Terapias mágico-rituais e práticas populares de cura: um estudo de tratados médicos europeus dos séculos (XV à XVIII) (original) (raw)

Medicina ou magia? O contexto cultural e religioso das práticas curativas de Hildegard von Bingen

Caminhando, 2020

O presente artigo é uma investigação do tema da magia e religião popular nas obras de Hildegard von Bingen, teóloga, mística visionária e monja beneditina do século 12. O objetivo é demonstrar como a magia articula a interação entre Hildegard e a religião popular de sua época, borrando as fronteiras ortodoxas de sua reflexão teológica, que ora condena a prática da magia, ora se imiscui em rituais que em nada diferem daqueles praticados por magos, bruxas ou feiticeiros.

Sobre feitiços e ritos: enfermidade e cura nas reduções jesuítico-guaranis, século XVII

Topoi (Rio de Janeiro), 2005

…] con anterioridad a la labor misionera entre los Guaraníes, y antes de la venida de los españoles, estos indios eran sanísimos, y como se expresaba un misionero al referirse a ellos, sólo conocían una enfermedad: la vejez" 1 Esta observação de Furlong nos remete a algumas indagações: Como os indígenas mantinham-se sãos? Como curavam suas enfermidades? De acordo com este mesmo autor, os índios guarani tinham seus médicos e seus medicamentos, extraídos de sementes, raízes e folhas de árvores, praticando escarificações, cauterizações, aplicação de ungüentos e ventosas e tratamentos para verminoses. 2 A manutenção dessas práticas terapêuticas entre os Guarani, em especial, do uso de ervas, raízes, resinas e gorduras animais, fica evidenciada na lista de enfermidades e seu respectivo tratamento organizada por Cadogan e que contempla desde a dor de ouvido, até a epilepsia e os métodos contraceptivos. 3 Ele registra, ainda, o uso do "humo de tabaco" que "ahuyenta tanto los seres malignos como los pesares y las enfermedades, empleándose en la medicina y los ritos". 4 Faz, ainda, referência às plantas milagrosas que "podrán ser halladas y utilizadas por quienes se dedican con fervor a los ejercicios espirituales y adquieren la buena ciencia; es decir, los médicos agoreros" 5 .

DÉJÀ VU: Magia e pensamento mágico num ritual de cura neopentecostal

Este breve ensaio tem por escopo trazer novamente à baila, a já bem trabalhada questão da relação entre religião e magia, circunscrita aqui, ao neopentecostalismo da Igreja Mundial do Poder de Deus. A partir do lócus antropológico procuramos sustentar, em primeiro lugar, a existência da magia no culto neopentecostal, cujo foco é o papel do pastor-mago no ritual de cura, no qual tais práticas são mais enfaticamente evidenciadas; e, em segundo lugar, tentamos demonstrar através das evidências etnográficas coletadas em campo, o pensamento mágico que perpassa o imaginário simbólico dos fiéis-clientes da IMPD, sobretudo com o uso de fetiches, corroborando e legitimando tais práticas mágicas nesta vertente do gradiente pentecostal. Neste fito, cotejamos, por exemplo, algumas teorias de antropólogos que se dedicaram ao estudo da magia como Claude Lévi-Strauss e Marcel Mauss, do mesmo modo com autores nacionais como Paula Montero e Silas Guerriero.

Aproximações à medicina monástica em Portugal na Idade Média

História (São Paulo)

Este texto investiga os indícios da existência de uma medicina monástica no reino de Portugal na Idade Média, antes e depois da fundação da Universidade em 1290, realizada por D. Dinis. O corpus de fontes analisado inclui regras beneditinas e agostinianas, costumeiros ou liber ordinis, catálogo das livrarias de mão do mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, legislação conciliar. Assinala dois momentos basilares nessa história, sendo o primeiro a criação da regra beneditina no IV século, que resultou na criação de dois espaços próprios para o exercício da medicina monástica associados à prática da virtude da caridade: a enfermaria e o hospital. O segundo momento, no século XIII, constitui-se na institucionalização da escolástica médica e, ao mesmo tempo, nas tentativas de coibir a prática médica pelos religiosos nos sínodos regionais e no IV Concílio de Latrão (1215).

Os tratamentos termais e os banhos de mar promovidos pela Misericórdia de Braga aos doentes (século XIX)

O nosso trabalho pretende analisar o auxílio facultado pela Santa Casa da Misericórdia de Braga aos doentes que necessitavam de tratamentos termais e banhos de mar, no decurso do século XIX, e que careciam de meios para o fazer. Atentaremos nas medidas levadas a cabo pela confraria na regulamentação e regularização da sua atribuição, assim como na tentativa de obviar aos abusos dos requerentes. Atenderemos ainda à importância que estas formas de tratamento foram adquirindo ao longo da centúria de Oitocentos na revitalização do corpo e da mente. Palavras-chave: Misericórdia de Braga, tratamentos termais, banhos de mar, doentes. ABSTRACT: This paper analyses the aid provided by Santa Casa da Misericórdia de Braga to patients who needed thermal and sea bathing treatments, during the nineteenth century, and lacked the means to do so. We will look into the measures taken by this brotherhood in regulation and regularization of their assignment, as well as attempting to prevent the abuses of applicants. We will also stress the importance of these forms of treatment which had been acquiring throughout the nineteenth century in body and mind´s revitalization.

Artes de Curar: Embates históricos entre as terapias naturais e os tratamentos alopáticos

O presente capítulo analisa um momento anterior ao estabelecimento de uma confiança irrestrita no poder da ciência em mudar o mundo e aprimorar a saúde humana. Momento no qual diversas terapias que empregavam os recursos mais simples da natureza, como a água, a luz solar e o ar de altitude, foram criadas para a cura de enfermidades e conquistaram grande repercussão social. Momento anterior ao predomínio dos medicamentos alopáticos no tratamento das doenças. Uma época que se inicia ainda na aurora do século XIX, quando as causas dos diversas males que poderiam tomar o corpo humano ainda não eram totalmente conhecidos, mas que, no entanto, não impediu a inauguração dos primeiros estabelecimentos terapêuticos especializados na cura por meio dos elementos da natureza. Banhos de imersão em águas de diferentes temperaturas, em banheiras, riachos ou no mar, banhos parciais, nos quais porções do corpo eram gradativamente expostas à ação do meio líquido, fricções de panos úmidos, compressas, banhos de sol que tornavam indispensável a permanência dos pacientes em ambiente exterior, alimentação vegetariana e de preparo rudimentar, com larga utilização de chás e infusões, e a realização de exercícios físicos ao ar livre, entre tantas outras práticas corporais que compuseram as principais técnicas de cura da denominada medicina natural. Para a sistematização dos tratamentos indicados nestes estabelecimentos, conhecimentos populares que circulavam na região de língua alemã da Europa Central, notadamente a Austro-Hungria e os estados germânicos, foram de grande importância para os terapeutas da medicina natural, sendo sua fácil aplicação um dos motivos da rápida assimilação de suas prescrições entre as famílias camponesas ou com poucos recursos financeiros (BAUBÉROT, 2004). No que diz respeito a parcela mais rica da população, os estabelecimentos privados criados pelos terapeutas em vilarejos distantes dos maiores centros urbanos, situados em sua maioria nas montanhas ou no campo, obtiveram grande repercussão e, em pouco tempo, consolidaram famosas estâncias balneárias procuradas por curistas e vilegiadores de diversos países (BOYER, 2008, RAUCH, 2001). Estas mesmas práticas corporais preconizadas pela medicina natural serviriam também de inspiração para os tratamentos propostos pelos sanatórios, instituição especializada na cura da doença que mais afligia a população durante os séculos XIX e XX – a tuberculose (BUCHWALD, 2004; GUILLAUME, 1989). O período abordado por este capítulo encerra-se na década de 1950, momento no qual estas terapias seriam deslocadas da medicina oficial para ramos da medicina alternativa, uma vez que não obtiveram completo respaldo científico, sendo sobrepostas definitivamente pelos tratamentos que se utilizam de quimioterápicos. Criados ao longo de todo o século XIX, os medicamentos alopáticos seriam defendidos por muitos como o recurso mais confiável no tratamento das doenças, no entanto, conviveriam, ainda por bastante tempo, com as terapias naturais até alcançarem a supremacia na medicina oficial. Tal convivência não se faria sempre harmoniosa, conformando disputas que arregimentariam diversos profissionais e colocariam em questão os rumos a serem tomados pelas politicas de saúde pública de muitos países. Por meio de uma revisão bibliográfica, procurou-se estabelecer quais eram os maiores embates e discussões a respeito do emprego de quimioterápicos na cura de enfermidades durante o século XIX e primeira metade do século XX. Sem a intenção de avaliar a real eficácia dos tratamentos propostos ao longo deste período, procurou-se compreender as linhas de tensão e de poder que possibilitaram o estabelecimento de duas formas distintas de cuidados com a saúde, uma baseada em experimentos laboratoriais e medicamentos alopáticos e outra sustentada pela experiência individual e por saberes populares.