O ódio à poesia, ou o “poema inecessário” (original) (raw)

A poesia, memóra excessiva

1996

pp. 155-161Na Grécia, nos seus primórdios, a poesia identificava-se com a memória. Ela era um dom das musas, filhas de Mnemosina, a Memória. O canto dos poetas é algo que não lhes pertence, que não é escolhido, mas que também não é convertível em simples dádiva, na medida em que não se deixa reduzir a um dito transmissível sem falha: ecoa nele uma origem secreta e indecifrável que o lança num devir infinito. O poeta detém assim um poder superior, o de imortalizar ou condenar ao esquecimento, que lhe confere uma autoridade particular. Como diz Mareei Détienne, «o poeta trágico é sempre um 'Mestre de Verdade'. A sua verdade é uma verdade assertória: ninguém a contesta, ninguém a demonstra». Essa Verdade é Alétheia, «nem o acordo da proposição com o seu objecto, nem o acordo de um juízo com os outros juízos; a única oposição significativa é a de Alétheia e de Léthe».^ Os factos contados na poesia épica não o são a partir da memória humana e da invenção, mas da memória divina, d...

“Nenhum poema a menos”

Revista Aurora, 2019

O presente artigo se propõe trazer breves reflexões a respeito da Teoria de Ator-Rede (TAR) apresentada por John Law em sua obra “Notas sobre a Teoria do Ator-Rede: ordenamento, estratégia, e heterogeneidade” (1992) e por Bruno Latour (2012) em sua obra: “Reagregando o Social: uma introdução à Teoria do Ator-Rede” a partir de três momentos da vida de Suzana Chaves: 1) Denúncia dos assassinatos de desaparecimentos de mulheres e a omissão do Estado para resolução dos conflitos; 2) Assassinato de Suzana e o ativismo político gerado a partir de sua morte; 3) Como sua história torna-se um símbolo criando uma narrativa sobre os feminicídios e direitos das mulheres que vai além do contexto local (Cidade Juarez, México). A partir desses três momentos distintos de sua vida, pretendo articular e mostrar como os diferentes atores-redes e atrizes-redes (humanos e não humanos) vão interagindo em cada um desses momentos a partir do papeis que desempenham. Recebido: 23/04/2019Aceito: 31/05/2019

As Flores do Mal e o fracasso do poema

Alea-estudos Neolatinos, 2007

Basing itself on a reading of The bad monk, the essay revisits the discussion about Baudelaire’s reflexion on the conditions of poetry, which presents the poem’s work as production/ mise en scène of the experience of its own failure.

Em flagrante delírio: sobre a poesia como 'produto de excelência'

Proceedings of the Delyra Young Research Journey, org. by Pedro Eiras and Joana Matos Frias

The relationship between literary criticism and poetry is nowadays a particularly puzzling one, mainly due to the overwhelming multitude of available narratives supporting the interpretative discourses. In this essay I start with a clearly functionalist definition of poetry, as the catalyzer for a brief review of the 20th century critical tradition, focusing on the effects that follow some of the most well-known “common places” in literary criticism.

Coletivos: poesia e endividamento

Cadernos de Letras da UFF, 2020

É importante destacar o quanto o vocabulário financeiro se infiltrou na poesia brasileira contemporânea de jovens autores, em relação direta ou indireta com o problema do endividamento. Não por acaso, esse léxico da financeirização da vida foi se ampliando à medida que o neoliberalismo avançava durante os anos 2000 e 2010, quando a desigualdade socioeconômica foi se amplianda no mundo, ao mesmo tempo que as tecnologias digitais traziam condições de novos atores se colocarem na cena literária. O trabalho poético em torno do endividamento se manifesta como um dos aspectos mais instigantes da produção contemporânea no seu embate com questões do tempo presente, sendo um dos aspectos de consumação da impossibilidade de manutenção de certas tópicas da lírica, entre elas, o erotismo. O problema do endividamento na poesia brasileira contemporânea também pode ser analisada a partir de uma perspectiva mais econômica e sociológica, dando a ver os paradoxos de uma fase em que o Brasil se lançou...

Fracasso, desvio e negação da norma - e suas poéticas

SIMPOM, 2018

Este trabalho busca apresentar questões relativas à importância do fracasso na arte enquanto estratégia de inovação e fomento à diversidade. Enquanto matéria-prima criativa, fazemos a distinção de fracasso enquanto desvio da norma e enquanto negação da mesma, uma vez que enquanto o primeiro explora o fracasso a partir de uma dimensão estética, o segundo o faz a partir de uma dimensão poética.

A querela entre filosofia e poesia no Protágoras: uma aporia

Nuntius Antiquus

No Protágoras, há uma passagem intrigante. Depois de pedir a Protágoras para evitar longos discursos (334d), por supostamente ter curta memória, Sócrates responde ao sofista em um longo discurso sobre um poema de Simônides, do qual Protágoras citara duas sentenças. Desse modo, Sócrates se revela não só possuidor de excelente memória, uma vez que apresenta várias outras sequências do poema, como também um perito na interpretação de poesia. Nesse longo discurso, também, ele se refere à sofística na Lacedemônia como equivalente à filosofia (342b). Essa passagem, como se propõe, fornece algumas chaves de leitura para as relações entre sofística e poesia, por um lado, e entre poesia e filosofia, por outro. Pode-se observar aqui o uso da ironia não só por parte de Sócrates como também por parte de Platão.

Poesia e melancolia. A invenção da vontade de potência?

Cadernos Nietzsche

Resumo O artigo descreve o poema “An die Melancholie” (1871) como um momento crucial e essencial da evolução da filosofia de Nietzsche, aquele de uma primeira intuição da noção de “vontade de potência”. O filósofo se afasta da longa tradição alemã dos hinos à melancolia, ao mesmo tempo em que subverteu os poemas filosóficos - os darwinistas em particular - de sua época, para superar seu pessimismo schopenhaueriano.