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Papers by Matheus Schmaelter
Revista Instante, 2024
RESUMO: No quarto capítulo da obra kierkegaardiana O conceito de angústia, de 1844, o autor pseud... more RESUMO: No quarto capítulo da obra kierkegaardiana O conceito de angústia, de 1844, o autor pseudônimo Vigilius Haufniensis dedica um considerável número de páginas à descrição do fenômeno do demoníaco. Tendo em vista que a obra em questão apresenta a liberdade como elemento ontológico da existência humana, o nome do fenômeno se justifica pela perversão do uso da liberdade: apresentado como "angústia diante do bem," em que o bem é identificado com a liberdade, a pessoa que se encontra na condição do estado do demoníaco utiliza-se da liberdade em nome da não-liberdade, produzindo uma existência caracterizada pelo fechamento hermético e pelo súbito, expressos como mutismo e negação do movimento. Ora, no ano anterior à publicação da obra em questão, Kierkegaard havia publicado, sob o pseudônimo Johannes de Silentio, Temor e tremor, na qual apresenta Abraão como um paradigma da existência na fé. Tal existência aparece caracterizada pela tarefa, pelo silêncio, pelo salto enquanto duplo movimento da fé e, implicitamente, pelo instante, sendo todos estes conceitos importantes no interior da filosofia kierkegaardiana da existência como um todo. Neste artigo, pretendemos demonstrar como o demoníaco, manifesto como fechamento hermético e como súbito, aparece como paródia do tipo de existência caracterizado por Abraão, em Temor e tremor, na medida em que expõe, por assim dizer, versões distorcidas daqueles conceitos que tipificam a existência na fé. Por fim, apresentamos uma possibilidade interpretativa de como a paródia do demoníaco pode se manifestar como um contraste necessário e um momento retificador para a existência. PALAVRAS-CHAVE: Demoníaco. Paródia. Existência.
Trilhas Filosóficas, Mar 13, 2023
Dossiê Aristóteles dito de muitos modos-Fluxo Contínuo Resumo: O presente artigo visa, sob uma pe... more Dossiê Aristóteles dito de muitos modos-Fluxo Contínuo Resumo: O presente artigo visa, sob uma perspectiva existencial e fundamentada na tradição cristã, refletir a respeito da problemática relação entre a fé e a finitude, de modo a apontar que a primeira só encontra-se plena na experiência da finitude, no que denominamos no título de retomada do mundo. Para isso, primeiramente analisamos a chamada theologia crucis, de Lutero, apresentada no Debate de Heidelberg, em que o reformador alemão defende, em posição crítica à escolástica, que o conhecimento de Deus só é possível naquilo que é visível, a saber, o Cristo crucificado. Em seguida, vemos como Kierkegaard, através do pseudônimo Johannes de Silentio em Temor e tremor, descreve a experiência da fé como um duplo movimento de resignação e retomada, caracterizando a fé no interior de uma experiência existencial paradoxal, que vive na tensão entre a finitude e a infinitude.
Trilhas Filosóficas, 2023
O presente artigo visa, sob uma perspectiva existencial e fundamentada na tradição cristã, reflet... more O presente artigo visa, sob uma perspectiva existencial e fundamentada na tradição cristã, refletir a respeito da problemática relação entre a fé e a finitude, de modo a apontar que a primeira só encontra-se plena na experiência da finitude, no que denominamos no título de retomada do mundo. Para isso, primeiramente analisamos a chamada theologia crucis, de Lutero, apresentada no Debate de Heidelberg, em que o reformador alemão defende, em posição crítica à escolástica, que o conhecimento de Deus só é possível naquilo que é visível, a saber, o Cristo crucificado. Em seguida, vemos como Kierkegaard, através do pseudônimo Johannes de Silentio em Temor e tremor, descreve a experiência da fé como um duplo movimento de resignação e retomada, caracterizando a féno interior de uma experiência existencial paradoxal, que vive na tensão entre a finitude e a infinitude.
A partir de uma analise das obras Temor e tremor, A Repeticao e do discurso edificante Fortalecen... more A partir de uma analise das obras Temor e tremor, A Repeticao e do discurso edificante Fortalecendo o homem interior, do filosofo e teologo dinamarques Soren Kierkegaard, o presente trabalho visa apresentar como a fe, juntamente com a categoria da ‘repeticao,' conceito tambem central no pensamento do filosofo, aparece como elemento fundamental para que o ser humano torne-se si mesmo e, portanto, um individuo singular. Referencias Bibliograficas BIBLIA DE JERUSALEM. Sao Paulo: PAULUS, 2002. GLENN Jr., John D. The Definition of the Self and the Structure of Kierkegaard's Work. In.: Perkins, Robert L. (org.). International Kierkegaard Commentary: The Sickness Unto Death. Georgia: Mercer University Press, 1987. KIERKEGAARD, Soren. Concluding Unscientific Postscript. Edited and translated by Howard V. Hong and Edna H. Hong. Princiton: Princiton University Press, 1992. _____. Repetition and Philosophical Crumbs. Translated By M.G. Piety with an introduction by Edward F. Mooney and...
Na segunda parte da obra publicada em 1849, intitulada A doença para a morte (Sygdomen til Døden)... more Na segunda parte da obra publicada em 1849, intitulada A doença para a morte (Sygdomen til Døden), o filósofo e teólogo dinamarquês Søren Kierkegaard, através do pseudônimo Anti-Climacus, trata da existência individual do ser humano a partir de categorias tipicamente cristãs, realizando assim um movimento caracteristicamente teológico de pensamento, que dará tom predominante a toda a obra em questão. Pretendemos, neste artigo, analisar sua reflexão a respeito da categoria do pecado enquanto uma categoria existencial. Para tanto, recorremos à chamada teologia da cruz, do reformador Matinho Lutero, a fim de apontar os fundamentos que a sustentam.
Paper apresentado na XV Semana de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade do Estado do Rio de ... more Paper apresentado na XV Semana de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Esta dissertação busca refletir a respeito da existência individual tal qual ela se dá no interio... more Esta dissertação busca refletir a respeito da existência individual tal qual ela se dá no interior do estágio religioso, um dos três estágios existenciais concebidos por Søren Kierkegaard. Tal existência se realiza em uma vida vivida pela fé, onde a fé é o modo pelo qual o indivíduo se relaciona com a realidade. Tal reflexão será desenvolvida em três capítulos. No primeiro será analisada a primeira parte da obra A doença para a morte, de 1849. Nesta análise apresentaremos e refletiremos a respeito dos conceitos centrais da antropologia kierkegaardiana, a condição humana como síntese de elementos opostos previamente dada, o si-mesmo como tal relação relacionando-se consigo mesma, o desespero como instabilidade entre os elementos da síntese e de que formas o desespero se manifesta. No segundo capítulo apresentaremos o desespero enquanto pecado, trazendo à nossa reflexão um ambiente mais propriamente teológico à questão do desespero e da existência humana, analisando a humanidade não mais a partir de si mesma mas sim a partir de sua existência diante de Deus. Aqui, Deus é o critério para o si-mesmo humano. Por fim, na terceira e última parte deste trabalho pretendemos apresentar o cavaleiro da fé, paradigma apresentado na obra Temor e tremor, de 1843, como aquele que é a imagem do indivíduo plenamente livre do desespero.
Conference Presentations by Matheus Schmaelter
Em O conceito de angústia, de 1844, Kierkegaard, através do pseudônimo Vigilius Haufniensis, defi... more Em O conceito de angústia, de 1844, Kierkegaard, através do pseudônimo Vigilius Haufniensis, define a categoria do demoníaco como “angústia diante do bem.” Dado o tema fundamental da obra em que esta categoria aparece, o bem deve ser entendido, e o é pelo autor, como a liberdade, aí apresentada como característica fundamental da existência humana. Ou seja, a liberdade está aí ontologicamente presente. Sendo assim, angustiar-se diante do bem é angustiar-se ante a sua própria liberdade e, tendo em vista o caráter ontológico desta, escolher, livremente, a não liberdade. Tendo isto em vista, aquele que assim apresenta a angústia não é, contudo, aniquilado no momento em que ela assim se manifesta, mas continua existindo sem assumir, entretanto, a responsabilidade própria da existência que é a sua, apresentando nada mais que uma paródia daquela existência defendida por Kierkegaard e levada a cabo por aquele que o autor dinamarquês chamou de indivíduo singular que, em contrapartida à existência paródica, assume a completa responsabilidade implicada em uma existência assumidamente livre. Esta é uma paródia na medida em que apresenta características muito semelhantes às daquela existência que pode ser identificada como autêntica, no sentido de tomá-la na seriedade da responsabilidade, como o salto, por exemplo, mas de forma negativa. Mas a leitura somente de O conceito de angústia não se mostra suficiente para a identificação do demoníaco como uma paródia da existência, de modo que se faz necessário o diálogo com outra obra do corpus kierkegaardiano, especificamente Temor e tremor, publicada um ano antes. Nesta obra vemos que o autor, desta vez através do pseudônimo Johannes de Silentio, utiliza-se do exemplo do personagem bíblico Abraão para apresentar como seria a existência levada a cabo tendo como fundamento a fé, que modo que um indivíduo que assim vivesse pode ser designado de cavaleiro da fé, tal qual o é Abraão, de acordo com o autor pseudônimo. Tomando Abraão como paradigma desta existência, Johannes de Silentio analisa a narrativa bíblica do sacrifício de Isaac por Abraão, seu pai, demandada por Deus. Aí, destacam-se quatro elementos apresentados pelo autor pseudônimo, a saber: movimento, fé, instante e silêncio. Estes elementos chamam a atenção por serem semelhantes a outros, utilizados por Vigilius Haufniensis para tipificar o demoníaco: o hermetismo (ou fechamento hermético) e o súbito. Além disso, nos valemos das palavras de Johannes de Silentio, ao afirmar que “o demoníaco tem a mesma propriedade do divino, a de o singular poder entrar em relação absoluta com ele.” Tendo isto em mente, o presente trabalho visa, primeiramente, explicitar o sentido dos elementos acima apresentados e como tipificam, por um lado, uma existência na fé e, por outro, uma no demoníaco, que podem ser também denominadas existências, respectivamente, autêntica e inautêntica. Em seguida, pretende-se demonstrar que uma existência no demoníaco manifesta-se de tal maneira que, ao ser comparada com aquela que se lhe opõe, mostra-se nada mais que uma paródia.
Thesis Chapters by Matheus Schmaelter
Tese de doutorado, 2023
Esta tese reflete sobre o problema da relação entre fé e finitude no cristianismo a fim de defend... more Esta tese reflete sobre o problema da relação entre fé e finitude no cristianismo a fim de defender que a experiência da fé cristã encontra sua plenitude não na negação da finitude – aqui compreendida como realidade concreta do mundo – mas em sua afirmação. Em outras palavras, que a fé cristã é plenamente realizada não no afastamento mas, antes, na imersão na realidade finita do mundo. Para tanto, tendo em vista que não tratamos da fé em abstrato mas, especificamente, da fé cristã, dedicamos o primeiro capítulo à exposição da teologia da cruz, de Martinho Lutero, como fundamento teológico e atmosfera a permear toda a reflexão dos capítulos seguintes. Ao afirmar que Deus se revela no ocultamento da Cruz, Lutero redireciona do infinito para o finito o olhar que busca o divino e desloca o lugar do conhecimento de Deus da razão para a fé: onde não se encontra o que a razão identifica como divino, há que se crer que Deus está presente. Passando de Lutero a Kierkegaard, buscamos, no segundo capítulo, definir o conceito kierkegaardiano de fé a partir de duas de suas obras fundamentais: Temor e tremor, de 1843, e Migalhas filosóficas, de 1844. Aí, vemos como Kierkegaard, através dos pseudônimos Johannes de Silentio e Johannes Climacus, compreende a fé como um duplo movimento de resignação e retomada do finito que a razão não dá conta, o que estabelece a fé não como algo irracional mas, antes, supra-racional. Em seguida, a partir da obra Pós-Escrito conclusivo, não-científico, às Migalhas filosóficas, de 1846, vemos como a finitude é parte constitutiva da fé cristã e lugar de sua realização, de modo que o indivíduo, em sua subjetividade, deve estar profundamente interessado no mundo, o que estabelece uma relação de amor para com ele. Por fim, o quarto capítulo visa apresentar como a existência na fé não se dá de maneira polar, nem na negação do finito em nome do infinito nem vice-versa, mas na manutenção paradoxal de ambos na tensão que compõe o si-mesmo, a saber, o indivíduo singular que existe na fé.
Revista Instante, 2024
RESUMO: No quarto capítulo da obra kierkegaardiana O conceito de angústia, de 1844, o autor pseud... more RESUMO: No quarto capítulo da obra kierkegaardiana O conceito de angústia, de 1844, o autor pseudônimo Vigilius Haufniensis dedica um considerável número de páginas à descrição do fenômeno do demoníaco. Tendo em vista que a obra em questão apresenta a liberdade como elemento ontológico da existência humana, o nome do fenômeno se justifica pela perversão do uso da liberdade: apresentado como "angústia diante do bem," em que o bem é identificado com a liberdade, a pessoa que se encontra na condição do estado do demoníaco utiliza-se da liberdade em nome da não-liberdade, produzindo uma existência caracterizada pelo fechamento hermético e pelo súbito, expressos como mutismo e negação do movimento. Ora, no ano anterior à publicação da obra em questão, Kierkegaard havia publicado, sob o pseudônimo Johannes de Silentio, Temor e tremor, na qual apresenta Abraão como um paradigma da existência na fé. Tal existência aparece caracterizada pela tarefa, pelo silêncio, pelo salto enquanto duplo movimento da fé e, implicitamente, pelo instante, sendo todos estes conceitos importantes no interior da filosofia kierkegaardiana da existência como um todo. Neste artigo, pretendemos demonstrar como o demoníaco, manifesto como fechamento hermético e como súbito, aparece como paródia do tipo de existência caracterizado por Abraão, em Temor e tremor, na medida em que expõe, por assim dizer, versões distorcidas daqueles conceitos que tipificam a existência na fé. Por fim, apresentamos uma possibilidade interpretativa de como a paródia do demoníaco pode se manifestar como um contraste necessário e um momento retificador para a existência. PALAVRAS-CHAVE: Demoníaco. Paródia. Existência.
Trilhas Filosóficas, Mar 13, 2023
Dossiê Aristóteles dito de muitos modos-Fluxo Contínuo Resumo: O presente artigo visa, sob uma pe... more Dossiê Aristóteles dito de muitos modos-Fluxo Contínuo Resumo: O presente artigo visa, sob uma perspectiva existencial e fundamentada na tradição cristã, refletir a respeito da problemática relação entre a fé e a finitude, de modo a apontar que a primeira só encontra-se plena na experiência da finitude, no que denominamos no título de retomada do mundo. Para isso, primeiramente analisamos a chamada theologia crucis, de Lutero, apresentada no Debate de Heidelberg, em que o reformador alemão defende, em posição crítica à escolástica, que o conhecimento de Deus só é possível naquilo que é visível, a saber, o Cristo crucificado. Em seguida, vemos como Kierkegaard, através do pseudônimo Johannes de Silentio em Temor e tremor, descreve a experiência da fé como um duplo movimento de resignação e retomada, caracterizando a fé no interior de uma experiência existencial paradoxal, que vive na tensão entre a finitude e a infinitude.
Trilhas Filosóficas, 2023
O presente artigo visa, sob uma perspectiva existencial e fundamentada na tradição cristã, reflet... more O presente artigo visa, sob uma perspectiva existencial e fundamentada na tradição cristã, refletir a respeito da problemática relação entre a fé e a finitude, de modo a apontar que a primeira só encontra-se plena na experiência da finitude, no que denominamos no título de retomada do mundo. Para isso, primeiramente analisamos a chamada theologia crucis, de Lutero, apresentada no Debate de Heidelberg, em que o reformador alemão defende, em posição crítica à escolástica, que o conhecimento de Deus só é possível naquilo que é visível, a saber, o Cristo crucificado. Em seguida, vemos como Kierkegaard, através do pseudônimo Johannes de Silentio em Temor e tremor, descreve a experiência da fé como um duplo movimento de resignação e retomada, caracterizando a féno interior de uma experiência existencial paradoxal, que vive na tensão entre a finitude e a infinitude.
A partir de uma analise das obras Temor e tremor, A Repeticao e do discurso edificante Fortalecen... more A partir de uma analise das obras Temor e tremor, A Repeticao e do discurso edificante Fortalecendo o homem interior, do filosofo e teologo dinamarques Soren Kierkegaard, o presente trabalho visa apresentar como a fe, juntamente com a categoria da ‘repeticao,' conceito tambem central no pensamento do filosofo, aparece como elemento fundamental para que o ser humano torne-se si mesmo e, portanto, um individuo singular. Referencias Bibliograficas BIBLIA DE JERUSALEM. Sao Paulo: PAULUS, 2002. GLENN Jr., John D. The Definition of the Self and the Structure of Kierkegaard's Work. In.: Perkins, Robert L. (org.). International Kierkegaard Commentary: The Sickness Unto Death. Georgia: Mercer University Press, 1987. KIERKEGAARD, Soren. Concluding Unscientific Postscript. Edited and translated by Howard V. Hong and Edna H. Hong. Princiton: Princiton University Press, 1992. _____. Repetition and Philosophical Crumbs. Translated By M.G. Piety with an introduction by Edward F. Mooney and...
Na segunda parte da obra publicada em 1849, intitulada A doença para a morte (Sygdomen til Døden)... more Na segunda parte da obra publicada em 1849, intitulada A doença para a morte (Sygdomen til Døden), o filósofo e teólogo dinamarquês Søren Kierkegaard, através do pseudônimo Anti-Climacus, trata da existência individual do ser humano a partir de categorias tipicamente cristãs, realizando assim um movimento caracteristicamente teológico de pensamento, que dará tom predominante a toda a obra em questão. Pretendemos, neste artigo, analisar sua reflexão a respeito da categoria do pecado enquanto uma categoria existencial. Para tanto, recorremos à chamada teologia da cruz, do reformador Matinho Lutero, a fim de apontar os fundamentos que a sustentam.
Paper apresentado na XV Semana de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade do Estado do Rio de ... more Paper apresentado na XV Semana de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Esta dissertação busca refletir a respeito da existência individual tal qual ela se dá no interio... more Esta dissertação busca refletir a respeito da existência individual tal qual ela se dá no interior do estágio religioso, um dos três estágios existenciais concebidos por Søren Kierkegaard. Tal existência se realiza em uma vida vivida pela fé, onde a fé é o modo pelo qual o indivíduo se relaciona com a realidade. Tal reflexão será desenvolvida em três capítulos. No primeiro será analisada a primeira parte da obra A doença para a morte, de 1849. Nesta análise apresentaremos e refletiremos a respeito dos conceitos centrais da antropologia kierkegaardiana, a condição humana como síntese de elementos opostos previamente dada, o si-mesmo como tal relação relacionando-se consigo mesma, o desespero como instabilidade entre os elementos da síntese e de que formas o desespero se manifesta. No segundo capítulo apresentaremos o desespero enquanto pecado, trazendo à nossa reflexão um ambiente mais propriamente teológico à questão do desespero e da existência humana, analisando a humanidade não mais a partir de si mesma mas sim a partir de sua existência diante de Deus. Aqui, Deus é o critério para o si-mesmo humano. Por fim, na terceira e última parte deste trabalho pretendemos apresentar o cavaleiro da fé, paradigma apresentado na obra Temor e tremor, de 1843, como aquele que é a imagem do indivíduo plenamente livre do desespero.
Em O conceito de angústia, de 1844, Kierkegaard, através do pseudônimo Vigilius Haufniensis, defi... more Em O conceito de angústia, de 1844, Kierkegaard, através do pseudônimo Vigilius Haufniensis, define a categoria do demoníaco como “angústia diante do bem.” Dado o tema fundamental da obra em que esta categoria aparece, o bem deve ser entendido, e o é pelo autor, como a liberdade, aí apresentada como característica fundamental da existência humana. Ou seja, a liberdade está aí ontologicamente presente. Sendo assim, angustiar-se diante do bem é angustiar-se ante a sua própria liberdade e, tendo em vista o caráter ontológico desta, escolher, livremente, a não liberdade. Tendo isto em vista, aquele que assim apresenta a angústia não é, contudo, aniquilado no momento em que ela assim se manifesta, mas continua existindo sem assumir, entretanto, a responsabilidade própria da existência que é a sua, apresentando nada mais que uma paródia daquela existência defendida por Kierkegaard e levada a cabo por aquele que o autor dinamarquês chamou de indivíduo singular que, em contrapartida à existência paródica, assume a completa responsabilidade implicada em uma existência assumidamente livre. Esta é uma paródia na medida em que apresenta características muito semelhantes às daquela existência que pode ser identificada como autêntica, no sentido de tomá-la na seriedade da responsabilidade, como o salto, por exemplo, mas de forma negativa. Mas a leitura somente de O conceito de angústia não se mostra suficiente para a identificação do demoníaco como uma paródia da existência, de modo que se faz necessário o diálogo com outra obra do corpus kierkegaardiano, especificamente Temor e tremor, publicada um ano antes. Nesta obra vemos que o autor, desta vez através do pseudônimo Johannes de Silentio, utiliza-se do exemplo do personagem bíblico Abraão para apresentar como seria a existência levada a cabo tendo como fundamento a fé, que modo que um indivíduo que assim vivesse pode ser designado de cavaleiro da fé, tal qual o é Abraão, de acordo com o autor pseudônimo. Tomando Abraão como paradigma desta existência, Johannes de Silentio analisa a narrativa bíblica do sacrifício de Isaac por Abraão, seu pai, demandada por Deus. Aí, destacam-se quatro elementos apresentados pelo autor pseudônimo, a saber: movimento, fé, instante e silêncio. Estes elementos chamam a atenção por serem semelhantes a outros, utilizados por Vigilius Haufniensis para tipificar o demoníaco: o hermetismo (ou fechamento hermético) e o súbito. Além disso, nos valemos das palavras de Johannes de Silentio, ao afirmar que “o demoníaco tem a mesma propriedade do divino, a de o singular poder entrar em relação absoluta com ele.” Tendo isto em mente, o presente trabalho visa, primeiramente, explicitar o sentido dos elementos acima apresentados e como tipificam, por um lado, uma existência na fé e, por outro, uma no demoníaco, que podem ser também denominadas existências, respectivamente, autêntica e inautêntica. Em seguida, pretende-se demonstrar que uma existência no demoníaco manifesta-se de tal maneira que, ao ser comparada com aquela que se lhe opõe, mostra-se nada mais que uma paródia.
Tese de doutorado, 2023
Esta tese reflete sobre o problema da relação entre fé e finitude no cristianismo a fim de defend... more Esta tese reflete sobre o problema da relação entre fé e finitude no cristianismo a fim de defender que a experiência da fé cristã encontra sua plenitude não na negação da finitude – aqui compreendida como realidade concreta do mundo – mas em sua afirmação. Em outras palavras, que a fé cristã é plenamente realizada não no afastamento mas, antes, na imersão na realidade finita do mundo. Para tanto, tendo em vista que não tratamos da fé em abstrato mas, especificamente, da fé cristã, dedicamos o primeiro capítulo à exposição da teologia da cruz, de Martinho Lutero, como fundamento teológico e atmosfera a permear toda a reflexão dos capítulos seguintes. Ao afirmar que Deus se revela no ocultamento da Cruz, Lutero redireciona do infinito para o finito o olhar que busca o divino e desloca o lugar do conhecimento de Deus da razão para a fé: onde não se encontra o que a razão identifica como divino, há que se crer que Deus está presente. Passando de Lutero a Kierkegaard, buscamos, no segundo capítulo, definir o conceito kierkegaardiano de fé a partir de duas de suas obras fundamentais: Temor e tremor, de 1843, e Migalhas filosóficas, de 1844. Aí, vemos como Kierkegaard, através dos pseudônimos Johannes de Silentio e Johannes Climacus, compreende a fé como um duplo movimento de resignação e retomada do finito que a razão não dá conta, o que estabelece a fé não como algo irracional mas, antes, supra-racional. Em seguida, a partir da obra Pós-Escrito conclusivo, não-científico, às Migalhas filosóficas, de 1846, vemos como a finitude é parte constitutiva da fé cristã e lugar de sua realização, de modo que o indivíduo, em sua subjetividade, deve estar profundamente interessado no mundo, o que estabelece uma relação de amor para com ele. Por fim, o quarto capítulo visa apresentar como a existência na fé não se dá de maneira polar, nem na negação do finito em nome do infinito nem vice-versa, mas na manutenção paradoxal de ambos na tensão que compõe o si-mesmo, a saber, o indivíduo singular que existe na fé.