O enigma pentecostal (original) (raw)

O pentecostalismo é, sem dúvida, um dos temas mais estudados no campo das ciências sociais. O volume de material acadêmico produzido sobre esse assunto é de deixar desesperado qualquer pesquisador. No entanto, apesar de toda a discussão, de todo o debate e de toda a produção sobre os pentecostais, esse é também o objeto mais esquivo e mutante dentre aqueles disponíveis para pesquisa. Sobre o pentecostalismo o máximo que podemos fazer é tirar uma sucessão de retratos instantâneos e abandonar a pretensão de se produzir qualquer sequência de cenas razoavelmente conectadas e coerentes. Continuando com essa metáfora, podemos dizer que sobre ele dá para fazer uma colagem de fotos contextualizadas no tempo e no espaço, mas não um filme, pois não existe nenhum elemento no universo pentecostal, capaz de oferecer um roteiro único e abrangente sobre o fenômeno. O pentecostalismo é sempre mais, é sempre outro. O pentecostalismo é um fenômeno que, para a maior parte das pessoas, permanece como um terreno sombreado no campo de conhecimento. A visibilidade que ele alcançou, nos últimos tempos, faz com que as pessoas em geral saibam do que se trata, mas poucos o conhecem de fato. O conhecimento que se tem das igrejas pentecostais não vai muito além daquilo que a mídia secular deseja ou consegue mostrar. A consequência é que se criou, em grande medida, uma visão estereotipada do pentecostalismo e suas igrejas. Visão essa que atende a interesses alheios ao próprio campo religioso e que visa manter esses atores sociais à margem dos centros de decisão. O que o grande público sabe do pentecostalismo não condiz com a realidade dessas comunidades de fé. Por outro lado, depois de cem anos de presença em território brasileiro, o pentecostalismo se apresenta como novidade nas formas em que se organiza, na maneira como dialoga com a cultura, nas respostas que dá aos problemas colocados pelas grandes cidades. Depois de um século o pentecostalismo ainda está se inventando e se reinventando. Por essa razão, as pesquisas acadêmicas estão sempre um passo atrás dessa realidade fugidia. Muito se produziu, se escreveu, se falou e se debateu sobre o pentecostalismo nos últimos 40 anos. Teorias foram levantadas, paradigmas foram estabelecidos, hipóteses foram aventadas, mas nenhuma das possibilidades de apreensão desse objeto sobreviveu à velocidade com a qual ele foi capaz de se recriar. Há novidades no fenômeno pentecostal de hoje: uma delas é o tipo de igreja pentecostal mais comum e frequente nas periferias. São igrejas pequenas sem vínculos com outras igrejas maiores e que congregam entre 30 e 40 pessoas em um espaço improvisado quase nunca maior que 40m 2. A comunidade não é rica o suficiente para manter um pastor com dedicação exclusiva. Eles são taxistas, pequenos comerciantes, trabalhadores autônomos, empregados. 1 Esse texto foi publicado em 2016 como a Introdução do livro " Pentecostalismos no Brasil contemporâneo: novas perspectivas " , da editora Reflexão.