Cadernos de Tradução (original) (raw)

Cadernos de Tradução 41.3 TROCA DE OLHARES

Cadernos de Tradução 41.3 TROCA DE OLHARES, 2021

A LITERATURA DE EXPRESSÃO ALEMÃ NO BRASIL E A LITERATURA BRASILEIRA EM ALEMÃO EM TRADUÇÃO Este número temático Troca de olhares se constitui tanto de estudos sobre versões já disponíveis, como de indagações concernentes a traduções em processo, e a edição pretende servir de guia a iminentes projetos de tradução situados entre as duas línguas. Uma coleção, portanto, mas em desalinho natural e avessa à pretensão de completude, de definitude! Reunindo a exigência acadêmica de exercício metodológico e sistemático ao desejo de fomentar diálogos entre os pares dedicados à pesquisa e à tradução literária no interstício proposto, a organização acontece no ínterim de confinamento físico e gradual aproximação social virtual, tendência nas atuais circunstâncias. As relações históricas e culturais entre os povos do idioma português-brasileiro e os do alemão têm uma contemporaneidade larga. Seria possível estendê- la até Hans Staden, figura arquetípica dessa reciprocidade, uma vez que a imagem autêntica e histórica das cerimônias dos índios antropófagos, legada com o texto escrito e as ilustrações originais do seu relato sobre o Brasil de 15571, se reverte simbolicamente durante o modernismo brasileiro ao princípio da antropofagia cultural. As passagens de povos germânicos pelas terras brasileiras tiveram acentos diversos; em certos casos, mais que incidentais ou episódicas, instauraram mudanças definitivas da natureza física e humana. O Barão de Eschwege empreendeu pesquisas geognósticas 1 BREMER, Georg. Die unerhörten Abenteuer der deutschen Konquistadoren Hans Staden und Ulrich Schmidel. Zürich: Schweizer Verl.-Haus, 1996. Esta obra utiliza uma licença Creative Commons CC BY: https://creativecommons.org/lice Werner L. Heidermann & Maria Aparecida Barbosa e topográficas, e das riquezas minerais brasileiras - diamante, ouro e outros2, o zoólogo Johann Baptiste von Spix e o botânico Martius Staden, autores de referências científicas canônicas, são exemplos do interesse europeu inicialmente voltado às formas naturais (solo, clima, fauna e flora) para posteriormente se conscientizar da literatura brasileira3. Sabe-se que Os sermões do Padre António Vieira (1608-1697) foram traduzidos em 1862 por Franz Joseph Schermer e há várias versões desde o decurso do século XIX, tanto do poema “A canção do exílio”, de Gonçalves Dias, como também dos romances indianistas de José de Alencar para a língua alemã. A partir de 1820, com a independência política e as correntes migratórias da Europa rumo ao Brasil, a tradução assume papel fundamental no convívio de povos de culturas diversas. No período entre 1933 e 1945, o Brasil acolheu um contingente expressivo de refugiados em decorrência das perseguições do nazismo, entre eles intelectuais ligados à literatura, às artes e à ciência.4 O fluxo de judeus, alemães, austríacos e de tantas outras origens, que tinham em comum a língua alemã e à terra brasilis imigraram, resultou em transformações culturais e contribuiu para expandir os horizontes literários brasileiros e aprimorar as metodologias de estudo, comparação, criação. Os entreolhares se invertem, quando agora os jovens poetas migrantes difundem a poesia brasileira em Luxemburgo, na Alemanha, na Suíça.