Com sabor, mas sem cafeína: químico explica a ciência do café descafeinado (original) (raw)

Para muitas pessoas, o aroma do café recém-preparado é uma ótima forma de começar o dia. Mas, para outras, a cafeína pode causar dores de cabeça e nervosismo. É por isso que muita gente opta por uma xícara descafeinada.

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Eu sou um professor de química que já deu aulas explicando porque produtos químicos se dissolvem em alguns líquidos, mas não em outros. Os processos de descafeinação oferecem excelentes exemplos destes conceitos de química. Nem mesmo o melhor método, entretanto, remove toda a cafeína – cerca de 7 mg geralmente permanecem em uma xícara de 240 ml.

Os métodos, entretanto, não retiram toda a cafeína do café e podem, ainda, acabar tirando alguns dos compostos que conferem aroma e sabor à bebida — Foto: Unsplash / Milo Miloezger / Creative Commons

Os métodos, entretanto, não retiram toda a cafeína do café e podem, ainda, acabar tirando alguns dos compostos que conferem aroma e sabor à bebida — Foto: Unsplash / Milo Miloezger / Creative Commons

Os produtores deste tipo de café querem remover a cafeína enquanto retêm todos – ou, pelo menos, a maioria – dos outros compostos químicos de aroma e sabor. A descafeinação tem uma história rica, e agora quase toda a indústria do grão usa um entre os três métodos mais comuns.

Estas técnicas, que também são usadas para fazer chá descafeinado, começam com grãos de café verde, ou não torrados, que foram previamente umedecidos. O uso de grãos torrados resultaria em um aroma e sabor muito diferentes, já que as etapas da descafeinação removeriam alguns ingredientes de sabor e odor produzidos durante a torrefação.

O método do dióxido de carbono

Neste método relativamente novo de dióxido de carbono, desenvolvido no início da década de 1970, os produtores usam CO₂ de alta pressão para extrair a cafeína dos grãos de café umedecidos. Eles bombeiam o CO₂ para um recipiente selado que contém os grãos úmidos, e, em seguida, as moléculas de cafeína se dissolvem.

Depois que o CO₂ carregado de cafeína é separado dos grãos, os produtores passam a mistura por um recipiente com água ou por uma base de carvão ativado, que foi aquecido a altas temperaturas e exposto ao vapor e oxigênio, o que cria poros no carbono. Este passo filtra a cafeína e, provavelmente, outros compostos químicos, alguns dos quais afetam o sabor do café.

O método do dióxido de carbono usa o CO₂ de alta pressão para extrair a cafeína dos grãos de café umedecidos — Foto: Unsplash / Mark Daynes / Creative Commons

O método do dióxido de carbono usa o CO₂ de alta pressão para extrair a cafeína dos grãos de café umedecidos — Foto: Unsplash / Mark Daynes / Creative Commons

Esses compostos podem tanto se ligar aos poros do carvão ativado ou permanecer na água. Os produtores secam os grãos descafeinados usando calor e, sob a temperatura, qualquer CO₂ restante evapora. Os produtores podem, então, repressurizar e reutilizar o mesmo CO₂.

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Este método remove de 96% a 98% de cafeína e o café resultante tem apenas um resíduo mínimo de CO₂. O sistema para se chegar a tal resultado exige equipamentos caros para produzir e manusear o CO₂ e é amplamente usado para descafeinar cafés de grau comercial.

Processo da água suíça

É possível diminuir o índice de cafeína dos grãos usando água quente — Foto: Pexels / Alex Moliski / Creative Commons

É possível diminuir o índice de cafeína dos grãos usando água quente — Foto: Pexels / Alex Moliski / Creative Commons

O método da água suíça, que passou a ser adotado comercialmente no início da década de 1980, aplica água quente para descafeinar o café.

Inicialmente, os produtores colocam um lote de grãos de café verde de molho em água quente, que extrai a cafeína e outros compostos químicos dos grãos.

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É algo parecido com o que acontece quando você prepara grãos de café torrados – você os coloca em água limpa e os produtos químicos que causam a cor escura do café são lixiviados para a água. De maneira semelhante, a água quente retira a cafeína dos grãos ainda não descafeinados.

Durante a imersão, a concentração de cafeína é maior nos grãos de café do que na água, então a cafeína se move para a água. Em seguida, os produtores tiram os grãos do líquido e os colocam em água doce – que não tem cafeína –, e o processo se repete. Os produtores refazem esse procedimento até 10 vezes para que quase não haja mais cafeína nos grãos.

A água resultante, que agora contém a cafeína e todos os elementos de sabor que se dissolveram dos grãos, passa por filtros de carvão ativado. Eles retêm a cafeína e outras parcelas químicas de tamanho semelhante, como açúcares e os orgânicos chamados poliaminas, enquanto permite que a maioria dos outros compostos permaneça na água filtrada – saturada de sabor, mas desprovida da maior parte da cafeína – e usada para embeber um novo lote de grãos de café.

Essa etapa permite que os segmentos de sabor perdidos durante o processo de imersão voltem a entrar nos grãos.

O método da água suíça é valorizado por não usar produtos químicos e por sua capacidade de preservar a maioria do sabor natural do café. Foi demonstrado que esse método remove de 94% a 96% da cafeína.

Métodos baseados em solventes

Há dois métodos principais baseados em solventes que são permitidos pela FDA, agência reguladora de saúde dos Estados Unidos — Foto: Freepik / jcomp / Creative Commons

Há dois métodos principais baseados em solventes que são permitidos pela FDA, agência reguladora de saúde dos Estados Unidos — Foto: Freepik / jcomp / Creative Commons

Essa abordagem tradicional e mais comum, realizada pela primeira vez no início dos anos 1900, usa solventes orgânicos, que são líquidos que dissolvem compostos químicos orgânicos, como a cafeína. O acetato de etila e o cloreto de metileno são dois solventes comumente presentes para extrair a cafeína dos grãos de café verde.

Há dois métodos principais baseados em solventes. No método direto, os produtores deixam os grãos úmidos de molho diretamente no solvente ou diluído em água.

O solvente extrai dos grãos de café a maioria da cafeína e de outros compostos semelhantes à cafeína. Em seguida, os produtores removem os grãos do solvente após cerca de 10 horas e os secam.

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Na metodologia indireta, eles deixam os grãos de molho em água quente por algumas horas e depois os retiram. Então, tratam a água com solvente para remover a cafeína. O cloreto de metileno, que é solvente mais comum, não se dissolve na água e acaba formando uma camada sobre ela. Já a cafeína se desfaz melhor no cloreto de metileno do que na água, portanto, a maioria da cafeína permanece na camada de cloreto de metileno, que os produtores podem separar da água.

Como no método da água suíça, os produtores podem reutilizar a água “sem cafeína”, que pode devolver alguns dos compostos de sabor removidos na primeira etapa. Esse método remove cerca de 96% a 97% da cafeína.

O café descafeinado é seguro para consumo?

Não há perigos no uso do método de solventes para retirar a cafeína — Foto: Pexels / Bruna Corrêa / Creative Commons

Não há perigos no uso do método de solventes para retirar a cafeína — Foto: Pexels / Bruna Corrêa / Creative Commons

Um dos solventes mais comuns, o acetato de etila, é encontrado naturalmente em muitos alimentos e bebidas. Ele é considerado um produto químico seguro para a descafeinação pela FDA (Food and Drug Administration).

A FDA e a OSHA (Occupational Safety and Health Administration, ou Administração de Saúde e Segurança Ocupacional) consideraram que o cloreto de metileno não é seguro para consumo em concentrações acima de 10 mg por quilograma de peso corporal. Entretanto, a quantidade residual encontrada nos grãos de café torrados é muito pequena – em torno de 2 a 3 mg por quilograma. Está bem abaixo dos limites da FDA.

A OSHA e suas congêneres europeias têm regras rigorosas no local de trabalho para minimizar a exposição ao cloreto de metileno dos trabalhadores envolvidos no processo de descafeinação.

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Depois que os produtores descafeínam os grãos de café usando cloreto de metileno, os grãos são cozinhados no vapor e secos. Em seguida, são torrados em altas temperaturas.

Durante o processo de vaporização e torrefação, os grãos ficam quentes o suficiente para que o cloreto de metileno residual evapore. A etapa de torrefação também produz novos produtos químicos de sabor a partir da decomposição de elementos químicos que dão ao café seu sabor característico.

Além disso, a maioria das pessoas prepara o café em temperatura entre 190 F e 212 F (aproximadamente 87,7 100 °C e 100 °C) apresentando outra oportunidade para o cloreto de metileno evaporar.

Retenção de aroma e sabor

Alguns métodos permitem que os compostos de sabor e aromas retirados no processo sejam reintroduzidos na bebida — Foto: Pexels / Valeriia Miller / Creative Commons

Alguns métodos permitem que os compostos de sabor e aromas retirados no processo sejam reintroduzidos na bebida — Foto: Pexels / Valeriia Miller / Creative Commons

É quimicamente impossível dissolver apenas a cafeína sem dissolver também outros ingredientes químicos dos grãos, portanto, a descafeinação inevitavelmente remove alguns outros aditivos que contribuem para o aroma e o sabor da sua xícara de café.

Algumas técnicas, entretanto, como o processo de água suíço e o método de solvente indireto, têm etapas que podem reintroduzir determinados componentes extraídos. Elas provavelmente não conseguem devolver todos os compostos extras, mas podem adicionar algum sabor de volta.

Graças a isso, é possível tomar aquela deliciosa xícara de café sem cafeína – a menos que o garçom troque acidentalmente os bules.

* Michael W. Crowder é Professor de química e bioquímica na Miami University. Este artigo foi escrito originalmente em inglês e publicado no The Conversation.