CIDADES UTÓPICAS DO RENASCIMENTO (original) (raw)
Thomas Morus, em 1516, criou a idéia de utopia ao descrever uma ilha imaginária com uma sociedade perfeita em todos os sentidos. O surgimento desse gênero literário, tão próximo da história, da filosofia e da política, está ligado ao processo burguês de racionalização da vida. O Renascimento sintetizou um grande experimento de racionalização da vida humana. Para construir a sua sorte e o destino da humanidade, os homens daquela época fixaram normas de conduta e quiseram regulamentar cada aspecto da vida prática. A lógica desta idéia levou à construção de critérios universalmente válidos para cada atividade, com normas, regras e códigos: surgiram assim os tratados sobre o perfeito cortesão, sobre o perfeito ministro, sobre o perfeito homem do mundo. Essa necessidade de impor uma racionalidade à vida individual e coletiva, inevitavelmente, chegou ao urbanismo renascentista. Nos termos renascentistas, a nova cidade é fundada pela necessidade da virtù combater eternamente a fortuna ameaçadora. As cidades medievais haviam se desenvolvido anarquicamente, pelo impulso das iniciativas individuais. Mas essa estrutura comunal foi substituída pelas iniciativas de príncipes desejosos de ampliar seu poder e de instaurar a ordem. Na Itália, surgiram soberanos construtores que sonhavam com novas cidades e, pela oportunidade, arquitetos do Quattrocento planejam cidades num estilo racional e geométrico. Mas não é possível modificar as muralhas sem modificar os homens: a cidade é o espelho e a dimensão do homem. A organização social passa a ser uma preocupação dos urbanistas, colocando o ser humano no centro de suas construções, e sonham em torná-los idênticos: que a uma cidade sã e racional corresponda um novo homem! Aparecem então os teóricos de um urbanismo utópico. Não é fundamental que tais cidades ideais sejam de fato construídas: mesmo sem saírem do papel, servem para a melhor compreensão das limitações de nosso presente, e sugerem cidades melhores do que as nossas. E, se puderam ser pensadas, poderão ser construídas. Aos seus grandiosos projetos de cidades com traçados retilíneos, os urbanistas unem o desejo de regulamentar a vida dos habitantes, de fazer da sociedade um minucioso alvéolo onde cada um possa encontrar o seu lugar e a sua função. A De re aedificatoria de Leon Battista Alberti (1452), testemunha a superação da arquitetura pela noção de construção social. Na sua cidade, as classes são distribuídas em bairros diferentes, as ruas são reservadas para determinados ofícios, são previstos asilos para os pobres. Antonio Avelino, o Filarete (1400-1466), florentino a serviço de Galeazzo Sforza, tem intenções maiores. No seu Trattato desenha uma cidade fantástica chamada Sforzinda, um projeto digno das ambições do duque. Ele a situa numa planície fértil, sobre terras fecundas, onde é possível unir países da Cocanha com o utopismo popular. As muralhas, com um