Memórias de um etnólogo: Roberto Damatta (original) (raw)
Revista de Antropologia da UFSCar
Memórias de um etnólogo Roberto Damatta Entrevistadores: Gostaríamos que você fizesse um relato de suas memórias sobre como foi sua participação no projeto Harvard Central Brazil Research Project (mais conhecido entre nós como HCBP), falando sobre sua escolha de pesquisar os Apinayé, das relações que se davam dentro do grupo de pesquisadores, e de como eram os debates entre seus membros. Roberto DaMatta: Essa é uma pergunta muito densa à qual eu tenho tentado trabalhar num outro plano: o da ficção. Mas não sei se vou ter tempo físico e energia mental para tanto. O nome do projeto, permita-me o reparo, era Harvard Central-Brazil Research Project. Eu entrei no Museu Nacional de Antropologia, no Rio de Janeiro, com pouco mais de 20 anos de idade (no final de 1959 e começo de 1960) e não sabia muito (ou nada) de índios e da vida. Vinha de um curso de História, tal como o Roque Laraia e o Julio Cezar Melatti, e ingressei no Museu Nacional por meio do Professor Castro Faria, que ensinava Antropologia Cultural na Faculdade Fluminense de Filosofia, onde eu me formei. Como ele também era pesquisador do Museu, eu fui por ele apresentado ao Roberto Cardoso de Oliveira, que se tornou meu mentor e professor, tal como ocorreu com o Roque, o Melatti e a Alcida Ramos, isso para ficar apenas com os que permaneceram na profissão. Foi nesse ano de 1959 que comecei a ouvir falar em índios e em suas organizações sociais, bem como dos seus dramáticos contatos com as frentes pioneiras de nossa sociedade. Eu não escolhi estudar os Apinayé, apenas segui as sugestões do meu professor, que queria mais dados sobre os Jê. Ele falou dos Gaviões do Pará, tidos como semi-isolados e eu para lá segui em 1961, tendo como meu assistente, imagine, o Melatti. Ficamos quatro meses com os Gaviões. O Roberto Cardoso de Oliveira estava interessado num ambicioso estudo comparativo de "estruturas sociais", no sentido do livro de George Peter Murdock, de Yale, denominado Social Structure (1949), numa concepção empírica bem diversa da de Lévi-Strauss. Foi a amizade e o interesse intelectual de David Maybury-Lewis com o