Literatura brasileira contemporânea: por uma reinterpretação do dilema nacional (original) (raw)
2016, Anais do XV Encontro da Associação Brasileira de Literatura Comparada
Ainda que não se reconheça a identidade nacional sem a formatação que o grande ensaísmo de 1930 conferiu ao país, é hora de atualizar as fontes eminentemente “culturalistas” de tal avaliação. A premência da matéria se dá pelo avançar da modernidade precária instalada, que sem dúvidas impõe configurações sociais e culturais mais complexas, das quais as velhas imagens dos “intérpretes do Brasil” não podem seguir dando conta. Entendemos que além da modernização brasileira extrapolar as tentativas de explicação arquetípica, insistir nesse enfoque é ignorar a profissionalização da pesquisa universitária no país, bem como da sociologia que deriva com rigor de Florestan Fernandes. É imprescindível agregar tal experiência sociológica “dura” como contraparte aos voos livres da tradição ensaística consagrada. É o paralelo com tal sociologia da modernidade brasileira que queremos traçar ao ler a literatura produzida no Brasil e, de modo mais detido, a literatura brasileira contemporânea, num recorte que recua aos anos 1990. Não seria com imagens dúplices ou tríplices que poderíamos ler uma literatura que deve seus melhores momentos justamente à elaboração da complexidade social que a origina. “Chaves-interpretativas” não dão conta, a nosso ver, nem da forma de romances tão distintos como, por exemplo, “Joias de família”, de Zulmira Ribeiro Tavares (1990) e “Cidade de Deus”, de Paulo Lins (1997), nem muito menos do problema de autoria, tão marcado no caso de “Cidade de Deus”, mas que, a sua maneira, deve propriamente definir também o modelo de literatura encampado por Tavares. É até nas limitações poéticas e narrativas dos dois romances, para além do feito estético reconhecido em ambos os casos, que a matéria brasileira vai sugestioná-los amplamente, deixando a marca provisória de uma evolução social cujo dinamismo e eficácia atualizada no campo da dominação a igualmente moderna sociologia brasileira soube captar.