Tony Judt - historiador e intelectual público [introdução] (original) (raw)
"SOBRE A VIDA E A HISTÓRIA DE TUCÍDIDES", de THOMAS HOBBES
Lemos sobre vários homens que têm o nome de Tucídides. Há um Tucídides farsálio, mencionado no livro oitavo desta história, que era próxeno dos atenienses em Farsalo e, por acaso estando em Atenas na época em que o governo dos Quatrocentos começou a cair, com sua intervenção e persuasão apartou as facções que então se armavam, para que não lutassem na cidade acarretando a ruína da república [commonwealth]. Há o Tucídides filho de Milésias, um ateniense do demo de Alopes, de quem Plutarco fala na vida de Péricles, o mesmo, com toda probabilidade, que é citado no livro primeiro desta história, aparecendo à frente de quarenta naus enviadas contra Samos, cerca de vinte e quatro anos antes do início desta guerra. Outro Tucídides, filho de Aríston, também ateniense, do demo de Aquerdos, era um poeta, embora de seus versos não tenha restado nada. Mas Tucídides, o autor desta história, um ateniense do demo de Alimos, era o filho de Oloro (ou Orolo) e Hegesípele. O nome de seu pai normalmente é grafado como Oloro, mas a inscrição em sua tumba trazia Orolo. Como quer que se o escreva, é o mesmo nome que foi usado por vários reis da Trácia, e lhe foi dado em respeito a seus antepassados. Desse modo, mesmo que nosso autor (como diz Cícero a seu respeito, lib. ii, De Oratore) nunca tivesse escrito uma história, ainda assim seu nome não se extinguiria, em vista de sua honra e nobreza. E não apenas Plutarco, na vida de Címon, mas também quase todos os outros que tocaram nesse ponto afirmam claramente que ele descendia dos reis trácios, aduzindo em prova que pertencia à casa de Milcíades, aquele famoso general dos atenienses contra os persas em Maratona, o que também provam pelo fato de que seu túmulo permaneceu por muito tempo entre os monumentos daquela família. Pois, perto dos portões de Atenas, chamados Melitides, havia um local chamado Coela, e lá se encontravam os monumentos chamados Cimoniana, pertencentes à família de Milcíades, onde só podiam ser sepultados os que pertencessem a ela. E entre eles estava o monumento de Tucídides, com a inscrição THUCYDIDES OROLI HALIMUSIUS. Ora, todos concordam que Milcíades descendia de Oloro, rei da Trácia, cuja filha se casou e teve filhos com outro Milcíades, avô deste outro. E Milcíades, que conquistou a memorável vitória em Maratona, foi herdeiro de grandes possessões e cidades no Quersoneso da Trácia, sobre as quais também reinou. Na Trácia também ficavam as possessões de Tucídides e suas valiosas minas de ouro, como ele mesmo declara em seu quarto livro. E, embora tais riquezas lhe possam ter vindo de uma esposa (como também afirmam alguns) com quem se casou em Scapte Hyle, uma cidade da Trácia, ainda assim tal casamento mostra que ele mantinha relações com aquele país e sua nobreza não era desconhecida por lá. Mas seu grau de parentesco com Milcíades nunca veio à luz em lugar algum. Houve também quem conjeturasse que Tucídides pertencia à casa dos Pisistrátidas, conjetura esta cuja única base é que ele faz uma honrosa menção ao governo de Pisístrato e de seus filhos e diminui a glória de Harmódio e Aristogíton, provando que a libertação do Estado de Atenas da tirania dos Pisistrátidas foi falsamente atribuída à ação daqueles dois (que derivava de uma vingança pessoal num problema amoroso), que não pôs termo à tirania, a qual, pelo contrário, tornou-se ainda mais pesada para o Estado, até ser finalmente deposta pelos lacedemônios. Mas essa opinião, por não ser tão bem fundamentada, não é tão bem acolhida quanto a primeira.