Subjetividade em exposição: Anonimato e alteridade em Amor de Clarice Lispector (original) (raw)

O presente artigo se propõe fazer uma leitura levinasiana do conto Amor de Clarice Lispector. Nele, pretendemos entender a epifania da personagem Ana como um evento de deposição ocasionado por uma perturbação em seu movimento interessado, ou seja, uma retirada de sua posição acomodada e de recolhimento no assento, expondo-a à fragilidade perante o arranque do bonde. Nesse evento, o rosto do cego a perturba tanto por sua fragilidade, quanto por sua não-reciprocidade por ser cego. Essa crise do compreensivo, dada pela escuridão da cegueira, revela a Ana um anonimato e desamparo próprios frente à neutralidade do verbo ser, que é puro haver, verbo sem substantivo, assim lhe causando náusea e o desespero de uma fuga. Ao mesmo tempo, essa visão do cego abre a ela uma dimensão de responsabilização infinita com a fragilidade do Outro, colocando-a assim em contato com uma alteridade que ultrapassa o circuito de sua mesmidade. Ao perceber a nudez do rosto do cego, Ana se vê também exposta e eleita, estabelecendo-se aí uma relação de assimetria.

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