A segurança criminal como espetáculo para ocultar a insegurança social: entrevista com Loïc Wacquant (original) (raw)
2008, Fractal : Revista de Psicologia
Entrevistadoras: Gostaríamos que nos contasse um pouco de sua trajetória e as principais questões que atravessaram esse percurso. Loïc Wacquant: Eu nasci e cresci no sul da França. Fiz meus estudos na França, inicialmente em Economia Industrial e depois em Sociologia. Fui para os EUA em 1985 para fazer meu doutorado na Universidade de Chicago. Trabalhei inicialmente sobre as desigualdades urbanas e a marginalidade social na cidade. Foi meu trabalho sobre a marginalidade urbana que me levou a encontrar a prisão, porque para fazer um estudo sobre a transformação do gueto negro de Chicago, me inscrevi em um clube de boxe do gueto como forma de fazer uma observação participante. Fiz esse trabalho de campo para me aproximar da realidade cotidiana, em particular, da juventude negra e pobre do gueto de Chicago. Para fazer essa observação, me inscrevi nesse clube e descobri que todos os meus colegas de boxe haviam passado pela prisão. Lembro-me que certa vez perguntei ao responsável pela academia quem do grupo havia passado pela prisão. Ele me respondeu: "todos, você não?" Então, foi para compreender a vida cotidiana de meus amigos que faziam boxe que eu passei a estudar as prisões. Para entender os ideais urbanos dos meus colegas, eu deveria estudar a prisão norte-americana e, assim descobri, em 1993/1994, o estado penal. Descobri as estatísticas que mostravam um crescimento extraordinário da população carcerária e, sobretudo da população carcerária negra. Como eu vinha estudando a transformação do gueto, reparei que havia um paralelo entre a evolução do gueto negro, sobretudo após os anos 1960, e a prisão. Percebi como o gueto pouco a pouco foi tomando as características de uma prisão, se tornando um território fechado, com uma população considerada desviante, perigosa, dependente.