Fragmentos semificcionais de um passado distante que insistem em aparecer (original) (raw)
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Fragmentos De Uma História Não-Acontecida
2007
Encostei-me a ti, sabendo que eras somente onda. Sabendo bem que eras nuvem, depus a minha vida em ti. Cecília Meireles [segundo um] Eu seguraria sua mão tão delicadamente, quase como um roçar. Longas mãos magras, mas pequenas como de criança, dedos finos, as sempre unhas pintadas de escuro quase vermelho. Você pensa meus olhos cansados e a as veiazinhas azuis na estreita faixa de pele abaixo dos meus olhos que você não tem e retira de mim, do meu rosto, um cílio partido e perdido no espaço entre a boca e os olhos. Eu digo a você o corpo morto do outro que me prende impede de dizer as coisas; a você, essa mulher viva na minha frente nessa manhã em que eu penso o corpo outro do morto que não morrera da causa mortis dele, mas de uma morte não anunciada surpreendente. Insensatez, uma morte que prenuncia outra morte, menor e mais acanhada mas morte, isso eu sei que você pensaria sem nunca dizer. Você pensa mas eu não posso saber que você pensa. Eu, o homem da vida interditada, só saberei quando você me mandar a página, se você me mandar a página que contém o texto em que você ficcionaliza tudo. Você pensa nesse exato momento: Estranho, pai que morre no nascimento de um marido. Tomar um lugar de pai, mesmo sem querer. Querendo? Eu não penso essas coisas, mas você, seu vício de análise relacional, você sim, você pensa, inevitavelmente: como a vida de algumas pessoas é insuportável transbordante de símbolos. Um desperdício porque imperceptível para elas próprias, a elementaridade da vida cotidiana, seus dias após dias, inertes, refolhados como pequenos repolhos que nunca se abrem depois de formados e só exibem seu interior quando cortados ao meio, as metades estriadas. [dois] Ela pede milhões de vezes e já cansa de pedir de implorar um espaço-tempo na agenda dele, a agenda de uma vida interditada. Ela não sabe pedir coisa alguma. Ela que manda e-mails e
Pedaços de nós: memórias de um passado presente
Pedaços de nós: memórias de um passado presente é uma coletânea de crônicas, contos e memórias sobre o desenrolar da vida cotidiana, dando ênfase às crenças, superstições, linguagens e, sobretudo, à forma como as pessoas comuns veem, sentem, vivem e explicam o mundo que as cerca. A pesquisa que o subsidia começou em fevereiro de 2005 a partir do levantamento de vocábulos, expressões, pensamentos, adágios, costumes, entre outros elementos constitutivos da cultura popular sertaneja. Mesmo sendo um livro que abordará pedaços da vida cotidiana, buscamos desenvolvê-lo na perspectiva da totalidade, tentando relacionar os acontecimentos aparentemente isolados, fragmentados, com o todo social do qual são constituintes. Como de costume nas publicações do autor, mantivemos ao lado do título de cada texto o período no qual ele foi escrito, tendo em vista tratar-se de uma obra construída ao longo de mais de uma década cujo intervalo de tempo não pode ser ignorado na forma ou no conteúdo das questões abordadas. Por fim, deixamos registrados os nossos agradecimentos a todas as pessoas que contribuíram direta ou indiretamente com a presente obra. Em especial, agradecemos ao companheiro Lourenço Menezes que, gentilmente, permitiu que usássemos o desenho de sua autoria como ilustração na capa do livro em tela.
O Gótico e a presença fantasmagórica do passado
RESUMO: O Gótico consolidou-se como uma tradição artística que codificou um modo de figurar os medos e de expressar os interditos de uma sociedade. O que se chama de literatura gótica é, pois, a convergência entre uma percepção de mundo desencantada – com as cidades modernas; com o futuro que o progresso científico nos reserva; com o papel insignificante do homem no cosmos; com a própria natureza dessacralizada do homem – e uma forma artística estetizada e convencionalista. Entre os muitos elementos convencionais dessa tradição, três se destacam: o locus horribilis, a personagem monstruosa e a presença fantasmagórica do passado. O objetivo desse artigo é descrever o último desses aspectos, a fim de compreender sua motivação cultural, sua relação com a visão de mundo gótica e suas consequências para a estrutura narrativa desse tipo de ficção. Sendo um fenômeno moderno, a literatura gótica carrega em si as apreensões geradas pelas mudanças ocorridas nos modos de percepção do tempo a partir do século XVIII. A aceleração do ritmo de vida e a urgência de se pensar um futuro em constante transformação promoveram a ideia de rompimento da continuidade entre os tempos históricos. Os eventos do passado não mais auxiliam na compreensão do que está por vir: tornam-se estranhos e potencialmente aterrorizantes, retornando, de modo fantasmagórico, para afetar as ações do presente.
Sinais da historicidade revelados em fragmentos de memória
Revista do Instituto de Estudos Brasileiros
Este artigo tem como proposição a apresentação reflexiva de narrativas de três interlocutoras que possibilitam descortinar fragmentos das relações sociais estabelecidas no ambiente familiar e comunitário em Itapina, distrito de Colatina, Espírito Santo. O lugar, constituído no final do século XIX, se tornou um dos polos comerciais de café mais importantes do estado no primeiro quartel do século XX, com o estabelecimento e o fortalecimento de uma elite econômica, social e cultural no contexto do Noroeste e perdeu seu vigor econômico nos anos de 1960 com a erradicação do café. A partir de então a grande maioria dos moradores migrou para a sede do município ou para outras regiões do país. O texto é ancorado nas perspectivas teórico-metodológicas da memória e da história oral.
Retratos de um passado recente
2015
Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Programa de Pós-Graduação em Literatura, Florianópolis, 2015.Esta tese procura investigar as razões e os desdobramentos da existência de dois periódicos culturais estudantis, Universitário (1974-1975) e O Acadêmico (1975-1982), que circularam no interior de Santa Catarina, na cidade de Blumenau, especificamente na Fundação Regional de Blumenau (FURB) durante os anos de 1970. A partir de relatos de memória advindos de um passado recente e construídos como narrativas do agora, obtém-se a configuração da história desses projetos. Assim, o objetivo deste estudo é conhecer a conjuntura histórica desse corpus e também analisar o discurso que nele se apresenta, sobretudo apontando sinais de crítica e resistência ao regime autoritário em Blumenau. Para tanto, foram indexadas 11 (onze) edições do jornal Universitário, incidindo, de forma predominante, a publicação de artigos-informes; em seguida, o ...
Caos, 2022
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Heranças do passado no léxico do semiárido baiano
2016
Resumo: Apresenta-se, neste trabalho, uma análise das denominações coletadas pelo Projeto Atlas Linguístico do Brasil (ALiB) para uma pergunta, a saber: 122. Numa certa idade acaba a menstruação. Quando isso acontece, se diz que a mulher? pertencente ao Questionário ALiB (2001). Foram escolhidas 05 cidades da Bahia: Euclides da Cunha, Juazeiro, Jequié, Seabra e Irecê. Assim, objetivase analisar as possíveis variações e mudanças sofridas na língua, sob a ótica da Sociolinguística e da Dialetologia, duas áreas que apregoam o caráter dinâmico, mutável e diversificado da língua, bem como o vínculo entre ela e a cultura. Busca-se, também, apurar como as escolhas lexicais dos informantes denunciam aspectos variados. Utiliza-se a metodologia do ALiB: 04 informantes por localidade interior, dos sexos masculino e feminino, duas faixas etárias, faixa I e faixa II e com o nível fundamental. Percebe-se, de forma evidente, que os informantes da faixa etária II possuem, em seus repertórios lexica...
Os rastros contemporâneos das memórias que nos contam
Revista Limiar, 2021
Com Paul Ricoeur pensamos a memória traumática e os efeitos dos rastros subjetivos que emergem no contemporâneo tendo em mente a ditadura militar brasileira e as políticas democráticas de memória. A reflexão parte da percepção de que o legado autoritário e suas atualizações fragilizam a democracia. Sem desconsiderarmos a prioridade das vítimas, dos familiares e dos sobreviventes e suas lutas por memória e justiça, pensamos a elaboração da memória impedida como reconhecimento e partilha de um passado comum cujos aspectos nefastos dos não ditos passam por manipulações de memória que fraturam a identidade do homem capaz. Refletimos ainda sobre os efeitos do esquecimento comandado de modo abusivo a partir da constatação da dissimetria entre os conceitos de anistia, justiça e perdão. No percurso destacamos o papel do testemunho e a função mediadora dos atos de justiça na idealização de uma memória constitutiva de outro mundo possível.
Fragmentos do contemporâneo: leituras
2009
Apresentação 7 1 Poesia em trânsito: rotas e endereços do labirinto do poema contemporâneo 13 Susanna Busato 2 Como beber desse Leite derramado 47 Sérgio Vicente Motta 3 Dalton Trevisan e Valêncio Xavier: repetição e montagem como problematização da autoria 81 Arnaldo Franco Junior 4 A escrita-corpo e o corpo da escrita em Llansol 105 Sônia Helena de O. Raymundo Piteri 5 Memórias/vozes entrecruzadas no discurso ficcional de Antonio Lobo Antunes 121 Maria Heloísa Martins Dias 6 Visões do 11 de setembro em Don DeLillo 137 Giséle Manganelli Fernandes 7 O estilo do autor em Viva o povo brasileiro e do autotradutor em An invincible memory 155 Diva Cardoso de Camargo