SEXUALIDADES EXTRA-VAGANTES: JOÃO DO RIO, EMULADOR DE OSCAR WILDE (original) (raw)
2018, Revista Brasileira de Literatura Comparada
RESUMO: O artigo discute, primeiramente, como na virada do século XIX para o XX, o termo "extravagância" permitiu a representação de sexualidades e comportamentos dissidentes. A seguir, analisa o modo pelo qual um grupo de artistas conhecidos como extravagantes, entre eles o escritor mulato e supostamente homossexual João do Rio (pseud.) encontrou na figura de Oscar Wilde uma linguagem que legitimasse o gesto de pertencimento cosmopolita em um momento de crescente demanda por autenticidade, originalidade e identidade. PALAVRAS-CHAVE: imitação, homossexualidade, dândis, decadentismo. ABSTRACT: This article discusses, firstly, how the term "extravagance" at the turn of the 19 th to the 20 th century allowed for the representation of dissident sexualities and behaviors. It then analyzes how a group of reputed extravagant artists, among which the mixed-race and allegedly homosexual writer and journalist João do Rio (pseud.), found in the works and figure of Oscar Wilde a language to legitimize the gesture of cosmopolitan belonging at a moment of increasing demand for authenticity, originality and identity. Extravagância Ao final do ano de 1902, a revista semanal O Rio Nu, dirigida ao público masculino, inicia a publicação de um folhetim intitulado "A casadinha", assinado pelo (provável) pseudônimo Symphrônio Perillo 2. O Capítulo XV-intitulado 'Extravagância'-inicia com o personagem Félix e seu amigo Iglesias, quando estes deixam o sofisticado Teatro Recreio, no Rio de Janeiro, após assistirem a uma peça em que estrelava uma atriz "de abundantes formas" (Perillo, 11 fev. 1903). Claramente excitado, Félix expressa sua "disposição" para fazer "uma extravagância", o que seu companheiro parece não compreender, e que por isso o surpreende: "Ainda não percebeste? ... És muito ingênuo! Mostro-te aquele colosso, falo-te numa extravagância, e não percebes o que quero dizer!". Finalmente, ambos os rapazes caminham em direção à Maison Moderne, o famoso teatro e complexo de entretenimento localizado na Rua da Carioca. Enquanto flertam com uma "mulatinha dengosa", veem se aproximar um "rapazola imberbe, vestido todo de branco, de chapéu de palha e lenço encarnado ao pescoço" e que, "maneiroso e adamado", pede-lhes fogo, dando início a uma conversa. Sem qualquer hesitação ou constrangimento, Félix avisa ao amigo que, em vez de persistir na busca por uma prostituta, ele acompanharia o jovem até seu apartamento.