Heidegger, filósofo da técnica moderna. In: In: Róbson Ramos dos Reis; Andréa Faggion. (Org.). Um filósofo e a multiplicidade de dizeres : homenagem aos 70 anos de vida e 40 de Brasil de Zeljko Loparic. Campinas: Unicamp/CLE, 2010, v. 57, p. 53-86. (original) (raw)
Resumo: Dividido em seis partes, o artigo apresenta e discute as principais teses do ensaio " A questão da técnica " , de Heidegger. Estas teses são referidas à hipótese tardia de Heidegger a respeito da história do Ocidente como a história dos envios epocais do ser, aspecto que marca a originalidade dessa análise a respeito da essência da técnica e da ciência modernas, em relação à discussão heideggeriana prévia sobre a ciência e sobre a natureza no âmbito do projeto da ontologia fundamental de Ser e Tempo, de 1927. Palavras-chave: Heidegger, técnica, dispositivo, ontologia fundamental, história do ser Abstract: Divided in six parts, the article presents and discusses Heidegger's main theses in his 1953 essay, " The question of technology ". These theses are related to Heidegger's late hypothesis concerning Western history as the history of Being's epochal sendings. This theoretical frame stresses the originality of Heidegger's late analysis concerning the essence of modern technology and modern science in contrastto his previous analysis on modern science and nature in the context of Being and Time's project of fundamental ontology, from 1927. I. A técnica moderna: nem um bem, nem um mal Nossa vida é de tal forma circundada pela tecnologia que o mais das vezes nem sequer nos damos conta dela: tudo se passa como se a técnica tivesse se transformado em nossa segunda natureza, decalcando-se sobre nossa pele. Aliás, por isso mesmo talvez já não seja mais adequado falar que a tecnologia 'circunda' nossa vida, visto que ela de fato se interpõe e determina previamente nossas relações conosco mesmos, com os outros e com a natureza. Por certo, os avanços e descobertas tecnológicos com os quais vivemos cotidianamente trouxeram consigo a certeza de que vivemos no melhor dos mundos possíveis. Ao longo do século XX, a tecnologia nos permitiu encurtar distâncias espaciais e culturais que antes impediam a livre informação e o rápido acesso às mais diferentes regiões do planeta, de modo que hoje podemos finalmente nos sentir em casa no mundo todo. Ademais, com o mapeamento do genoma humano, já estamos inclusive a ponto de encontrar soluções para males que, desde sempre, afligiram nossa condição frágil e mortal.