PEREIRA, B. T. Celso e a Doutrina Verdadeira: o conflito filosófico entre as concepções pagãs e cristãs no Império Romano do séc. II-III d.C. 112 f. (Monografia). (original) (raw)

Aos fins do séc. XIX, primeiramente a Europa e, em seguida, as Américas, se interessaram novamente pelos padres apostólicos. Esses homens, que têm seu esquecimento iniciado a partir do séc. IV d.C. devido ao Concílio de Nicéia, que foi o primeiro a deliberar ecumenicamente os nortes da cristandade, são retomados na contemporaneidade para mostrar ao Ocidente suas raízes influenciadas pelo cristianismo, provenientes do Império Romano. A religião que conseguiu um maior nível de uniformidade aos fins da Antiguidade e no período do Medievo – sem deixar, entretanto, de ter cismas e desacordos esporádicos –, nem sempre foi assim; os primeiros séculos pré-nicenos são marcados por inúmeras seitas cristãs que futuramente são tachadas como heréticas, dissidentes, deturpadoras da verdade. O cristianismo propagado pelos primeiros apóstolos segue por vários caminhos, cada qual crendo ser a orientação à verdade absoluta; homens iletrados que eram os apóstolos – com exceção de Paulo –, propagando uma nova doutrina, chamam a atenção daqueles que eram alfabetizados e que, consequentemente, são lembrados como os patrísticos que interpretam os evangelhos, lançando as bases da cristologia e do que o cristianismo viria a ser. Nesse contexto inicial, Celso, um provável cidadão romano que se opõe a esses cristãos, tendo também vivido essa efervescência das primeiras ideias cristãs, presentes em sua obra Discurso Verdadeiro Contra os Cristãos, apresenta essas circunstâncias em que um movimento que era divergente de suas origens judaicas, que clamava a ancestralidade de todo o conhecimento greco-romano, que se pronunciava como o detentor da doutrina verdadeira, não fazia nada mais que reivindicar como originais aquelas características que perpassavam várias civilizações. Intentamos perceber nesse trabalho os períodos iniciais desse cristianismo primitivo, abarcando os três primeiros séculos, com enfoque na segunda metade do séc. II d.C. até a primeira do séc. III d.C., quando Celso supostamente compõe seu discurso. A partir do mesmo, observamos que o manuscrito não era um apelo à extirpação desse movimento cristão, mas, uma tentativa de mostrar ao mesmo os prejuízos que ele acarretava à estabilidade do Império Romano, já que os cristãos se negavam a participar dos cultos comuns e das atividades públicas. Nosso destaque, portanto, se faz presente nos meios educacionais desse Império, que pensamos serem um dos sustentáculos da cultura greco-romana. Almejamos, isto posto, compreender o Discurso Verdadeiro Contra os Cristãos como um documento que pretendeu combater as crescentes doutrinas e filosofias cristãs dos dois primeiros séculos, nos quais Celso foi o primeiro autor a redigir um discurso sistematizado contra o que ele julga ser um grupo religioso instável e contraditório.