O PODER DO DISCURSO NA INTERPRETAÇÃO (original) (raw)
Resumo O objetivo deste artigo é analisar a atuação do intérprete do ponto de vista do poder que ele detém como agente de comunicação que faz uso do discurso, sempre informado por suas referências políticas, ideológicas e pessoais. Dois casos são apresentados para ilustrar como a interpretação pode ser vista como exercício de poder, assim como para questionar os limites e as consequências de atuação dos intérpretes. Abstract This paper aims to analyze the task of the interpreter from the standpoint of the power he has as a communication agent who uses the discourse. Such use is always informed by the interpreter's political, ideological and personal background. Two cases are presented as instances where interpreting can be seen as an exercise of power, and also to question the limits and consequences of interpreting. 1) Introdução Este artigo 1 procura responder a uma demanda dos Estudos da Interpretação, ou seja, a de abordar um tema que permanece sub-representado quando comparado ao conjunto de produções científicas e acadêmicas da área: o poder. Tal sub-representação é sustentada pela opinião de autores como Michael Cronin (2002), que enfatiza a necessidade de se aumentar a representação de pesquisas sobre interpretação que abordem temas ligados a poder ou ideologia, seguindo o rumo já tomado pelos Estudos da Tradução. Uma das preocupações de Cronin é justamente a ideia de que a questão do controle seria o "problema central da tradução em geral e da interpretação em particular" (p. 392) e que, portanto, precisa ser investigada. Além disso, encontra-se nos Estudos da Interpretação uma recorrência da imagem do intérprete como intermediário que ocupa um "entre-lugar", espaço desconectado do contexto no qual estão inseridos os usuários da interpretação. A esse respeito, autores como Franz Pöchhacker (2004) criticam a imagem generalizada de um intérprete "não-pessoa", máquina invisível de tradução ocupando uma posição neutra entre interlocutores. Tal crítica ao posicionamento do intérprete levou Mona Baker (2010) a rever a abordagem mais recorrente nos Estudos da Interpretação e observar o intérprete como inserido em uma narrativa, a qual, por sua vez, seria parte de outras tantas narrativas, não oferecendo a possibilidade de uma exterioridade, de um "entre-lugar". As opiniões mencionadas acima representam um movimento de "virada cultural" aplicado à interpretação (Cronin, 2002), herdada dos Estudos da Tradução, que vê a atividade dos intérpretes como inserida em contextos sociais, políticos e culturais que informam a atuação dos mesmos. No âmbito deste trabalho, o poder é concebido como capacidade de agir, como agentividade, ou seja, "a capacidade socialmente determinada de agir e fazer a 1 Artigo produzido a partir de dissertação de mestrado do autor. Ver: SILVA, C. e MARTINS, M., 2013.