TENSÕES DE UMA SOCIEDADE EM CRISE (original) (raw)
2020, TENSÕES DE UMA SOCIEDADE EM CRISE
Esta obra consolida um olhar transdisciplinar, com reflexões jurídicas, políticas, filosóficas, sociológicas e econômicas, sobre as tensões de uma sociedade em crise, a partir de uma rede acadêmica firmada entre Grupos de Pesquisa e Instituições de Ensino Superior de referência no Brasil, Espanha e Portugal, como decorrência de diálogos e reflexões construídas no desenvolvimento de Projeto de Pesquisa financiado pelo CNPq (Edital MCTIC/CNPq Nº 28/2018). Momentos sombrios como o que estamos vivendo são ocasiões urgentes para pensar os abismos do nosso tempo. Também são momentos de inflexão e insurgência. E há uma clara relação entre o pensar e o agir. Ao pensar e interpretar o mundo, essa tarefa ajuda-nos a transformá-lo, pois “a ação transformadora não pode passar ao largo de uma teoria”, não bastando, “dizia Marx, que o pensamento busque a realização, é preciso que a realidade busque o pensamento”. Nesse sentido, períodos de crises extremas são momentos de inflexão impostergável, de reavaliação dos problemas mais profundos de nossas sociedades e de mudanças no status quo, o que nos leva a refletir sobre a importância do valor democrático, de políticas sociais, fiscais e econômicas necessárias para romper com o sistema que reiteradamente legaliza privilégios e legitima desigualdades, com ampliação da iniquidade e fratura social. Considerado o caráter extraordinário do tempo presente, nossas intransferíveis responsabilidades acadêmicas de pensar sobre nossas misérias e desajustes, bem como a importância do debate público de ideias para a construção coletiva de chaves interpretativas sobre a realidade, a obra apresenta riquíssimas discussões em torno de temas centrais da nossa agenda democrática e republicana em tempos de crise pandêmica, com contribuições profícuas e análises críticas sobre a crise sanitária, democrática, ambiental, fiscal, trabalhista e consumerista (capítulo 1); bem como sobre as vulnerabilidades, desigualdades de gênero e economia do cuidado que foram agravadas diante da crise pandêmica (capítulo 2); e por fim, a coletânea apresenta reflexões filosóficas sobre a emergência de um estado de exceção e seus desdobramentos democráticos a partir do intenso debate em torno das ideias e recentes publicações do filósofo italiano Giorgio Agamben (capítulo 3). A obra mobilizou intensamente os grupos de pesquisa (CNPq) “Filosofia Prática: investigações em Política, Ética e Direito”, vinculado à Faculdade de Filosofia e ao Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Pará; e “Consumo e cidadania”, vinculado à Faculdade de Direito e ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Pará. Vários de seus pesquisadores produziram ensaios sobre o momento pandêmico, alguns deles publicados, ao longo dos meses de 2020, no site da Rede Brasileira de Mulheres Filósofas, no Boletim da Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia (ANPOF) e no espaço de ensaios da Revista Direito, Estado e Sociedade (PUC – Rio). A obra é resultado de um trabalho coletivo e de fôlego, produzido a partir de distintas áreas do conhecimento, perspectivas teóricas, analíticas e metodológicas. Apesar do pluralismo de abordagens e de ideias, alguns pontos em comum precisam ser destacados. Os textos produzidos acenam à urgência do amparo humanitário, da solidariedade internacional, à necessidade de assistência universal à saúde, com o fortalecimento da arquitetura de saúde pública, à implementação de uma agenda igualitária, à defesa das universidades públicas, dos investimentos em pesquisa e confiança na ciência, e à construção de uma rede de proteção social que conduza à realização de promessas não cumpridas e estabeleça condições de resgate dos valores democráticos, da emancipação e liberdade, permitindo às pessoas exercerem suas potencialidades legítimas. Um ponto importante de reflexão apresentado na obra é que a pandemia tem demonstrado que a globalização, com seus desdobramentos na intensificação do intercâmbio cultural, na integração dos mercados em escala planetária, com seu intenso fluxo de mercadorias, informação e capital humano, parece biologicamente insustentável na ausência de uma infraestrutura social de saúde pública, o que passa pela implementação de políticas sociais e pela construção de um projeto político, econômico e social que ressignifique o individualismo como valor central da contemporaneidade, o que deve dar espaço ao imperioso e central debate sobre políticas de proteção social que, dentre outras defesas, promova a saúde como um bem público, considerando a importância do corpo social para a realização da saúde, dentre outros direitos sociais, como um projeto coletivo. A construção desse projeto coletivo de humanidade caminha ao lado da realização dos valores democráticos e, consequentemente, do protagonismo de uma classe trabalhadora politicamente articulada para a viabilidade de um modelo econômico capaz de distribuir de forma mais justa a renda, a riqueza e o poder e pela promoção de mais bem-estar material à maioria pobre da população com a redução das profundas disparidades de renda e riqueza, com a expansão de programas sociais conduzidos por um sistema tributário progressivo e com realocação dos gastos públicos. Compreendemos que é por intermédio da democracia que a liberdade ganha asas para evitar que as sociedades se atirem no abismo da ignorância e na ruína da miséria humana, da barbárie, do autoritarismo, do fatalismo e do obscurantismo. Finalizamos afirmando que há sempre a esperança na possibilidade de um novo começo à humanidade. Afinal, (re) começar é a suprema capacidade do homem.