessa primeira parte. No plano da memória, a primazia concedida durante muito tempo à questão "quem", à idéia de que o su-jeito gramatical da memória é o "eu", suscitou um grande impasse, com a entrada em cena da memória coletiva. Ricoeur parte primeiro da coisa ("o quê?") para, na seqüência, tratar da questão do sujeito ("quem?") que, então, será extensiva a todas as pessoas gramaticais, ao si, aos outros, aos estrangeiros, aos próximos, constituindo a memória coletiva de interesse particular para a história. A intencionalidade objetal da memória revela uma primeira aporia, o aspecto cognitivo e pragmático que remete ao uso dos termos gregos mnèmè e anamnèsis, os quais signifi cam, respectivamente, ter uma lembrança e ir em busca dessa lembrança. Assim, a memória é dada e exercida e a questão "o quê?" desdobra-se na questão "como?". Essa aporia subdivide os dois primeiros capítulos da primeira parte. Resenha Filosofi a Unisinos 9(3):281-283, set/dez 2008