Deslocamentos: O Entre-Lugar Do Indígena Na Literatura Brasileira Do Século XX (original) (raw)
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Narrativas de Deslocamento na Literatura Brasileira Contemporânea
O conceito de viagem, de acordo com Caren Kaplan, Questions of Travel: Postmodern Discourses of Displacement (1996), se transformou em uma referência a movimentos populacionais, bem como em uma metaforização de processos de questionamento identitários essencializados. Nesse sentido, Kaplan parte do pressuposto de que a subjetividade moderna sempre valorizou a mobilidade e de que, se a viagem foi tão central para a constituição desta subjetividade, uma análise do deslocamento deveria se tornar uma prioridade para o discurso crítico da contemporaneidade (32). Tomando como pressuposto esta necessidade crítica, este trabalho tem como objetivo discutir as implicações do deslocamento transnacional no contexto da literatura brasileira contemporânea. Mais especificamente, a base para esta discussão está estruturada em dois romances: Viagem ao México 1995), de Silviano Santiago (1936 -) e Berkeley em Bellagio (2002), de João Gilberto Noll (1946 -). Apesar de suas diferenças específicas, esses dois romances constituem a metáfora do deslocamento como um gesto de confrontamento de formações autoritárias, de identidade cultural e de sistema político. Em Silviano Santiago, o deslocamento aparece como um mecanismo de produção de conhecimento histórico sobre a formação cultural latino-americana. Nesse sentido, Viagem ao México funciona como revelador dos modos de resistência, assimilação e transformação do eu e do outro[1]. Esta recuperação histórica da formação discursiva latino-americana na escrita de Silviano Santiago constitui, portanto, uma representação do debate pós-colonial no contexto da América Latina, trazendo à tona uma dimensão teórica que pode ser considerada metanarrativa, a partir da nomenclatura de Linda Hutcheon (1988). Viagem ao México realiza uma discussão sutil e astuciosa das tensões em torno do projeto civilizatório Ocidental diante do desafio do encontro entre o euporeu e o latino-americano, bem dos próprios latino-americanos entre si. No caso de João Gilberto Noll, a metáfora do deslocamento funciona como a representação de uma viagem aos processos subjetivos que constituem seus personagens, mas sem a dimensão histórica construída por Silviano Santiago em Viagem ao México. A viagem rumo ao espaço do outro torna-se o desencadeador de um processo de auto-análise, a partir do reconhecimento da diferença que constitui toda identidade. A viagem em João Gilberto Noll é feita para conhecer o outro, que está fora do sujeito, mas que, em certo sentido, está nele próprio (Kristeva, 1991; Young, 2001: 425) [2]. Apesar dos traços distintivos presentes nesses dois romances, um elemento unifica essas duas performances representativas do deslocamento: dramatiza-se nestes romances o percurso de constituição dos sujeitos na/pela linguagem. É fundamental assinalar que tais gestos representativos revelam também uma reflexão sobre o próprio ato de narrar a viagem e o encontro com o "novo" e com a diferença. Esses dois romances brasileiros contemporâneos constituem suas especificidades, enquanto discurso literário, conscientes das implicações do eu na construção do outro e em busca de formações culturais menos autoritárias.[3]
Figurações do deslocamento nas literaturas das Américas
Estudos De Literatura Brasileira Contemporânea, 2007
Por um conceito de deslocamento Em Física, o deslocamento de um corpo é definido como a variação de posição de um móvel dentro de uma trajetória determinada. O deslocamento representa a porção da trajetória pela qual o móvel se deslocou. No espaço cartesiano, o vetor do deslocamento une o ponto de partida ao ponto de chegada. A palavra tem também o sentido de migração por perseguições ou violência (ex: los desplazados, na Colômbia) e, em psicologia, remete a um mecanismo subconsciente de defesa que faz com que um sujeito desloque, por exemplo, o objeto de seu afeto de um ser a outro.
A presença indígena na Literatura Brasileira
Lumen
Resumo: Este artigo é resultado de uma pesquisa realizada por meio do Núcleo de Pesquisa da Faculdade Frassinetti do Recife-FAFIRE, com o objetivo de compreender como os povos indígenas estão retratados na Literatura Brasileira. A pesquisa bibliográfica foi realizada durante os anos de 2020 e 2021, fundamentada principalmente em Bosi (2017), Almeida (2019), Luciano (2006) e Silva (2020), que possibilitaram uma análise crítica acerca da Literatura Brasileira e das culturas indígenas do país. Os resultados apontaram para uma representação estereotipada dos povos indígenas, que os coloca sempre como selvagens ou passivos, ignorando a importância dos nativos na construção do país e nas lutas contra a expropriação pelos colonizadores. Esperamos, portanto, que esse estudo seja um contributo para a discussão étnico-racial no país, por meio da Literatura Brasileira, possibilitando uma perspectiva crítica e social das obras produzidas ao longo dos séculos, a fim de contribuir para uma sociedade menos preconceituosa. Palavras-chave: Literatura Brasileira. Escolas Literárias. Culturas indígenas.
Deslocamentos urbanos na literatura brasileira contemporânea
Brasiliana Journal For Brazilian Studies, 2014
Contemplando Nova Iorque do alto do World Trade Center, nos anos 1970, Michel de Certeau propunha uma reflexão sobre as diferentes possibilidades de leitura e escrita do espaço urbano 2. Para ele, a perspectiva distanciada e abrangente permitia uma compreensão da cidade que dificilmente os homens e mulheres que habitavam suas calçadas poderiam ter. No entanto, seriam justamente esses "praticantes ordinários da cidade" os únicos capazes de escrevê-la, com seus corpos, gestos e movimentos: "As redes dessas escrituras avançando e entrecruzando-se compõem uma história múltipla, sem autor nem espectador, formada em fragmentos de trajetórias e em alterações de espaços" (Certeau, 1994 [1990], p. 171). Essa distinção entre ver e viver a cidade, ou entre ler e escrevê-la, parece pertinente quando o objetivo é justamente entender personagens que se constituem, e constituem seu espaço, a partir de seus muitos deslocamentos. A discussão, aqui, acompanhará os percursos de personagens pobres, detendo-se sobre as especificidades de seus movimentos e os significados de seus relatos. Serão analisados os livros Guia afetivo da periferia (2009), de Marcus Vinícius Faustini, Passageiro do fim do dia (2010), de Rubens Figueiredo, Estação terminal (2010), de Sacolinha, e A máquina de revelar destinos não cumpridos (2009), de Vário do Andaraí. Em trabalho anterior, sobre obras em evidência na literatura brasileira publicadas entre os anos 1970 e 1990 (de autores como Carlos Sussekind, Cristovão Tezza, Sérgio
A Cultura Indígena Nas Páginas Da Literatura
Revista e-scrita : Revista do Curso de Letras da UNIABEU, 2015
O artigo aborda a tematica indigena na literatura em que, no seculo XVIII, muitos escritores despertaram a atencao em retratar o indianismo em suas obras. Exemplificando, destacam-se duas epopeias com a tematica do indianismo: O Uraguai (1769), de Jose Basilio da Gama e o Caramuru (1781), de Santa Rita Durao. O poema Uraguai realiza a glorificacao do portugues e do pais, sendo que o brasileiro ja estava envolvido pelo sistema colonial. Os poetas do seculo XVIII anunciaram o Indianismo, que foi um dos mais poderosos instrumentos da construcao da identidade nacional. Atualmente, parece que comeca a despontar uma postura para tentar amenizar o problema da discriminacao indigena. Na ultima decada do seculo XX, comecam a ganhar espaco nas livrarias, alguns livros de escritores indigenas.
Literatura em Debate, 2018
RESUMO: O texto propõe um exame das mudanças de perspectiva no romance indianista brasileiro a partir do final do século XX e como estas acompanham a emergência do romance de autoria indígena e seu processo de autoinclusão na cultura nacional como uma forma de expressão ainda não totalmente reconhecida como parte do cânone brasileiro. Palavras-chave: Literatura indianista brasileira do século XXI. Literatura indígena brasileira. Inclusão e auto-inclusão. Munduruku. Potiguara. Graúna. Esse livro é uma modesta tentativa de tirar de sua cabeça a imagem, a um só tempo clássica e profundamente equivocada, do Brasil pré-Cabral como um paraíso terrestre tropical, no qual a mão do homem (e da mulher, lógico) pouco havia mexido. [...] as últimas décadas foram marcadas por uma explosão de pesquisas-em áreas tão diferentes quanto a arqueologia, a genômica e a botânica-que estão ajudando a retratar uma pré-história brasileira infinitamente mais vibrante e complexa do que estereótipo de imobilidade perpétua dos nativos que tivemos que engolir na escola. Reinaldo José Lopes. 1499. O Brasil antes de Cabral (2017) Minha fala é forte e está comigo / Falo a verdade, não quero ser que nem você / Canto vários temas e isso que venho mostrando / Voz indígena é a voz de agora. "Koangagua", Brô MC's (Kaiowá-Guarani), 2015 O índio como figura da alteridade nacional O ensino superior no Brasil ainda é um privilégio de certos segmentos sociais, abrindose aos poucos com um programa de cotas-sempre sob ataque-e com a reconfiguração dos
Uma Outra História: a Escrita Indígena no Brasil
Alguns estudiosos definem a escrita como parte do comportamento comunicativo humano de transmitir e trocar informações; ou seja, a escrita pode ser vista como uma forma de interação pela qual uma ação das mãos (com ou sem um instrumento) deixa traços numa superfície qualquer; nesse sentido, a escrita pode ser concebida como uma forma não apenas alfabética para representar idéias, valores ou eventos. Entendido assim, a escrita sempre esteve presente nas culturas indígenas no Brasil na forma de grafismos feitos em cerâmica, tecidos, utensílios de madeira, cestaria e tatuagens.
O Entre-Lugar Na Literatura Regionalista: Articulando Nuanças Culturais
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Leoné Astride Barzotto* RESUMO: A hibridização ocorre no local cultural, num 'entre-lugar' deslizante, com a fusão de universos diversos entre os quais o sujeito da linguagem se situa mediante um contexto (ideológico, social e histórico) que permite a visualização e a audição do discurso híbrido. Logo, esse in-between space vivencia a hibridização porque é altamente ambivalente e contraditório, pois carrega todo o peso e o significado das culturas que o edificam, mas é, acima de tudo, uma condição prévia para a articulação das nuanças culturais. Assim, estudar-se-á um corpus literário de caráter regional que permite a averiguação deste entre-lugar na interface da literatura para com a cultura.
ENTRANDO NA CULTURA ESCRITA: UM CASO IMPROVÁVEL NAS PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉCULO XX
O que ele contava -e que a família recita como um mito de origem -é que foi o primeiro filho varão, nascido em 1903, 1 de uma família "humilde" e sem "muita instrução, em Cachoeira do Campo, um distrito de Ouro Preto. Embora seu avô, José, fosse "homem de algumas posses", 2 tivesse o ofício de correerio e sua oficina fosse considerada grandeé o que se relata -, teria conseguido educar apenas um de seus 14 filhos, no Seminário da Boa Morte, em Mariana, onde se ordenou sacerdote em 1888. Os outros irmãos "ficaram