Ana Claudia Figueroa | Universidade Metodista de Angola (original) (raw)
Drafts by Ana Claudia Figueroa
Caderno Espaço Feminino, 2016
Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos ka... more Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1. Tem sempre uma casa que é designada para nos hospedar e alimentar. Agora percebo que esta casa era escolhida em função das características das famílias que provavelmente teriam mais aproximação ao seu estilo de ser ou era aquela que, dentre todas nas aldeias, mais gostavam da cultura do kariwá. Numa aldeia específica prepararam uma casa somente para nós. Ali tínhamos maior liberdade individual, no entanto, não tínhamos proteção para garantir alimentação e cuidado diante da floresta e suas demandas. Por mim, fui mais feliz quando podia ficar junto na casa de alguém. Numa aldeia em especial construímos a casa em que eu iria morar, acabando usada por muitos, pois nunca me instalei numa única aldeia, por decisão metodológica do nosso trabalho. E porque nunca amadureci para além da imaturidade infantil 2 , o que me impedia de cuidar de mim mesma na floresta e nas atribuições domésticas que envolviam as demandas da aldeia. É importante aqui dizer que a expressão família não é a mais adequada para a unidade social nuclear da constituição da organização social de uma aldeia kanamari. Como vários povos indígenas no Brasil, a aldeia kanamari tem na realidade uma organização clânica bidimensional. São, na maioria das vezes, dois grupos clânicos que constituem as tarefas cotidianas que estabelecem as regras de reciprocidade e dádiva. Assim, aquilo que chamamos casa não é bem a casa kanamari. Muito antigamente o povo kanamari morava na maloca única com os dois grupos clânicos dividindo os espaços internos na grande maloca. Como já tem mais de cem anos que não é assim eles
Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1 . Tem sempr... more Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1 . Tem sempre uma casa que é designada para nos hospedar e alimentar. Agora percebo que esta casa era escolhida em função das características das famílias que provavelmente teriam mais aproximação ao seu estilo de ser ou era aquela que, dentre todas nas aldeias, mais gostavam da cultura do kariwá. Numa aldeia específica prepararam uma casa somente para nós. Ali tínhamos maior liberdade individual, no entanto, não tínhamos proteção para garantir alimentação e cuidado diante da floresta e suas demandas.
ST 47 -Gênero Religião e Poder
Poder Feminino Kanamari no Ritual do Kohanan Deste trabalho se vestem a maior parte das índias, n... more Poder Feminino Kanamari no Ritual do Kohanan Deste trabalho se vestem a maior parte das índias, não só da Vila de Santarém, mas também as da Vila Franca e Alter do Chão. Um pacará ordinário não custa menos de 1.600, comprado às índias nas Povoações. Na Cidade sobe o seu preço de 3 até 4.000 réis. Um tabuleiro vale 1.200 na Povoação e chega a 2.000 réis na Cidade. Pelo preço de 160 se compra cada chapéu que na Cidade custa 400 réis. Mas esta indústria não é tão proveitosa às índias, como parece. Os Diretores e os Comandantes dentro de 3 ou 4 anos, não só pretendem desempenhar-se, mas segurar o bolo para o resto de suas vidas. A título de empregarem as índias em algum trabalho lucrativo para elas e evitarem a ociosidade, distribuem por elas, e principalmente pelas mestras, diversas encomendas de pacarás, tabuleiros, chapéus, etc., não para as pagarem à razão dos 1.600 e 1.200, que valem, e cujo valor hão de dobrar na Cidade, mas para lhes pagarem por dia à razão de 40 réis. Isto não em dinheiro, logo que acabem a obra, mas em panos de algodão, em alguma berganha avariada e avaliada ao seu arbítrio, quando lhes chega na Cidade. Se a índia, que bem percebe a desigualdade do partido, se demora mais tempo do que o consignado pelo Diretor para concluir a obra, é notada de preguiçosa e castigada com palmatoadas ... Conjeture-se, pelo que digo, qual é o estímulo que deve ter esta gente para aumentar a sua indústria, vendo ela que todo o seu trabalho cede em proveito dos brancos, e, se não cede, é punida como incúria própria. (FERREIRA [1786], 1974, p. 47-48) 1 Introduzir a quem lê este texto com esta citação é uma provocação. Provocar a memória histórica da ocupação da Amazônia, provocar o debate sobre o lugar do gênero feminino nesta relação, provocar um sentimento de indignação inevitável para quem vive tempos de afirmação dos direitos sociais coletivos tendo como fundo a conquista histórica dos direitos humanos. Também o relato citado traz elementos da relação de produção e reprodução do sistema de colonização que estabelecem a exploração do trabalho humano que resulte na lucratividade de uns poucos sustentados pela supremacia bélica e ideológica na dominação e ocupação de uma territorialidade ancestral alheia. Empoderamento indevido, marca da história social, humana e civil constitutivas das relações entre grupos sociais que tecem a constituição da nacionalidade brasileira. Empoderamento constitutivo e explicativo da historicidade do preconceito nas relações interétnicas que constroem a profundidade das desigualdades étnicas no país. Estamos em 2006. Na sociedade brasileira a garantia de direitos dos povos indígenas se consolida como realidade efetiva. Apesar de todas as contradições no processo de implementação desses direitos, considera-se um período favorável às populações indígenas, enquanto tempo de 1
reflexões sobre como resistir na nova conjuntura brasileira. apontamento sobre direitos humanos.
reflexões sobre como resistir na nova conjuntura brasileira. apontamento sobre educação.
Este é o primeiro registro deste diário da resistência pós eleições brasileiras em 2018. Sim, já ... more Este é o primeiro registro deste diário da resistência pós eleições brasileiras em 2018. Sim, já era um resultado esperado. Apesar de muitos estarem com esperança na chamada virada. Coisa bonita que aconteceu nos últimos dias! Muita gente fazendo o chamado tête-à-tête na rua. Bolinhos, jogos criativos, conversa, panfletagem, arguições, emoções. Teve de tudo um pouco. Toda uma ação humanizadora por um voto pela democracia. Fomos vencidxs pela mentira propalada por robôs whatsappinianos com muito dinheiro no bolso. Estou meio que me sentido naqueles filmes futuristas onde os robôs dominam o mundo e alguns humanos tentam fazer resistência ao inevitável... Na mesa " Nenhum Brasil Existe " , de João Cezar de Castro Rocha. É como um dicionário que reúne gente que pensa a cultura brasileira, este recém-nascido país em findo tempos democráticos, onde na realidade nenhum país há. São tempos estranhos estes dos finais dos ideários de república e democracia. Para quem nasceu e se criou neste outro lado do mundo, estes ideários nunca construíram vida boa para maioria das pessoas. Foram ideologias utilitárias de submissão ao que se chama há séculos Servidão Voluntária. Se no projeto colonizador europeu e na castração do outro no american way of life houve vida boa com bem-estar social para uma maioria populacional destas nações, está claro que o preço foi o não bem-estar das demais populações colonizadas/castradas. Como sobrevivemos a tudo isto? Qual o significado da palavra resistir neste contexto? Respondo com o ensinamento do Caetano, nosso guri, no dia de hoje. Estamos assistindo pela milésima vez Carros, aquele desenho animado de corridas de carros que homenageia a famosa Rota 66 nos EUA. Já é o final do filme. " Três carros, um campeão " é o mote do narrador da corrida que definirá quem ficará com a Copa Pistão. Caetano segue a narrativa do filme, se emociona com a presença dos amigos de Radiator Spring que agem em solidariedade com o McQueen. Então o carro malvado faz malcriação e faz com que o rei, o mais respeitável corredor na história recente da Copa Pistão, King, sofra um acidente. McQueen pára abruptamente já quase chegando na marca da vitória. O carro vilão ganha a corrida e a copa. McQueen vai em direção ao King e empurrando ajuda-o a cruzar a reta final em sua última corrida. Caetano grita, comemorativamente, McQueen venceu! Ehhhhhhh Tudo bem, no filme também toda a torcida celebra o gesto do McQueen. Ninguém celebra junto com ganhador da Copa Pistão. Afinal a copa é somente uma taça de metal vazia. Mas, para o Caetano, o McQueen ganhou. Ganhou. Como alguém ganha perdendo? É dia 29 de outubro, o Brasil elegeu um projeto declaradamente neofacista para o comando da presidência. E foi Caetano que me deu a chave de leitura para compreender esta perda. Perdemos este metal vazio. E não falo da presidência de uma república. Falo da própria república que vive seus tempos findos. O Caetano, melhor do que qualquer comentário sobre a situação, apresentou a melhor chave de leitura para organização de resistência/sobrevivência nestes tempos novos à frente. Já ganhamos por termos chegado aqui hoje do jeito que chegamos e com as superações que tivemos que fazer para chegar aqui hoje. Agora tudo será diferente e temos muito por construir.
A compreensão dos principais moldes de função missionária que constituem a história do cristianis... more A compreensão dos principais moldes de função missionária que constituem a história do cristianismo se alimenta da trajetória religiosa judaica misturada com a realidade da cultura greco-romana, também conhecida como helenista. Do nascedouro do cristianismo aos dias atuais temos um longo percurso de mais de dois mil anos. Qualquer forma de percorrer este período certamente representa um recorte intencional desde uma proposta específica. Assim, desde início vamos explicitar as motivações que constituem a organização das experiências no tempo e na geografia correspondente. A primeira motivação é a relacionada aos elementos constitutivos da função missionária, de explicitar como os elementos básicos da missão aparecerem ao longo das diferentes experiências históricas. Uma segunda motivação é a de apresentar variação de tempo que represente alterações expressivas na forma como o cristianismo tem sido estudado na história humana, assim não fugiremos à clássica organização de primeiros cristãos, período das primeiras expressões eclesiásticas, idade média, reforma protestante, período moderno e período contemporâneo. A terceira motivação é geográfica, pois à medida que o cristianismo se expandiu as formas culturais das regiões foram interagindo com as novas formas de constituição eclesiástica do cristianismo, intervindo nas expressões de vida e nas maneiras como a missão se constituiu na vivência eclesial. A quarta motivação é a representativa de segmentos culturais e socioeconômicos, pinçando dentre a imensa diversidade possível de se aproximar da experiência missionária cristã os elementos que auxiliem a entender a função missionária no aspecto de gênero, de classe social, de constituição étnica e racial e de mobilidade geofísica. Seguir a Jesus como ação fundante Às vezes o óbvio precisa ser dito: não teremos missão no contexto cristão sem o seguimento a Jesus. Mas todo óbvio não suporta as dúvidas que pairam sobre ele. Neste caso o que representa seguir a Jesus?
Papers by Ana Claudia Figueroa
Intexto, 2016
Resenha do livro "Manifesto contrassexual: práticas subversivas de identidade sexual" d... more Resenha do livro "Manifesto contrassexual: práticas subversivas de identidade sexual" de Beatriz Preciado.
In the context of Brazilian society and the right of indigenous communities to expresses their in... more In the context of Brazilian society and the right of indigenous communities to expresses their individuality, the article presents confluences and differences regarding the ideas of being a subject, citizenship and social rights in the perspective o the actual context of alternative indigenous education, called the pastoral of living in community [convivencvia].
Caminhando, 2003
Metodismo e indigenismo no Brasil Em homenagem a Daniel Kidder, metodista norteamericano que entr... more Metodismo e indigenismo no Brasil Em homenagem a Daniel Kidder, metodista norteamericano que entre 1836 a 1840 viveu, observou e descreveu estas terras que chamamos Brasil Ana Claudia Figueroa 1 "'Feriados' no entender de muitos naturais do país são aqueles aos quais todos os outros dias estão subordinados. É pelo tempo das festas que a natureza produz as mais saborosas frutas e as mais lindas flores. Velhos e moços aguardam as festas com viva ansiedade. Humildes e abastados gastam, então, livremente".(KIDDER: 1980, 97) Em tempos de comemorações dos 300 anos do nascimento de João Wesley, refletir os caminhos da pastoral indigenista metodista no Brasil pressupõe duas vontades: saber como os caminhos de Wesley inspiram e se recriam nos nossos próprios caminhos; conhecer as escolhas e teologias que sustentam as iniciativas metodistas. Que estas vontades se trançem nos relatos e testemunhos que coleto a seguir.
Caminhando, 2010
A missão educacional indigenista metodista no contexto dos ideários de democracia The educational... more A missão educacional indigenista metodista no contexto dos ideários de democracia The educational mission of Methodist indigenous education in the context of the ideals of democracy La misión educacional indigenista metodista en el contexto de los idearios de democracia Ana Claudia Figueroa RESUMO No contexto da sociedade brasileira e o direito das comunidades indígenas à diferencialidade, o artigo apresenta confluências e divergências das ideias de sujeito, cidadania e direitos sociais na perspectiva do contexto atual da missão educacional indigenista alternativa, nomeada pastoral da convivência. Palavras-chave: Metodismo brasileiro; missão indigenista; pastoral de convivência.
Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos ka... more Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1. Tem sempre uma casa que é designada para nos hospedar e alimentar. Agora percebo que esta casa era escolhida em função das características das famílias que provavelmente teriam mais aproximação ao seu estilo de ser ou era aquela que, dentre todas nas aldeias, mais gostavam da cultura do kariwá. Numa aldeia específica prepararam uma casa somente para nós. Ali tínhamos maior liberdade individual, no entanto, não tínhamos proteção para garantir alimentação e cuidado diante da floresta e suas demandas. Por mim, fui mais feliz quando podia ficar junto na casa de alguém. Numa aldeia em especial construímos a casa em que eu iria morar, acabando usada por muitos, pois nunca me instalei numa única aldeia, por decisão metodológica do nosso trabalho. E porque nunca amadureci para além da imaturidade infantil 2 , o que me impedia de cuidar de mim mesma na floresta e nas atribuições domésticas que envolviam as demandas da aldeia. É importante aqui dizer que a expressão família não é a mais adequada para a unidade social nuclear da constituição da organização social de uma aldeia kanamari. Como vários povos indígenas no Brasil, a aldeia kanamari tem na realidade uma organização clânica bidimensional. São, na maioria das vezes, dois grupos clânicos que constituem as tarefas cotidianas que estabelecem as regras de reciprocidade e dádiva. Assim, aquilo que chamamos casa não é bem a casa kanamari. Muito antigamente o povo kanamari morava na maloca única com os dois grupos clânicos dividindo os espaços internos na grande maloca. Como já tem mais de cem anos que não é assim eles
Caderno Espaço Feminino, 2016
Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos ka... more Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1. Tem sempre uma casa que é designada para nos hospedar e alimentar. Agora percebo que esta casa era escolhida em função das características das famílias que provavelmente teriam mais aproximação ao seu estilo de ser ou era aquela que, dentre todas nas aldeias, mais gostavam da cultura do kariwá. Numa aldeia específica prepararam uma casa somente para nós. Ali tínhamos maior liberdade individual, no entanto, não tínhamos proteção para garantir alimentação e cuidado diante da floresta e suas demandas. Por mim, fui mais feliz quando podia ficar junto na casa de alguém. Numa aldeia em especial construímos a casa em que eu iria morar, acabando usada por muitos, pois nunca me instalei numa única aldeia, por decisão metodológica do nosso trabalho. E porque nunca amadureci para além da imaturidade infantil 2 , o que me impedia de cuidar de mim mesma na floresta e nas atribuições domésticas que envolviam as demandas da aldeia. É importante aqui dizer que a expressão família não é a mais adequada para a unidade social nuclear da constituição da organização social de uma aldeia kanamari. Como vários povos indígenas no Brasil, a aldeia kanamari tem na realidade uma organização clânica bidimensional. São, na maioria das vezes, dois grupos clânicos que constituem as tarefas cotidianas que estabelecem as regras de reciprocidade e dádiva. Assim, aquilo que chamamos casa não é bem a casa kanamari. Muito antigamente o povo kanamari morava na maloca única com os dois grupos clânicos dividindo os espaços internos na grande maloca. Como já tem mais de cem anos que não é assim eles
Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1 . Tem sempr... more Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1 . Tem sempre uma casa que é designada para nos hospedar e alimentar. Agora percebo que esta casa era escolhida em função das características das famílias que provavelmente teriam mais aproximação ao seu estilo de ser ou era aquela que, dentre todas nas aldeias, mais gostavam da cultura do kariwá. Numa aldeia específica prepararam uma casa somente para nós. Ali tínhamos maior liberdade individual, no entanto, não tínhamos proteção para garantir alimentação e cuidado diante da floresta e suas demandas.
ST 47 -Gênero Religião e Poder
Poder Feminino Kanamari no Ritual do Kohanan Deste trabalho se vestem a maior parte das índias, n... more Poder Feminino Kanamari no Ritual do Kohanan Deste trabalho se vestem a maior parte das índias, não só da Vila de Santarém, mas também as da Vila Franca e Alter do Chão. Um pacará ordinário não custa menos de 1.600, comprado às índias nas Povoações. Na Cidade sobe o seu preço de 3 até 4.000 réis. Um tabuleiro vale 1.200 na Povoação e chega a 2.000 réis na Cidade. Pelo preço de 160 se compra cada chapéu que na Cidade custa 400 réis. Mas esta indústria não é tão proveitosa às índias, como parece. Os Diretores e os Comandantes dentro de 3 ou 4 anos, não só pretendem desempenhar-se, mas segurar o bolo para o resto de suas vidas. A título de empregarem as índias em algum trabalho lucrativo para elas e evitarem a ociosidade, distribuem por elas, e principalmente pelas mestras, diversas encomendas de pacarás, tabuleiros, chapéus, etc., não para as pagarem à razão dos 1.600 e 1.200, que valem, e cujo valor hão de dobrar na Cidade, mas para lhes pagarem por dia à razão de 40 réis. Isto não em dinheiro, logo que acabem a obra, mas em panos de algodão, em alguma berganha avariada e avaliada ao seu arbítrio, quando lhes chega na Cidade. Se a índia, que bem percebe a desigualdade do partido, se demora mais tempo do que o consignado pelo Diretor para concluir a obra, é notada de preguiçosa e castigada com palmatoadas ... Conjeture-se, pelo que digo, qual é o estímulo que deve ter esta gente para aumentar a sua indústria, vendo ela que todo o seu trabalho cede em proveito dos brancos, e, se não cede, é punida como incúria própria. (FERREIRA [1786], 1974, p. 47-48) 1 Introduzir a quem lê este texto com esta citação é uma provocação. Provocar a memória histórica da ocupação da Amazônia, provocar o debate sobre o lugar do gênero feminino nesta relação, provocar um sentimento de indignação inevitável para quem vive tempos de afirmação dos direitos sociais coletivos tendo como fundo a conquista histórica dos direitos humanos. Também o relato citado traz elementos da relação de produção e reprodução do sistema de colonização que estabelecem a exploração do trabalho humano que resulte na lucratividade de uns poucos sustentados pela supremacia bélica e ideológica na dominação e ocupação de uma territorialidade ancestral alheia. Empoderamento indevido, marca da história social, humana e civil constitutivas das relações entre grupos sociais que tecem a constituição da nacionalidade brasileira. Empoderamento constitutivo e explicativo da historicidade do preconceito nas relações interétnicas que constroem a profundidade das desigualdades étnicas no país. Estamos em 2006. Na sociedade brasileira a garantia de direitos dos povos indígenas se consolida como realidade efetiva. Apesar de todas as contradições no processo de implementação desses direitos, considera-se um período favorável às populações indígenas, enquanto tempo de 1
reflexões sobre como resistir na nova conjuntura brasileira. apontamento sobre direitos humanos.
reflexões sobre como resistir na nova conjuntura brasileira. apontamento sobre educação.
Este é o primeiro registro deste diário da resistência pós eleições brasileiras em 2018. Sim, já ... more Este é o primeiro registro deste diário da resistência pós eleições brasileiras em 2018. Sim, já era um resultado esperado. Apesar de muitos estarem com esperança na chamada virada. Coisa bonita que aconteceu nos últimos dias! Muita gente fazendo o chamado tête-à-tête na rua. Bolinhos, jogos criativos, conversa, panfletagem, arguições, emoções. Teve de tudo um pouco. Toda uma ação humanizadora por um voto pela democracia. Fomos vencidxs pela mentira propalada por robôs whatsappinianos com muito dinheiro no bolso. Estou meio que me sentido naqueles filmes futuristas onde os robôs dominam o mundo e alguns humanos tentam fazer resistência ao inevitável... Na mesa " Nenhum Brasil Existe " , de João Cezar de Castro Rocha. É como um dicionário que reúne gente que pensa a cultura brasileira, este recém-nascido país em findo tempos democráticos, onde na realidade nenhum país há. São tempos estranhos estes dos finais dos ideários de república e democracia. Para quem nasceu e se criou neste outro lado do mundo, estes ideários nunca construíram vida boa para maioria das pessoas. Foram ideologias utilitárias de submissão ao que se chama há séculos Servidão Voluntária. Se no projeto colonizador europeu e na castração do outro no american way of life houve vida boa com bem-estar social para uma maioria populacional destas nações, está claro que o preço foi o não bem-estar das demais populações colonizadas/castradas. Como sobrevivemos a tudo isto? Qual o significado da palavra resistir neste contexto? Respondo com o ensinamento do Caetano, nosso guri, no dia de hoje. Estamos assistindo pela milésima vez Carros, aquele desenho animado de corridas de carros que homenageia a famosa Rota 66 nos EUA. Já é o final do filme. " Três carros, um campeão " é o mote do narrador da corrida que definirá quem ficará com a Copa Pistão. Caetano segue a narrativa do filme, se emociona com a presença dos amigos de Radiator Spring que agem em solidariedade com o McQueen. Então o carro malvado faz malcriação e faz com que o rei, o mais respeitável corredor na história recente da Copa Pistão, King, sofra um acidente. McQueen pára abruptamente já quase chegando na marca da vitória. O carro vilão ganha a corrida e a copa. McQueen vai em direção ao King e empurrando ajuda-o a cruzar a reta final em sua última corrida. Caetano grita, comemorativamente, McQueen venceu! Ehhhhhhh Tudo bem, no filme também toda a torcida celebra o gesto do McQueen. Ninguém celebra junto com ganhador da Copa Pistão. Afinal a copa é somente uma taça de metal vazia. Mas, para o Caetano, o McQueen ganhou. Ganhou. Como alguém ganha perdendo? É dia 29 de outubro, o Brasil elegeu um projeto declaradamente neofacista para o comando da presidência. E foi Caetano que me deu a chave de leitura para compreender esta perda. Perdemos este metal vazio. E não falo da presidência de uma república. Falo da própria república que vive seus tempos findos. O Caetano, melhor do que qualquer comentário sobre a situação, apresentou a melhor chave de leitura para organização de resistência/sobrevivência nestes tempos novos à frente. Já ganhamos por termos chegado aqui hoje do jeito que chegamos e com as superações que tivemos que fazer para chegar aqui hoje. Agora tudo será diferente e temos muito por construir.
A compreensão dos principais moldes de função missionária que constituem a história do cristianis... more A compreensão dos principais moldes de função missionária que constituem a história do cristianismo se alimenta da trajetória religiosa judaica misturada com a realidade da cultura greco-romana, também conhecida como helenista. Do nascedouro do cristianismo aos dias atuais temos um longo percurso de mais de dois mil anos. Qualquer forma de percorrer este período certamente representa um recorte intencional desde uma proposta específica. Assim, desde início vamos explicitar as motivações que constituem a organização das experiências no tempo e na geografia correspondente. A primeira motivação é a relacionada aos elementos constitutivos da função missionária, de explicitar como os elementos básicos da missão aparecerem ao longo das diferentes experiências históricas. Uma segunda motivação é a de apresentar variação de tempo que represente alterações expressivas na forma como o cristianismo tem sido estudado na história humana, assim não fugiremos à clássica organização de primeiros cristãos, período das primeiras expressões eclesiásticas, idade média, reforma protestante, período moderno e período contemporâneo. A terceira motivação é geográfica, pois à medida que o cristianismo se expandiu as formas culturais das regiões foram interagindo com as novas formas de constituição eclesiástica do cristianismo, intervindo nas expressões de vida e nas maneiras como a missão se constituiu na vivência eclesial. A quarta motivação é a representativa de segmentos culturais e socioeconômicos, pinçando dentre a imensa diversidade possível de se aproximar da experiência missionária cristã os elementos que auxiliem a entender a função missionária no aspecto de gênero, de classe social, de constituição étnica e racial e de mobilidade geofísica. Seguir a Jesus como ação fundante Às vezes o óbvio precisa ser dito: não teremos missão no contexto cristão sem o seguimento a Jesus. Mas todo óbvio não suporta as dúvidas que pairam sobre ele. Neste caso o que representa seguir a Jesus?
Intexto, 2016
Resenha do livro "Manifesto contrassexual: práticas subversivas de identidade sexual" d... more Resenha do livro "Manifesto contrassexual: práticas subversivas de identidade sexual" de Beatriz Preciado.
In the context of Brazilian society and the right of indigenous communities to expresses their in... more In the context of Brazilian society and the right of indigenous communities to expresses their individuality, the article presents confluences and differences regarding the ideas of being a subject, citizenship and social rights in the perspective o the actual context of alternative indigenous education, called the pastoral of living in community [convivencvia].
Caminhando, 2003
Metodismo e indigenismo no Brasil Em homenagem a Daniel Kidder, metodista norteamericano que entr... more Metodismo e indigenismo no Brasil Em homenagem a Daniel Kidder, metodista norteamericano que entre 1836 a 1840 viveu, observou e descreveu estas terras que chamamos Brasil Ana Claudia Figueroa 1 "'Feriados' no entender de muitos naturais do país são aqueles aos quais todos os outros dias estão subordinados. É pelo tempo das festas que a natureza produz as mais saborosas frutas e as mais lindas flores. Velhos e moços aguardam as festas com viva ansiedade. Humildes e abastados gastam, então, livremente".(KIDDER: 1980, 97) Em tempos de comemorações dos 300 anos do nascimento de João Wesley, refletir os caminhos da pastoral indigenista metodista no Brasil pressupõe duas vontades: saber como os caminhos de Wesley inspiram e se recriam nos nossos próprios caminhos; conhecer as escolhas e teologias que sustentam as iniciativas metodistas. Que estas vontades se trançem nos relatos e testemunhos que coleto a seguir.
Caminhando, 2010
A missão educacional indigenista metodista no contexto dos ideários de democracia The educational... more A missão educacional indigenista metodista no contexto dos ideários de democracia The educational mission of Methodist indigenous education in the context of the ideals of democracy La misión educacional indigenista metodista en el contexto de los idearios de democracia Ana Claudia Figueroa RESUMO No contexto da sociedade brasileira e o direito das comunidades indígenas à diferencialidade, o artigo apresenta confluências e divergências das ideias de sujeito, cidadania e direitos sociais na perspectiva do contexto atual da missão educacional indigenista alternativa, nomeada pastoral da convivência. Palavras-chave: Metodismo brasileiro; missão indigenista; pastoral de convivência.
Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos ka... more Entre os kanamari Esta noite sonhei em como Kanamari nos acolhe quando chegamos na aldeia, aos kariwá 1. Tem sempre uma casa que é designada para nos hospedar e alimentar. Agora percebo que esta casa era escolhida em função das características das famílias que provavelmente teriam mais aproximação ao seu estilo de ser ou era aquela que, dentre todas nas aldeias, mais gostavam da cultura do kariwá. Numa aldeia específica prepararam uma casa somente para nós. Ali tínhamos maior liberdade individual, no entanto, não tínhamos proteção para garantir alimentação e cuidado diante da floresta e suas demandas. Por mim, fui mais feliz quando podia ficar junto na casa de alguém. Numa aldeia em especial construímos a casa em que eu iria morar, acabando usada por muitos, pois nunca me instalei numa única aldeia, por decisão metodológica do nosso trabalho. E porque nunca amadureci para além da imaturidade infantil 2 , o que me impedia de cuidar de mim mesma na floresta e nas atribuições domésticas que envolviam as demandas da aldeia. É importante aqui dizer que a expressão família não é a mais adequada para a unidade social nuclear da constituição da organização social de uma aldeia kanamari. Como vários povos indígenas no Brasil, a aldeia kanamari tem na realidade uma organização clânica bidimensional. São, na maioria das vezes, dois grupos clânicos que constituem as tarefas cotidianas que estabelecem as regras de reciprocidade e dádiva. Assim, aquilo que chamamos casa não é bem a casa kanamari. Muito antigamente o povo kanamari morava na maloca única com os dois grupos clânicos dividindo os espaços internos na grande maloca. Como já tem mais de cem anos que não é assim eles