A cultura das classes pobres (original) (raw)

(Texto bruto conferencia Curitiba, noviembre 2018) Com certeza deve resultar bem conhecida por todos vocês a crítica impiedosa que Pasolini consagra, nas Cartas Luteranas, aos " jovens infelizes ". A infelicidade que ele enxerga nos rostos dos jovens italianos dos anos 70, explica Pasolini, é uma infelicidade culpável, como acontece na tragedia antiga, que decorre da culpa que eles carregam. Esses jovens são a primeira geração produto de grande mutação antropológica produzida pelo capitalismo, que têm unificado os interesses das classes proletárias e proprietárias ao redor da civilização do consumo homogenizador, que carrega por sua vez a possibilidade de um novo fascismo. Mas se a culpa dos filhos é trágica, é porque independe de qualquer caráter ou atitude bem-intencionada que eles possam adotar; trata-se de uma culpabilidade que é idêntica ao destino histórico. Independentemente de sua vontade, os jovens herdam uma culpa originada pela ação dos pais. Daí que, apontando aos filhos, o ataque de Pasolini se enderece mais fundamentalmente aos pais, ou seja, aos italianos de sua mesma geração: aos que afundaram a Itália no fascismo, mas também aos " partigiani " que resistiram e colaboraram com as tropas aliadas na Libertação. E esse ataque visa mais profundamente a cultura comum produzida pelos pais, já fossem fascistas ou antifascistas, ou mesmo comunistas, e herdada inconscientemente pelos filhos. Essa herança é a sombra que o passado fascista projeta ainda no presente, que entristece os rostos dos jovens e elimina qualquer rasto de vitalidade deles; é a cumplicidade que todos os italianos da geração anterior, de uma maneira ou de uma outra, mantiveram com o fascismo. A culpa que os jovens carregam, explica Pasolini, é a seguinte: " a ideia de que o pior mal do mundo é a pobreza, e que, portanto, a cultura das classes pobres deve ser substituída pela cultura de la classe dominante. " E ele conclui: " Noutras palavras, nossa culpa de pais consistiria nisto: em acreditar que a história não é e não pode ser senão a história burguesa. "