Fissuras na luta de libertação angolana (original) (raw)

Limite tênue entre a liberdade e a escravidão em Benguela

as últimas décadas foram publicados vários estudos sobre a organização do tráfico de escravos e seu impacto nas sociedades africanas. Desde o clássico estudo de Philip Curtin (The Atlantic Slave Trade: A Census, 1969) historiadores preocupam-se com o volume do tráfico transatlântico. Com a disponibilização da nova versão da Trans-Atlantic Slave Trade Database e a publicação do Atlas of the Transatlantic Slave Trade, 1 podemos estimar quantos escravos deixaram cada porto ao longo do litoral ocidental da África e seus portos de desembarque nas Américas. Os números, entretanto, não revelam como essas pessoas foram capturadas e reduzidas à escravidão; além disso, estudos quantitativos priorizam a experiência coletiva e não casos individuais. O resultado é que a historiografia tende a tratar os chamados "prisioneiros de guerra" como exemplos do modelo africano de N

Novos discursos de resistência na literatura angolana contemporânea

Revista Crioula, 2015

RESUMO: Este trabalho pretende refletir sobre o lugar do afrodescendente e do imigrante angolano dentro da sociedade brasileira e os discursos de reivindicação produzidos por eles, a partir do romance O ano em que Zumbi tomou o Rio, do escritor angolano José Eduardo Agualusa, diante da própria experiência em seu país, Angola, o que, consequentemente, pode contribuir de maneira positiva na discussão e reconfiguração dessas relações no próprio Brasil.

A luta anticolonial angolana em Luandino e Pepetela

Sankofa (São Paulo), 2012

Este artigo discute Luuanda e Nós, os do Makulusu de José Luandino Vieira e Mayombe de Pepetela, com base no contexto de luta anti-colonial em Angola a partir da 2ª. Guerra Mundial. Inicialmente, é traçado um breve histórico sobre o ultracolonialismo português e sobre a trajetória da resistência angolana. Depois, são apresentados alguns autores fundamentais para o debate da autodeterminação dos povos do chamado Terceiro Mundo, como Balandier, Memmi, N’krumah e Fanon. Por fim, são trabalhadas estas três obras, escritas por dois intelectuais do MPLA, profundamente engajados na luta por libertação nacional.

Guerras revolucionárias em África - O caso da luta de libertação nacional em Moçambique

O presente texto tem como intenção principal contribuir para o debate em torno do conceito de guerra revolucionária. O trabalho procurará desmistificar as diversas nomenclaturas atribuídas a guerra desenvolvida pelos movimentos de libertação, facto que cria uma enorme confusão nos sectores políticos e acadêmicos. Recordemonos que, em função dos interesses de quem as denominava, as lutas de libertação receberam o nome de terrorismo, guerra de resistência, guerra irregular, insurgência, rebelião, banditismo e guerra revolucionária. Cada uma destas denominações carrega consigo um tom de legitimidade e ilegitimidade. Para elucidar sobre a importância da clarificação do conceito, o artigo partirá do estudo do caso moçambicano. Seu objetivo principal é analisar as guerras revolucionárias em África. A hipótese subjacente é a de que as guerras de libertação nacional em África representam um exemplo adequado ao conceito de guerra revolucionária.

Fissuras Na Negociação Coletiva

Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM

O artigo aborda o processo de reconfigurações normativas da negociação coletiva no Brasil no cenário pós-reforma trabalhista de 2017. O sistema de negociação coletiva é examinado em dois momentos que se conectam: (1) os efeitos derivados das reformas institucionais de 2017 (Leis nº 13.429/2017 e nº 13.467/2017) e; (2) o impulso das normas extraordinárias sobre negociação coletiva de emergência da pandemia da covid-19, em 2020 e 2021. O artigo discute a hipótese de aprofundamento da mudança paradigmática decorrente da erosão do modelo normativo de negociação coletiva. Argumenta-se que: (1) houve a erosão do modelo de relações de trabalho da Constituição brasileira de 1988; (2) estar em emergência de um novo paradigma na negociação coletiva, ainda em transição, com a polarização entre a lei e contrato. O artigo finaliza com a constatação da ampliação da fissura no modelo de negociação coletiva baseado na norma estatal e na Constituição, com riscos para a democraticidade do Direito do ...

Descolonização de Angola e a luta pacifica de Simão Toco

Descolonização de Angola e a luta pacifica de Simão Toco, 2022

A verdade histórica de Simão Toco quanto ao esforço de sua luta pacifica, remonta de 1946 um ano depois do fim da segunda guerra mundial terminada em 1945. O jovem Simão que em 1943 acabava de fixar – se no Congo Zaire vindo de Angola, afim de encontrar melhores condições de vida, também conhecia das reformas que no mundo inteiro acabavam de virar a história dos povos. O mundo europeu por exemplo, tinha desenvolvido vários aspectos éticos com fito de respeitar a dignidade humana.

Dos manifestos à «acção directa»: a propaganda nos movimentos de libertação angolanos (1955/1961)

Dos manifestos à «acção directa»: a propaganda nos movimentos de libertação angolanos (1955/1961) Os acontecimentos marcantes dos primeiros meses de 1961 – a sublevação dos plantadores algodoeiros da Baixa de Cassange, os levantamentos de 4 de Fevereiro em Luanda e os massacres perpetrados pela UPA a partir de 15 de Março – que deram origem a uma guerra colonial a que a Revolução de Abril veio por um ponto final, apresentam-se como corolário das reivindicações do movimento independentista do pós-guerra que, no caso particular de Angola, se começa a esboçar nos inícios dos anos cinquenta do século XX. Se, na primeira metade da década, a reclamação autonómica parecia confundir-se com a (re)descoberta duma angolanidade perdida mas também com movimentações em torno do antigo reino do Kongo, a partir de 1955 a reivindicação da independência começa a tomar forma no interior e no exterior do território angolano. Em Luanda, o Partido Comunista de Angola, fundado em 1955 por Viriato da Cruz, Ilídio Machado, António Jacinto e Mário António, dava o pontapé de saída, exprimindo claramente nos seus estatutos o caminho para a independência e a construção de uma sociedade socialista. No Congo belga, exilados bakongos, a pretexto da restauração do antigo reino do Kongo, enviavam petições à Assembleia Geral das Nações Unidas, solicitando que a tutela daquele território fosse entregue a outra potência, dando início ao processo que levou à criação da UPA [União das Populações de Angola]. Na metrópole, estudantes angolanos empenhavam-se na luta da oposição ao regime, concretamente militando na estrutura do MUDJ. Entre 1955 e os 1960, a expressão de recusa ao sistema colonial português passava pela distribuição de panfletos e manifestos, publicação de artigos em jornais, envio de petições à ONU, participação em conferências internacionais com um duplo objectivo: a denúncia do colonialismo e do regime de Salazar, bem como a questão da independência de Angola, ganhado assim apoios diversos para a causa. O ano de 1960 introduziu uma mudança significativa no discurso dos movimentos emancipalistas angolanos, que até aí apelavam para uma resolução pacífica do problema, ou seja, o estabelecimento de negociações com o ditador português com vista à autodeterminação e independência. Em 1960, o ano de África, o ano em que um conjunto numeroso de países africanos proclamou a sua independência, o recurso à luta armada, como forma de obrigar o regime português a negociar, passava do desejo de nacionalistas dos musseques luandenses ou de exaltados militantes upistas emigrados no Congo para fazer parte da narrativa das cúpulas dirigentes quer da UPA quer do MPLA. Na conferência na Câmara dos Comuns, em Londres, a 6 de Dezembro de 1960, o MPLA, pela voz de Viriato da Cruz, deixava claro que a «acção directa», dito por outras palavras, as actividades da guerrilha, estaria para breve. Aparentemente mais contido, Holden Roberto ia apregoando nos fóruns internacionais que a resolução do problema de Angola passava por negociações com Portugal. Veladamente admitia o recurso à violência armada. Depois da independência do Congo, a 30 de Junho de 1960, a UPA pode contar com os microfones da Rádio Nacional do Congo e, através do programa “A voz de Angola livre”, recebida no norte angolano, inflamar as populações indígenas contra o poder colonial português, prometendo-lhes a libertação. Panfletos anticolonialistas e pró-independência circulavam clandestinamente quer em território bacongo, quer nos musseques e bairros populares de Luanda, pelo que os acontecimentos que ensombraram os primeiros três meses de 1961, dando origem à Guerra Colonial, apresentam-se como o desenlace óbvio da luta dos movimentos de libertação angolanos. Em suma: tendo o governo português fechado os ouvidos aos libelos acusatórios, às conferências de imprensa, aos manifestos, às notícias na imprensa, às proclamações produzidas em fóruns e conferências internacionais, às petições à ONU e aos vários pedidos de negociação com vista à autodeterminação e independência das colónias, chegava a hora da confrontação armada. De um lado e do outro da barricada perfilaram-se as armas. O tempo de espera estava prestes a terminar.

Angústia: os descaminhos da liberdade

valores, adoção de uma ideologia qualquer, o que o leva a assumir, de má-fé, o sentido anacrônico da liberdade, a prática da violência naturalizada. Seus sentimentos de opressão e inferioridade passará a ser atribuído ao exterior-e não a si mesmo, à dificuldade de auto-afirmação-, quando ele passará a verse como dominado, culpando o outro por suas frustrações, pelos seus fracassos, pela sua impotência diante do mundo de que faz parte, daí o assassinato, no seu plano aparente, surgir como ato de vingança, rebeldia: "A obsessão ia desaparecer. Tive um deslumbramento. O homenzinho da repartição e do jornal não era eu. (...) Pessoas que aparecessem ali seriam figurinhas insignificantes" (RAMOS, 2009, p. 238) O assassinato de Julião Tavares é determinado pela livre escolha de Luís da Silva, tomada no sentido de tentar afastar os angustiantes sentimentos de opressão e inferioridade, por meio de um ato de vingança, porém, não surtirá o efeito desejado. Há também uma motivação não consciente, relativa ao conflito edipiano, o medo da castração simbólica, quando o Outro, o duplo, não aparece na sua faceta ideológica, de dominante degradado (opressor, superior), mas sim na sua faceta psíquica, enquanto imagem do pai castrador, cuja narrativa digressiva, enquanto forma de auto-análise, irá trazer a tona. Luís da Silva, na sua condição de subalterno funcionário público, e de articulista de jornal, revela certa admiração pelos tempos passados, o tempo que ele alcançou ainda menino, da rústica sociedade nordestina, a sociedade patriarcal-já em fase de decadência-, como se nela estivesse a autêntica forma de liberdade, da qual ele se vê como que destituído, ao assumir a auto-imagem do dominado. É como se na transição da aristocracia rural nordestina, da qual o avô, o velho Trajano, fazia parte, para a nova classe, a burguesia, composta de comerciantes, industriais, políticos e profissionais liberais, ocorresse a perda do lugar que ele se atribui de direito (dada sua origem aristocrática), embora não de fato, o lugar do dominante, do livre, praticante da violência naturalizada. A crise existencial de Luís da Silva, sua crise de identidade, além do fator de ordem psicológica, a dificuldade de auto-afirmação, decorre do fator ideológico, seus valores arcaicos, que o tornam alguém, de certa forma, descontextualizado em relação ao mundo citadino de que faz parte. Como funcionário público, escritor, nem pertencente à burguesia, nem as classes mais baixas, os miseráveis, e cultuando as formas de vida do passado, a figura do avô e de criminosos, ele não se identificando com nenhum desses dois pólos opostos da sociedade: "Os 12 vagabundos não tinham confiança em mim. Sentavam-se, como eu, em caixões de querosene, encostavam-se ao balcão úmido e sujo, bebiam cachaça. Mas estavam longe. As minhas palavras não tinham para eles significação." (RAMOS, 2009, p. 140) Nesse sentido, Luís da Silva, aquele que seria predestinado, pela sua origem aristocrática, à posição de dominante, de superior, aquele que seria descendente do velho Trajano, chefe político local, nos seus tempos áureos, acaba por ocupar a posição do sem lugar social na nova sociedade, sentindo-se igualmente distante das classes altas (burguesia), como também das classes mais baixas (proletariados e mendigos). Se Luís da Silva não se identificava com os mais ricos por não possuir a posição social deles, a linguagem também o afastava das classes mais baixas, dos mais pobres, não se vendo como inferior, tampouco como superior. Sendo assim, a antipatia para com Julião Tavares, a imagem do dominante degradado, que se contrapõe ao dominante autêntico (o avô, o velho Trajano), seria devido ao fato de Luís da Silva ver no rival o usurpador do seu lugar de direito, o lugar de dominante, usurpação esta que se consuma, aos seus olhos, com a perda da mulher desejada para aquele-a traição de Marina. Luís da Silva, ao negar o sentido existencial da liberdade, a liberdade de escolha, a necessidade de auto-afirmação perante o outro (e não sobre este), parece ver como negativa a passagem da arcaica sociedade rural nordestina (onde prevalecia a lei do mais forte) para a vida urbana, da sociedade de direitos. Para ele seria como se houvesse uma degradação, a perda de uma liberdade autêntica, tolhida pela instituição da justiça, isto é, a referida liberdade ilimitada, a prática da violência naturalizada, seja como forma de opressão, seja como forma de rebeldia, como se verá no capítulo I desta dissertação. Se eu matasse Julião Tavares, o guarda-civil não levantaria o cassetete: apitaria. Chegariam outros, que me ameaçariam de longe. O guarda-civil não tem coragem. Se tivesse, não olharia os automóveis horas e horas, junto ao relógio oficial: ocupar-se-ia devastando fazendas, incendiando casas, deflorando moças brancas, enforcando proprietários nos galhos do juazeiro. (RAMOS, 2009, p. 195) Na citação acima, o guarda-civil é visto sob o ponto de vista de Luís da Silva, a partir do seu valor anacrônico, a prática da violência naturalizada como expressão da autêntica liberdade. Para ele, o guarda civil seria tolhido na expressão dessa liberdade, seria um ser acovardado, submisso à forma de vida citadina, sem coragem, incapaz de 13 rebelar-se. Ambos, o guarda de trânsito, como também Luís da Silva, sob o ponto de vista deste último, seriam covardes, respeitadores da lei, submetidos à rotina do trabalho nas cidades, diferentes dos senhores de terras, tal como o avô, o velho Trajano, nos seus tempos áureos, que impunha a sua vontade pela força, como também diferentes dos cangaceiros, que não se dobravam às determinações da justiça, da lei, da ordem, rebelando-se contra a opressão dos fazendeiros, tal como fizera Lampião. Seu Ivo, silencioso e faminto, vem visitar-me. Faz agrado ao gato e ao papagaio, entende-se com Vitória e arranja um osso na cozinha. Não quero vê-lo, baixo os olhos para não vê-lo. Fico de pé, encostado à mesa da sala de jantar, olhando a janela, a porta aberta, os degraus de cimento que dão para o quintal. Água estagnada, lixo, o canteiro de alfaces amarelas, a sombra da mangueira. Por cima do muro baixo ao fundo vêem-se pipas, montes de ciscos e cacos de vidro, um homem triste que enche dornas sob um telheiro, uma mulher magra que lava garrafas. Seu Ivo está invisível. Ouço a voz áspera de Vitória e isto me desagrada. Entro no quarto, procuro um refúgio no passado. Mas não me posso esconder inteiramente nele. Não sou o que era naquele tempo. Falta-me tranqüilidade, falta-me inocência, estou feito um molambo que a cidade puiu demais e sujou. (RAMOS, 2009, p. 24) Pode-se afirmar que Luís da Silva sente de forma negativa a passagem do antigo "município sertanejo" para o anonimato da cidade (Maceió), atribuindo a esta transição certo sentimento de perda de liberdade, de inferioridade. O personagem do romance que, aos olhos de Luís da Silva, espelha a sua auto-imagem de dominado, de oprimido e inferior, é a do mendigo seu Ivo, aquele que é incapaz de se rebelar. Daí, além do sentimento de compaixão para com o mendigo, Luís da Silva sentir repulsa, pois aquele seria o exemplo daquilo que este não quer ser, isto é, um covarde, medroso, impotente, incapaz de se rebelar por meio da violência naturalizada, tal como os cangaceiros faziam no passado. Há, no romance, personagens relacionados ao passado da infância de Luís da Silva, que destoam deste perfil do mendigo seu Ivo, por expressarem liberdade ilimitada, por meio da prática da violência naturalizada, seja como forma de dominação, tal como o caso do avô, o velho Trajano, seja como forma de rebeldia, tais como as figuras de criminosos: Chico Cobra, Fabrício, Cirilo da Engrácia etc. Na citação acima, há uma auto-avaliação de cunho moral do protagonista, o qual se vê como degradado por um modo de vida citadino, faltandolhe "tranqüilidade", submetido ao regime disciplinar do trabalho, à vontade do chefe,

Manoel Congo e a jornada em busca da liberdade

IHU On-line: Revista do Instituto Humanitas Unisinos, 2014

IHU On-Line pode ser acessada às segundas-feiras, no sítio www.ihu.unisinos.br. Sua versão impressa circula às terças-feiras, a partir das 8h, na Unisinos.