DIFERENÇA: UM CONCEITO NECESSÁRIO (original) (raw)

DIFERENÇA E OPOSIÇÃO: UMA CONTROVÉRSIA

Griot: Reivsta de FIlosofia, 2021

O trabalho cumpre dois propósitos. Tem como objetivo amplo relativizar a divisão entre o estruturalismo e sua pretensa superação ou prosseguimento, com o pós-estruturalismo. O faz a partir de um procedimento específico: o modo como Saussure desenvolve e antecede teses caras a filosofia da diferença de Deleuze. Inicia pela crítica que Deleuze endereça ao estruturalismo do primeiro como incapaz de apreender tanto a diferenciação quanto a organização das diversas formas de experiência. O foco em Saussure se deve ao fato de que Deleuze considera este um descobridor da diferença no âmbito da linguagem, embora insista em lê-la em termos opositivos e, portanto, negativos. Um “descobridor encobridor”, pode-se dizer, que traz à luz a dinâmica diferencial do sentido e, ao mesmo tempo, encobre-a pela imagem tradicional do pensamento que é subordinada à identidade. Em seguida, ficará claro como esta leitura não considera as verdadeiras posições da filosofia da linguagem elaborada por Saussure e que esta deve em muito ser afastada de alguns dos seus considerados herdeiros e seguidores (consideramos o caso exemplar de Trubetskoy, tal como o fizera o próprio Deleuze noutro sentido). A conclusão é que a teoria do valor voltada ao sistema linguístico antecede a teoria diferencial das faculdades que Deleuze emprega a compreender cada das estruturas de nossa existência.

DISCURSO DE ÓDIO E NEGAÇÃO DA DIFERENÇA

2020

INTRODUÇÃO Ethos, pathos, logos correspondem respectivamente à credibilidade, à emoção e à razão, elementos que desde a Antiguidade clássica são mo-bilizados pela arte retórica com vistas a persuadir. Conhecedores do po-der da palavra, os gregos faziam da argumentação um meio indispensável para o exercício da cidadania nos debates que eram travados na ágora. No contexto atual, temos assistido à escalada de uma retórica tóxica que tem como principal objetivo atingir os direitos humanos. Antissemitismo, xe-nofobia, homofobia, jihadismo, racismo são algumas das manifestações de ódio que geram perplexidade, pois deixam no ar uma interrogação sobre a continuidade do convívio democrático nas sociedades atuais. O uso da palavra, que já foi o motor da construção política da civilização grega, vem se tornando um obstáculo ao convívio, devido à adoção de um discurso baseado no "eles contra nós". Sob o falacioso argumento do exercício da liberdade de expressão, grupos e líderes políticos vêm empregando discursos que visam desuma-nizar comunidades inteiras através de toda sorte de insultos. O objetivo é criar bodes expiatórios para os mais diferentes problemas, fazendo-os ocupar o papel de inimigos públicos da sociedade, da família, do Estado.

SÉCULO XXI: O DESAFIO DA DIFERENÇA PURA

Proêmio. Esta Conferência extrai, por amor (e sem vergonha), especialmente de Ezra Pound (em seu pequeno-grande livro ABC da literatura), as seguintes inspirações para este Proêmio. (1º) o que aqui será dito “não se destina aos que chegaram ao pleno conhecimento do assunto sem conhecer os fatos” (2º) a Tese-Manifesto (gênero híbrido) consiste num “panfleto polêmico”, que contém “um sumário das partes mais eficazes ou contundentes” de “escaramuças críticas”, durante a “tomada de consciência de um inimigo” (3º) suas palavras seriam “suficientemente impessoais para que possam servir de manual” (4º) no entanto, a autora gostaria que essas palavras fossem escutadas e lidas “tanto com prazer como com proveito” (5º) por quem? (a) “pelos que não estão mais na escola”; (b) “pelos que nunca freqüentaram uma escola”; (c) e por aqueles que, “em seus dias de colégio, sofreram aquelas coisas que a maior parte” de nossa “própria geração sofreu” (6º) uma “palavra especial para os professores”: (a) não semearei “espinhos frivolamente em seu caminho”; (b) “gostaria até de fazer com que os seus encargos e a sua vida se tornassem mais alegres”; (c) e, sobretudo, de preservá-los da “inútil caceteação numa sala de aulas” (p.18-19) (7º) uma advertência: “O professor ou conferencista é um perigo. Ele raramente tem consciência de sua natureza ou de sua posição; ele tem de falar durante uma hora”. O seu “primeiro problema”, portanto, “é ter palavras suficientes para preencher 40 ou 60 minutos”. Ora, aquele “que realmente sabe”, “pode dizer tudo o que é transmissível nalgumas poucas palavras”. Porém, cuidado: “por mais honesto que se seja, o perigo existe, mesmo quando a gente o conhece”. Logo, indagamos: “Qual é a mais simples colocação possível”? Sem esquecer que a “verdadeira educação deve limitar-se, exclusivamente” àqueles “que insistem em conhecer”; pois “o resto é pastoreio de ovelhas” (p.79) (8º) abstenho-me de apontar qualquer objetivo para esta Tese-Manifesto: cada um o encontrará por si mesmo. No entanto, apenas “poderá descobri-lo com ouvidos e olhos atentos. Se não lograr descobri-lo sozinho, explicação alguma o fará compreender”. Utilizei, “no caso, um único e claro princípio” (p.124) (9º) qual seja, é preciso: (a) “restituir a Filosofia-Educação ao seu sentido original, e este sentido é um só: experimentação, descoberta, criação”; (b) “substituir a instrução pela experimentação e pela invenção”; (c) pois, “a experimentação, a criação, a descoberta e a invenção devem constituir a forma do ensino”, “de sua instrução e de sua formação” (Pignatari, 1971, p.57; p.59) (10º) para tanto: “Continuar a espantar-se; continuar a ser novo, e até o fim, ante tudo o que é novo, pois tudo é novo para quem é novo. Não ceder ao hábito, que é usura progressiva; e tudo se torna poeirento e cinza, tudo se torna igual ao que somos, tudo se parece e se repete, porque nós nos parecemos e nos repetimos. Seria preciso que o homem se acrescentasse à criança, sem dela desprender-se, que a criança subsistisse dentro do homem, que fosse uma base para a construção de acréscimos sucessivos – que não a destruíssem, como acontece. Não basta ser apenas um primitivo, mas é preciso ser também um primitivo. Permanecer ‘primeiro’ em presença das coisas primeiras; elementar, diante do elementar; ser capaz de, sempre, devir e não apenas ser: não imóvel, mas em movimento, em meio ao que é móvel; em contato incessante com o que se transforma, transformando-se a si próprio; como a criança, entregue totalmente ao exterior, mas com esse retorno a si mesmo, que a criança não tem, em direção a um interior onde se recolhem e se ordenam as coisas” (C. F. Ramuz, “Pages de Journal”, Fontaine, n.33, 1944 – apud H. Read apud Pignatari, 1971, p.11)

A DISTINÇÃO ENTRE CONCEITO E CONCEPÇÃO

O leitor provavelmente deve ter notado em diversas passagens deste trabalho a adoção das expressões " conceito " e " concepção ". Quando afirmei que Finnis possui uma " concepção de casamento " , o que esperei do leitor foi que entendesse essa afirmação no seguinte sentido: que Finnis tem uma compreensão particular do que seja o casamento, e que esta compreensão não é, obrigatoriamente, a mesma da minha ou de outras pessoas. Em outras palavras, trata-se da forma pela qual Finnis responde à questão " o que é casamento? " , que pode ou não corresponder à forma pela qual outras pessoas responderiam a mesma questão. De qualquer sorte, deixei subentendida uma ideia que se tornou comum no pensamento filosófico e que faz referência à distinção existente entre tais expressões – a distinção entre conceito e concepção 1. Tal distinção é central para a compreensão da teoria dworkiniana. Não se trata de uma ideia própria de Dworkin; outros autores, como Hart e Rawls, utilizam-na em suas respectivas obras 2. Entretanto, acredito que Dworkin apresenta de forma clara a distinção, razão pela qual optei por analisá-la neste capítulo sem prejuízo do seu uso 1 A relevância da distinção pode ser atribuída às observações de Walter Bryce Gallie, conforme se verifica em seu artigo Essentially contested concepts (GALLIE, 1956), apresentado em um encontro da Aristotelian Society de Londres. A ideia central de Gallie é de que os indivíduos discordam sobre o uso de determinados conceitos, como seria o caso de " arte " , " democracia " e " tradição cristã ". Se não bastasse, as pessoas defendem suas visões sobre o uso de tais conceitos através de argumentos, evidências e outras formas de justificação (GALLIE, 1956, p. 168). Stephen Guest (2010, p. 40) atribui à Gallie a " análise seminal da distinção entre conceitos e concepções ". Segundo Guest (2010, p. 40), " Gallie argumenta que alguns conceitos, tais como a arte, a democracia, a justiça social e a 'vida cristã' são, por natureza, ideias que só podem ser entendidas como envolvendo argumento controvertido. Ele relaciona várias condições que são em parte descrições de qualquer conceito 'essencialmente contestado' e estas acarretam, penso, a ideia de que tais conceitos são entendidos por meio de diferentes concepções ". Neste sentido, o conceito de " casamento " também encontra divergências quanto ao seu uso: Finnis acredita, argumentativamente, que o conceito de casamento está restrito às uniões heterossexuais e representa um bem humano básico onde, além da amizade entre os cônjuges, há a prática de atos de tipo reprodutivo. Outros defenderão que o uso do conceito de casamento não se restringe aos casais heterossexuais, mas pode abranger a união entre pessoas do mesmo sexo, fornecendo justificativas para tanto. 2 Neste sentido, podemos afirmar que O conceito de direito, de Hart, corresponde à " concepção " hartiana do Direito (GUEST, 2010, p. 41). Já Uma teoria da justiça, de Rawls, expõe a " concepção " rawlsiana sobre o que é justiça. Rawls, neste sentido, é explícito: " Assim, parece natural pensar no conceito de justiça como sendo distinto das várias concepções de justiça e como sendo especificado pelo papel que estes diferentes conjuntos de princípios, essas diferentes concepções, têm em comum. Desse modo, os que defendem outras concepções de justiça podem ainda assim concordar que as instituições são justas quando não se fazem distinções arbitrárias entre as pessoas na atribuição de direitos e deveres básicos e quando as regras determinam um equilíbrio adequado entre reivindicações concorrentes das vantagens da vida social " (RAWLS, 2002, p. 6).

Criação na perspectiva da diferença

Revista Digital do LAV, 2010

O texto apresenta conceitos de criação em teorias ligadas as artes visuais e pesquisas ligadas à área da educação. A finalidade é mostrar o modo como o criar infinitivo, força inegável de toda aprendizagem, se coloca perante a perspectiva da Filosofia da Diferença, em especial no pensamento de Gilles Deleuze. Num plano geofilosófico é traçada a problematização noológica da criação, visto que o criar, em si, é um problema imanente a todo o pensar. Ao criar se contrapõe o uso estereotipado, clichê, das opiniões do senso comum. A criação exige algo diferente do já sabido, conhecido, pensado, de modo a arrastar o pensamento para zonas indeterminadas de um caos inimaginável que só a arte é capaz de exprimir. Impossível de ser colada à imagens prontas, a noologia da criação só pode ser analisada junto as regularidades einconstâncias dos fluxos da Terra.