Maria Isabel Rocha | UFBA - Federal University of Bahia (original) (raw)
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Papers by Maria Isabel Rocha
P@ranoá, Dec 22, 2022
No início do século XX, símbolos do patriotismo republicano eram alçados a monumentos, reformando... more No início do século XX, símbolos do patriotismo republicano eram alçados a monumentos, reformando-carimbando os centros urbanos, como fez a Avenida Sete de Setembro soteropolitana, em sua abertura e toponímia. Mas o que tais investidas do poder dominante tentaram omitir? A chegada da modernidade às cidades brasileiras empurrou a população negra para as margens dos espaços [monumentalizados-espetacularizados] agora destinado às elites. No entanto, tais sujeitos se viram impelidos seja a aquilombar-se nas margens de tais monumentos, seja a profaná-los com seus próprios rituais cotidianos. Ambos os movimentos encontraram nas ruínas-físicas e simbólicas-as condições de possibilidade para [re]produzir esses modos de existência na cidade. A fim de compreender como tais processos lidam com as investidas atuais dos poderes hegemônicos [público e privado], invocamos aqui o Dois de Julho, bairro que tangencia a Avenida Sete e homenageia, em sua toponímia, a data comemorativa da independência do Brasil na Bahia. Buscamos, no território, a presença cabocla daquelas pessoas que atuaram na linha de frente da guerra da independência, mas sobretudo daquelas que batalham todos os dias pelo direito à permanência no lugar com o qual constituíram vida e sustento.
Revista Thésis, Nov 30, 2016
<jats:p>A cidade de Salvador apresenta diversas festas de santos padroeiros e orixás homena... more <jats:p>A cidade de Salvador apresenta diversas festas de santos padroeiros e orixás homenageados ao longo do ano. Conhecidas como "Festas de Largo", são momentos de encontros entre o sagrado e o profano, entre católicos e o povo-de-santo, entre o ritual, o espetáculo e a diversão. Estas festas são consideradas patrimônio imaterial, símbolos identitários de Salvador, e também da Bahia de Todos os Santos.Ao assumir uma manifestação cultural como identitária de uma cidade, de um povo, antes de coloca-lá na vitrine para o mundo ver e desejar pertencer (a)aquilo, é realizada a prática de uma estetização estratégica de tal manifestação por parte do poder público, em consonância com os anseios de empresas diretamente envolvidas e que podem vir a se beneficiar do novo negócio. Para responder à pergunta "políticas (urbanas) de matriz identitária podem ser estrategicamente planejadas?" (Arantes, 2000, p.14), vemos acontecer a ordenação da festa, como a dedicada a Iemanjá, em Salvador.</jats:p>
URBANA: Revista Eletrônica do Centro Interdisciplinar de Estudos sobre a Cidade, 2020
Em consonância com o escopo da Revista Urbana, o dossiê ArteCidade amplia suas reflexões – sobre ... more Em consonância com o escopo da Revista Urbana, o dossiê ArteCidade amplia suas reflexões – sobre a produção do universo urbano em perspectiva histórica – enfocando desta vez produções e manifestações artísticas que florescem no meio urbano e tensionam suas ordenações.
URBANA: Revista Eletrônica do Centro Interdisciplinar de Estudos sobre a Cidade
Nossa proposição busca desvelar a questão de ser mulher e pesquisadora no espaço público, seja el... more Nossa proposição busca desvelar a questão de ser mulher e pesquisadora no espaço público, seja ele a rua, seja ele o espaço de visibilidade acadêmica. A partir do nosso deslocamento para a cidade de Salvador, para cursarmos o doutorado na UFBA, muitos questionamentos passaram a atravessar nosso cotidiano, transformando nossa relação e posicionamento crítico diante da questão de ser mulher. Por meio do encontro com as perspectivas de enunciação pedestre e contaminação afetiva buscamos tensionar o que passamos a entender como mais um dispositivo de pacificação, o machismo.
Cet article propose une réflexion sur la situation brésilienne actuelle de crise du public, terme... more Cet article propose une réflexion sur la situation brésilienne actuelle de crise du public, terme général qui englobe aussi bien le commun, ou le collectif (ce qui est partagé) et la représentativité (en tant que pouvoir public), le public étant ce qui est (ou devrait être) ouvert et accessible à tous. Nous prenons l'évolution des manifestations récentes au Brésil comme base pour une réflexion sur l'espace public en tant qu'espace de circulation – de personnes et de discours – mais aussi espace de contrôle. Concernant ce dernier aspect, nous nous interrogeons sur la domination du privé sur le public, ainsi que sur la politique de répression et de soumission plutôt que de dialogue avec le collectif. Il s'agit ici d'une première tentative de compréhension de ces questions urbaines, en partant d'une crise de la mobilité dans le contexte des villes brésiliennes, jusqu'à des problématiques plus globales.
O artigo busca entender o processo de "ordenamento" dos espaços públicos urbanos de maneira a con... more O artigo busca entender o processo de "ordenamento" dos espaços públicos urbanos de maneira a contextualizá-lo no Urbanismo atual, cujas palavras de ordem são Planejamento Estratégico e Segurança, e cujo efeito é a espetacularização urbana. Para tanto, é importante investigar a nomenclatura utilizada para se referir a este " ordenamento " , levando em conta os discursos de ordem urbana, mas também do desejo de pacificação da vida nos espaços públicos. O processo – ou o conjunto de processos (enjeux): ordenamento, pacificação, espetacularização, entre outros – muitas vezes se utiliza de outros nomes para referir-se. Nosso trabalho investiga então a natureza (objetivos) das atuais transformações urbanísticas, sobretudo no caso brasileiro, especialmente na cidade de Salvador, a partir dos termos utilizados pelo Urbanismo e/ou pelos gestores de cidades, com base no caráter utópico das ideias que guiam essas transformações. Neste sentido, o trabalho busca referências históricas de ordenamentos urbanos, relacionando-os com os discursos atuais do Planejamento Estratégico em geral, e os novos discursos securitários e higienistas em particular. Finalmente, propõe um diálogo e uma evolução do assunto a partir das manifestações recentes que ocuparam as ruas do Brasil, bem como da noção de espaços outros (heterotopias) enquanto lugares reais da vida em sociedade.
Em 1945, prefaciando uma obra de Lins e Silva, Gilberto Freyre lembrava o projeto de controle psi... more Em 1945, prefaciando uma obra de Lins e Silva, Gilberto Freyre lembrava o projeto de controle psiquiátrico dos terreiros, coisa que o "espírito humanitário" de Nina Rodrigues concebeu como alternativa à brutalidade das intervenções policiais, da repressão direta a esses centros de culto de religiões afro-brasileiras. Nina não o conseguiu implantar, mas -lembra ainda Gilberto Freyre -esse projeto de monitoramento das religiões negras por psiquiatras e etnólogos mais tarde veio a ser realizado com um êxito que o ilustre prefaciador acentua: Ulysses Pernambucano o pôs em prática em Recife; em Salvador, diz Freyre ainda, executaram-no "técnicos capazes", arregimentados pelo major Juracy Magalhães -que então governava a Bahia como interventor. Segundo o autor de Casa Grande e Senzala, essa iniciativa de Ulysses Pernambucano e dos peritos baianos veio a ser "uma das intervenções mais felizes da ciência e da técnica antropológica, orientada por uma psiquiatria social, na vida de uma comunidade brasileira". 1 Em nosso meio, Nina Rodrigues marcou de forma vigorosa a Medicina Legal, a Psiquiatria que se lhe associava (como ancila da Criminologia) e também a Etnologia, em que deixou importante legado, com seus estudos pioneiros sobre a religião dos negros baianos. A herança de Nina foi capitalizada por médicos, juristas, psiquiatras e etnólogos. O patrimônio de sua memória é ainda disputado. Mas, entre seus "descendentes" intelectuais, deram-se rupturas e clivagens profundas. Desde Edson Carneiro, a vertente que acabou dominando a pesquisa etnológica sobre o candomblé e ritos congêneres, muito embora seus próceres invocassem sempre o precursor, desligou-se do campo da Medicina Legal, da perspectiva da "Hygiene Mental": os etnólogos que se viam como continuadores de Nina deram a esses estudos um novo rumo, uma direção que acabou por inscrevêlos em definitivo nos domínios da antropologia. Mas Nina também teve continuadores no campo da Medicina Legal, discípulos que se esforçaram
P@ranoá, Dec 22, 2022
No início do século XX, símbolos do patriotismo republicano eram alçados a monumentos, reformando... more No início do século XX, símbolos do patriotismo republicano eram alçados a monumentos, reformando-carimbando os centros urbanos, como fez a Avenida Sete de Setembro soteropolitana, em sua abertura e toponímia. Mas o que tais investidas do poder dominante tentaram omitir? A chegada da modernidade às cidades brasileiras empurrou a população negra para as margens dos espaços [monumentalizados-espetacularizados] agora destinado às elites. No entanto, tais sujeitos se viram impelidos seja a aquilombar-se nas margens de tais monumentos, seja a profaná-los com seus próprios rituais cotidianos. Ambos os movimentos encontraram nas ruínas-físicas e simbólicas-as condições de possibilidade para [re]produzir esses modos de existência na cidade. A fim de compreender como tais processos lidam com as investidas atuais dos poderes hegemônicos [público e privado], invocamos aqui o Dois de Julho, bairro que tangencia a Avenida Sete e homenageia, em sua toponímia, a data comemorativa da independência do Brasil na Bahia. Buscamos, no território, a presença cabocla daquelas pessoas que atuaram na linha de frente da guerra da independência, mas sobretudo daquelas que batalham todos os dias pelo direito à permanência no lugar com o qual constituíram vida e sustento.
Revista Thésis, Nov 30, 2016
<jats:p>A cidade de Salvador apresenta diversas festas de santos padroeiros e orixás homena... more <jats:p>A cidade de Salvador apresenta diversas festas de santos padroeiros e orixás homenageados ao longo do ano. Conhecidas como "Festas de Largo", são momentos de encontros entre o sagrado e o profano, entre católicos e o povo-de-santo, entre o ritual, o espetáculo e a diversão. Estas festas são consideradas patrimônio imaterial, símbolos identitários de Salvador, e também da Bahia de Todos os Santos.Ao assumir uma manifestação cultural como identitária de uma cidade, de um povo, antes de coloca-lá na vitrine para o mundo ver e desejar pertencer (a)aquilo, é realizada a prática de uma estetização estratégica de tal manifestação por parte do poder público, em consonância com os anseios de empresas diretamente envolvidas e que podem vir a se beneficiar do novo negócio. Para responder à pergunta "políticas (urbanas) de matriz identitária podem ser estrategicamente planejadas?" (Arantes, 2000, p.14), vemos acontecer a ordenação da festa, como a dedicada a Iemanjá, em Salvador.</jats:p>
URBANA: Revista Eletrônica do Centro Interdisciplinar de Estudos sobre a Cidade, 2020
Em consonância com o escopo da Revista Urbana, o dossiê ArteCidade amplia suas reflexões – sobre ... more Em consonância com o escopo da Revista Urbana, o dossiê ArteCidade amplia suas reflexões – sobre a produção do universo urbano em perspectiva histórica – enfocando desta vez produções e manifestações artísticas que florescem no meio urbano e tensionam suas ordenações.
URBANA: Revista Eletrônica do Centro Interdisciplinar de Estudos sobre a Cidade
Nossa proposição busca desvelar a questão de ser mulher e pesquisadora no espaço público, seja el... more Nossa proposição busca desvelar a questão de ser mulher e pesquisadora no espaço público, seja ele a rua, seja ele o espaço de visibilidade acadêmica. A partir do nosso deslocamento para a cidade de Salvador, para cursarmos o doutorado na UFBA, muitos questionamentos passaram a atravessar nosso cotidiano, transformando nossa relação e posicionamento crítico diante da questão de ser mulher. Por meio do encontro com as perspectivas de enunciação pedestre e contaminação afetiva buscamos tensionar o que passamos a entender como mais um dispositivo de pacificação, o machismo.
Cet article propose une réflexion sur la situation brésilienne actuelle de crise du public, terme... more Cet article propose une réflexion sur la situation brésilienne actuelle de crise du public, terme général qui englobe aussi bien le commun, ou le collectif (ce qui est partagé) et la représentativité (en tant que pouvoir public), le public étant ce qui est (ou devrait être) ouvert et accessible à tous. Nous prenons l'évolution des manifestations récentes au Brésil comme base pour une réflexion sur l'espace public en tant qu'espace de circulation – de personnes et de discours – mais aussi espace de contrôle. Concernant ce dernier aspect, nous nous interrogeons sur la domination du privé sur le public, ainsi que sur la politique de répression et de soumission plutôt que de dialogue avec le collectif. Il s'agit ici d'une première tentative de compréhension de ces questions urbaines, en partant d'une crise de la mobilité dans le contexte des villes brésiliennes, jusqu'à des problématiques plus globales.
O artigo busca entender o processo de "ordenamento" dos espaços públicos urbanos de maneira a con... more O artigo busca entender o processo de "ordenamento" dos espaços públicos urbanos de maneira a contextualizá-lo no Urbanismo atual, cujas palavras de ordem são Planejamento Estratégico e Segurança, e cujo efeito é a espetacularização urbana. Para tanto, é importante investigar a nomenclatura utilizada para se referir a este " ordenamento " , levando em conta os discursos de ordem urbana, mas também do desejo de pacificação da vida nos espaços públicos. O processo – ou o conjunto de processos (enjeux): ordenamento, pacificação, espetacularização, entre outros – muitas vezes se utiliza de outros nomes para referir-se. Nosso trabalho investiga então a natureza (objetivos) das atuais transformações urbanísticas, sobretudo no caso brasileiro, especialmente na cidade de Salvador, a partir dos termos utilizados pelo Urbanismo e/ou pelos gestores de cidades, com base no caráter utópico das ideias que guiam essas transformações. Neste sentido, o trabalho busca referências históricas de ordenamentos urbanos, relacionando-os com os discursos atuais do Planejamento Estratégico em geral, e os novos discursos securitários e higienistas em particular. Finalmente, propõe um diálogo e uma evolução do assunto a partir das manifestações recentes que ocuparam as ruas do Brasil, bem como da noção de espaços outros (heterotopias) enquanto lugares reais da vida em sociedade.
Em 1945, prefaciando uma obra de Lins e Silva, Gilberto Freyre lembrava o projeto de controle psi... more Em 1945, prefaciando uma obra de Lins e Silva, Gilberto Freyre lembrava o projeto de controle psiquiátrico dos terreiros, coisa que o "espírito humanitário" de Nina Rodrigues concebeu como alternativa à brutalidade das intervenções policiais, da repressão direta a esses centros de culto de religiões afro-brasileiras. Nina não o conseguiu implantar, mas -lembra ainda Gilberto Freyre -esse projeto de monitoramento das religiões negras por psiquiatras e etnólogos mais tarde veio a ser realizado com um êxito que o ilustre prefaciador acentua: Ulysses Pernambucano o pôs em prática em Recife; em Salvador, diz Freyre ainda, executaram-no "técnicos capazes", arregimentados pelo major Juracy Magalhães -que então governava a Bahia como interventor. Segundo o autor de Casa Grande e Senzala, essa iniciativa de Ulysses Pernambucano e dos peritos baianos veio a ser "uma das intervenções mais felizes da ciência e da técnica antropológica, orientada por uma psiquiatria social, na vida de uma comunidade brasileira". 1 Em nosso meio, Nina Rodrigues marcou de forma vigorosa a Medicina Legal, a Psiquiatria que se lhe associava (como ancila da Criminologia) e também a Etnologia, em que deixou importante legado, com seus estudos pioneiros sobre a religião dos negros baianos. A herança de Nina foi capitalizada por médicos, juristas, psiquiatras e etnólogos. O patrimônio de sua memória é ainda disputado. Mas, entre seus "descendentes" intelectuais, deram-se rupturas e clivagens profundas. Desde Edson Carneiro, a vertente que acabou dominando a pesquisa etnológica sobre o candomblé e ritos congêneres, muito embora seus próceres invocassem sempre o precursor, desligou-se do campo da Medicina Legal, da perspectiva da "Hygiene Mental": os etnólogos que se viam como continuadores de Nina deram a esses estudos um novo rumo, uma direção que acabou por inscrevêlos em definitivo nos domínios da antropologia. Mas Nina também teve continuadores no campo da Medicina Legal, discípulos que se esforçaram