Dois Conceitos De Liberdade: 60 Anos Após a Sua Publicação (original) (raw)
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DOIS CONCEITOS DE LIBERDADE, Isaiah Berlin
Se os homens nunca discordassem sobre os propósitos da vida, se nossos ancestrais tivessem permanecido sem distúrbios no Jardim do Éden, os estudos aos quais o Chichele Chair of Social and Political Theory se dedica dificilmente poderiam ter sido concebidos. Já que esses estudos brotam e prosperam da discórdia. Alguém pode questionar que mesmo em uma sociedade de anarquistas cheia de virtude, onde nenhum conflito sobre propósitos finais tem lugar, problemas políticos, por exemplo, problemas constitucionais ou legislativos, podem ainda surgir. Mas esta objeção se apóia em um erro. Onde as finalidades são assentadas, as únicas questões restantes são aquelas sobre os meios, e essas não são políticas, mas técnicas, isto é, capazes de serem resolvidas por especialistas ou máquinas, como as discussões entre engenheiros e médicos. É por isso que aqueles que colocam sua fé em algo maior, fenômenos que transformam o mundo, como o triunfo final ou razão da revolução proletária, devem acreditar que todos os problemas políticos e morais podem, desse modo, ser transformados em problemas tecnológicos. Esse é o significado da frase famosa de Engels (parafraseando Santo Simon) sobre 'substituir o governo das pessoas pela administração das coisas', e as profecias marxistas sobre o definhamento do Estado e o começo da verdadeira história da humanidade. Tal perspectiva é chamada utópica por aqueles que especulam que essa perfeita harmonia social é um jogo de fantasia ociosa. Não obstante, um visitante de Marte para qualquer Universidade Britânica – ou Americana – hoje pode ser perdoado se ele sustentar a impressão de que seus membros vivem em algo muito parecido com esse estado muito inocente e idílico, por toda a atenção séria que é dada aos problemas fundamentais da política pelos filósofos profissionais. Ainda assim isso é ao mesmo tempo surpreendente e perigoso. Surpreendente por que, talvez, nunca tenha havido um tempo na história em que numero tão grande de seres humanos, em ambos, Oriente e Ocidente, tivessem suas noções, e suas vidas, tão profundamente alterados, e em alguns casos violentamente perturbadas, por se segurarem fanaticamente à doutrinas sociais e políticas. Perigoso, por que, quando idéias são negligenciadas por aqueles que devem atendê-las – isto é, aqueles que foram treinados para pensar criticamente sobre idéias – elas algumas vezes adquirem uma dinâmica desenfreada e um poder irresistível sobre multidões de homens que podem se tornar violentos demais para serem afetados pela critica racional. Há mais de um século atrás, o poeta alemão Heine alertou os franceses para não subestimarem o poder das idéias: conceitos filosóficos nutridos na quietude do escritório de um professor podiam destruir uma civilização. Ele falou sobre A Critica da Razão Pura de Kant como a espada com que o deísmo alemão tinha sido decapitado, e descreveu as palavras de Rousseau como a arma manchada de sangue a qual, nas mãos de Robespierre, se destruiu o antigo regime; e profetizou que o destino romântico de Fitche e Schelling um dia se tornaria, com efeitos terríveis, pelos seguidores alemães fanáticos, contra a cultura liberal do Ocidente. Os fatos não desmentiram essas predições inteiramente; mas, se professores podem verdadeiramente empunhar esse poder fatal, não devem ser apenas os
O objetivo deste artigo consiste na análise do conceito de emancipação encontrado na obra de Rancière, tendo por referência aquilo que denominamos paradigma clássico da emancipação. De fato, apesar da referência contínua à natureza processual da emancipação no contexto da filosofia alemã, em Rancière ocorre um deslocamento: a emancipação é, antes, concebida à luz de um estranhamento radical entre o momento emancipatório e a ordem social em que este tem lugar. Ao mesmo tempo, a igualdade nunca pode ser concebida como um objetivo ou um projeto de longo prazo. Ao invés disso, ela é tomada como ponto de partida de toda política emancipatória. Assim, nós sustentamos que, no lugar de reafirmar mais um conceito introvertido de emancipação, Rancière concebe a emancipação como uma reorganização prática da sociedade e de sua distribuição de poder.
Berlin Dois Conceitos de Liberdade Isaiah Berlin
Dois conceitos de liberdade Se os homens nunca discordassem sobre os objetivos da vida, se nossos ances trais tivessem permanecido imperturbados noJardim do Éden. os estudos a que se dedica a Cadeira Chíchele de Teoria Política e Social não poderiam ter sido conce bidos.' Pois esses estudos nascem e prosperam na discórdia. Alguém pode questio nar essa afirmação alegando que a té numa sociedade de anarquistas religiosos, em que n~o há possibilidade de ocorrerem conflitos sobre os propósitos supremos, alguns problemas políticos, por exemplo, questões coqstitucionais ou legislativas, ainda poderiam acontecer, Quando há consenso sobr~ os fins, as únicas questões que restam se referem aos meios, e essas não são políticas, mas técnicas, isto é, pas síveis de serem resolvidas por especiàlistas ou máquinas, como discussões entre engenheiros ou médicos, É por isso que aqueles imbuídos de uma fé em algum imenso fenômeno transformador do mundo, como o triunfo final da razão ou a revolução proletária, devem acreditar que todos os problemas políticos e morais podem ser com isso transform,ldos em tecnológicos, Esse é o significado da famo sa frase de Engels (parafraseando Saint-Simon) sobre "substituir o governo de pes soas pela administraç;io de coisas".' e das profecÍas marxistas sobre o desapareci mento do Estado e o começo da verdadeira história da humanidade, Essa perspectiva é chamada de utópica por aqueles que consideram a especulação sobre uma condição de perfeita harmonia social a representação de uma vã fantasia, Ainda assim, um marciano que visitasse hoje qualquer universidade britânica-ou americana-talvez fosse perdoado se susteFltasse a impressão de que seus mem bros vivem em algum estado muito semelhante a essa condição inocente e idílica, apesar de toda a atenção séria que os filósofos profissiollaisdispensam aos proble mas fundamentais da política, No entanto, isso é tão surpreendente como perigoso, Su rpreendente porque talvez não haja nenhuma época ná história modernae,m que üm número tão grande de pessoas. tanto no Oriente como no Ocidente, tenha tido suas noções e. de fat,o. suas vidas tão profundainente alteradas, e em algun~ casos violentamente convulsionadas, por doutrinas sociais e políticas defendidas tom tanto fanatismo, Perigoso porque, quando as idéias são negligenciadas por aqueles que deviam exa rriiná-las-isto é, que foram treinados para pensar criticamente sobre as idéias-, elas às vezes adquirem um momentum desenfreado e um poder irresistível sobre multidões de homens que podem se tornar demasiado violentos para serem influenciados pela crítica racional. Há mais de cem anos, o poeta alemão Heine alertou os franceses para não subestimarem o poder das idéias: os conceitos filosó ficos nutridos na quietude do escritório de um professor poderiam destruir uma civilização_ Ele falava da Critica da razão pura de Kant como a espada com que o deísmo alemão fora decapitado e descrevia as obras de Rousseau como a arma manchada de sangue que, nas mãos de Robespierre. havia destruído o antigo regi me; e profetizou que um dia a fé romântica de Fichte e Schelling seria voltada. pelos fanáticos seguidores alemães deles, contra a cultura liber,d do Ocidelltc. gerando efeitos terríveis, Os fatos não desmentiram inteiramente essa predição; mas, se os professores podem realmente12randir esse poder fatal. não seriio so mente outros professores ou pelo menos outros pensadores (e não governos aLI comitês do Congresso) que poderão desarmá-los? Nossos filósofos parecem estranhamente inconscientes desses efeitos devas tadores de suas atividades, Talvez porque, embriagados por suas magníficas reali zações em reinos mais abstratos, os melhores dentre eles olhem com desdém para um campo em que há menos probabilidade de serem feitas descobertas radicais e de ser recompensado o talento para a análise minuciosa. No entanto, apesar de todo o esforço para separá-las, conduzido por um pedantismo escolástico cego, a política continua indissoluvelmente entrelaçada com todas as outras formas de investigação filosófica, Negligenciar o campo do pensamento político porque seu tema instável. de limites enevoados. llão pode ser apreenclído pelos conceitos fixos, 227
DOS CONCEITOS DE SUBSTÂNCIA E LIBERDADE NA ÉTICA DE SPINOZA
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O presente trabalho busca apresentar elementos que nos possibilite pensar determinadas questões estritamente relacionadas à ética de Spinosa. Intentamos nos debruçar sobre a viabilidade de uma passagem da substância à teoria da liberdade, na obra deste autor tão fecundo e de estima demasiado singular para o pensamento filosófico moderno. Este trabalho assume que centrar-se-à na análise de conceitos, como: “substância”, “Deus” e “liberdade”. Nossa proposta é articular um discorrer sobre o fecundo arcabouço teórico de Spinosa tendo em vista que seu delicado trato com os conceitos afirmados acima formam um quadro de questões reflexivas demasiado ardilosas. Nesse sentido, partiremos dos elementos que compõem sua concepção ética, tendo em vista que nosso trabalho assume que, ao partir de um plano ontológico até então não abordado, e com um profundo labor reflexivo, Spinoza fora capaz de conduzir diversos autores da tradição filosófica a também se debruçarem sobre os mesmos problemas teóricos e práticos exaustivamente debatidos por ele.
Resumo: "Desenvolvimento como Liberdade" e "Liberdade de Oportunidade"
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Este ensaio é dedicado ao Povo Americano, ao seu sentido do Sonho e, com ele, à realização quotidiana do valor da Liberdade Abstract (em Inglês) In this reflective essay, the author makes an urgent appeal to humanity in favor of the adoption of a concept of freedom that recognizes that it, freedom, can only be realized when assumed with a sense of moral, axiological, and ethical responsibility, as well as a sense of obligation and respect towards the “Other” and all beings who find themselves in situations of vulnerability. The author’s line of argumentation is grounded on the great philosophical, axiological, and social European thought traditions, and it is accompanied by a critique of some post-modernist currents of thought as well as the primacy given to the logic of capital accumulation in contemporary societies. The latter have brought us to a social state characterized by debauchery, selfishness (me first), arrogance, in sum, an “anything goes” way of life. This societal state, in turn, and in another extreme, has resulted in the emergence of orthodoxies, demagoguery, bigotry, and various forms of oppression. It has also led to the devaluation and trivialization of the arts and the humanities, precisely because they cannot be easily subjugated to the logic of accumulation of savage capitalism. KEY WORDS: freedom, sense, western philosophy, modernity, post-modernism, human condition, dialectical polarities... Fernando Paulo Baptista Associação Piaget Internacional (AsPI), Centro de Investigação em Língua Portuguesa (CILP); Cied — Universidade do Minho.