A DANÇA KALELA Aspectos das relações sociais entre africanos urbanos na Rodésia do Norte (original) (raw)
A DANÇA KALELA Aspectos das relações sociais entre africanos urbanizados na Rodésia do Norte J. Clyde Mitchell Introdução Kalela é o nome de uma dança "tribal" popular no Cinturão de Cobre da Rodésia do Norte. Algumas de suas características me atraíram a atenção quando estava empenhado no trabalho de campo, e utilizei-as como meio de investigar o tribalismo e outras características de relações sociais entre africanos nas cidades da Rodésia do Norte. Ao apresentar o material e sua análise, tentei seguir o método usado por Gluckman na sua Análise de uma situação social na Zululândia Moderna 1 . Gluckman inicia seu trabalho com a descrição de uma cerimônia através da qual uma nova ponte foi inaugurada pelo Comissário-chefe nativo. Ele isola os elementos importantes da cerimônia e, então, os insere na sociedade maior para demonstrar seu significado na cerimônia que acabara de descrever. Acompanhando a liderança na cerimônia Gluckman é levado à uma análise histórico-sociológica acerca da estrutura total da Zululândia moderna. Neste ensaio, tento empregar estas mesmas técnicas gerais. Inicio com uma descrição da dança kalela e, então, relaciono suas principais características ao sistema de relações entre africanos no Cinturão do Cobre. A fim de alcançar tal objetivo, devo levar em consideração, em certo grau, o sistema de relações entre brancos e negros na Rodésia do Norte. Trabalhando com uma situação social específica no Cinturão de Cobre, o tecido social do Território, tomado como um todo é, assim, compreendido. 3 Kalela A dança tribal tornou-se uma característica da vida urbana por todo o sudeste africano. No Witwatersrand (literalmente "Cordilheira das Águas da Sabedoria"), a dança militar dos povos Nguni tornou-se um espetáculo para turistas visto durante as visitas a Joanesburgo. Este tipo de dança também tornou-se uma espécie de recreação organizada, na qual times de dançarinos competem semanalmente 2 . No Cinturão de Cobre, não obstante, a dança "tribal" é uma característica da vida africana. Diferentemente da magnífica dança emplumada, rítmica e militar dos povos Ngumi, a dança tribal no Cinturão de Cobre é um pouco modesta e, em comparação com as danças do sul, quase vulgar. Contudo, em cada cidade ou localidade africana, que tem suas próprias cantigas, equipes de dança de diferentes tribos representam a cada tarde de domingo ou feriado oficial. Os Ngonde, o povo do Kansai, os Nsenga, os Cewa, os Ngoni e muitas outras tribos têm suas próprias danças. Porém a mais popular delas todas é a kalela 3 , que é dançada em todo o Cinturão de Cobre por povos da província a nordeste da Rodésia do Norte. Durante o ano de 1951, pude assistir diversas vezes à kalela representada por uma equipe Bisa no conselho adminitrativo de Luanshya. Reuni certa quantidade de informações a respeito da formação social dos dançarinos 4 . A descrição da dança e dos dançarinos, assim, é baseada nesta equipe. Ela é formado por dezenove homens jovens. A indumentária dos dançarinos representantes da plebe consistia de calças compridas de cor cinza, camisetas limpas e bem passadas e sapatos bem polidos. Alguns levavam lenços brancos na mão direita. Seus 1 Gluckman (1940) 2 Jokl (1949). Um prêmio é dado ao time que vence a competição da dança tribal, realizada anualmente em Salisbury. 3 Há muitas danças similares à kalela, porém conhecidas por diversos nomes. A dança mbeni, espalhada pela África Central antes da guerra de 1939-45, e a qual, meus informantes disseram, a kalela se desenvolveu, era quase idêntica. Uma dança conhecida como mganda na província oriental da Rodésia do Norte é igual. Uma dança entre os Tonga do lago, chamada malipenga, possui muitas características semelhantes. O senhor C.M.N White conta que uma dança similar entre os Luwale, Luchazi e Chokwe é conhecida como nyakasanga, embora ele chame a atenção para o fato de seus vizinhos, os Lunda do ocidente, chamarem esta dança de kalela. Numa recente competição de danças tribais, ocorrida em Mufulina e noticiada no Mufulina Star, vol.4, número 6 de junho de 1956, as equipes Kalela Smart e Karonga Boma, segunda e terceira colocadas, eram formadas por dançarinos do tipo kalela. 4 Sou grato ao senhor Sykes Ndilila, então assistente de pesquisa do Rhodes-Livingstone Institute, que coletou informações pessoais dos dançarinos e gravou letras de canções.