Fé e Saber Habermas (original) (raw)

Retirado de: HABERMAS, Jürgen; Fé e saber. Tradução: Fernando Costa Mattos. São Paulo: Ed. Unesp, 2013. pp. 1-26. [1] Se a preocupante situação atual nos tira a possibilidade de escolher o tema, é grande a tentação de, como verdadeiros intelectuais John Waynes, competir para ver quem saca e atira mais rápido. Ainda há pouco os espíritos se dividiam a respeito de outro tema: se e em que medida deveríamos submeter-nos a uma autoinstrumentalização ou mesmo perseguir a meta de uma auto-otimização por meio da engenharia genética. Durante os primeiros passos nesse caminho, deflagrou-se uma luta de valores últimos entre os defensores da ciência organizada e as Igrejas. Um dos lados temia o obscurantismo e uma exaltação de sentimentos arcaicos que alimentassem o ceticismo em relação à [2] ciência, ao passo que o outro lado se voltava contra a crença no progresso científico, própria de um naturalismo cru que pretenderia enterrar a moral. Mas em 11 de setembro a tensão entre a sociedade secular e a religião explodiu de uni modo inteiramente diverso. Decididos ao suicídio, os assassinos que transformaram máquinas de aviação civil em mísseis vivos, dirigindo-os contra as cidadelas capitalistas da civilização ocidental, foram motivados por convicções religiosasconforme ficamos sabendo, nesse meio tempo, pelo testamento de Atta e pelas palavras de Osama Bin Laden. Para eles, os marcos da modernidade globalizada incorporavam o Grande Satã. Mas, também entre nós, testemunhas oculares universais desse acontecimento "apocalíptico" transmitido pela televisão, o instante da queda das torres gêmeas de Manhattan, repetido à exaustão de maneira masoquista, acabou por inspirar imagens bíblicas. E a linguagem da vingança, com a qual o presidente americano não foi o único