Do ser discreto ou néscio com Gregório de Matos (original) (raw)

2020, Hidra Vocal - estudos sobre retórica e poética

Gregório de Matos operou gêneros poéticos sob os rigores do século XVII, distante, portanto, dos atuais critérios de valoração que só começam a ser idealizados a partir do final do XVIII. A tradição crítico-historiográfica brasileira, no entanto, desde o século XIX, tende a ler a poesia colonial segundo os propósitos das análises e não os dos objetos em si. Praticando uma projeção hermenêutica, arremessa nas letras clássicas categorias alienígenas como nacionalismo e individualismo. A tese de João Adolfo Hansen – A Sátira e o engenho: Gregório de Matos e a Bahia do século XVII – defendida em 1988, rompe tal linha interpretativa ao propor a restituição hermenêutica, isto é, a reconstrução da poética seiscentista dentro de categorias históricas e retóricas da própria época. Embora o estudo tenha influenciado de pronto a pesquisa de ponta, trinta anos depois as praticas docentes em níveis superior e médio ainda novelam, por exemplo, um Gregório de Matos de psicologia brasílica avant la lettre. Proponho aqui analisar um único soneto do poeta a partir de preceitos recolocados por João Adolfo Hansen, tais como imitação, engenho, decoro, discrição e discurso retórico. Um exercício para mostrar como seu trabalho inovador pode impactar, em sala de aula, os modos de ler a poesia do período.