Breviário de um museu mutante (original) (raw)

O museu mutante

Quando me vi diante da nova oportunidade de contribuir com um artigo para a edição do dia 18 de maio da Revista Museu, pensei longamente sobre qual caminho tomar para falar dos museus hiperconectados.

A reinvenção de um museu de ciências em tempos de pandemia

Revista Museu, 2021

"Este artigo se insere no tema proposto pela Revista Museu para a celebração do Dia Internacional dos Museus 2021, que trata das adaptações que se fizeram necessárias nas instituições museais, devido ao prolongamento do cenário pandêmico, que já dura desde o início de 2020, bem mais longo do que se poderia imaginar. Apresentaremos aqui as estratégias realizadas nesse período pelo Museu da Vida, localizado no bairro de Manguinhos, Rio de Janeiro, dentro do campus da Fundação Oswaldo Cruz - uma das maiores instituições de ciência, tecnologia e saúde da América Latina."

Mudança de paradigma em museu de ciências

Museologia & Interdisciplinaridade

O Museu de Ciências Naturais – MUCIN – da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) está localizado em Imbé, litoral norte do Rio Grande do Sul (RS). Especializado em fauna marinha e costeira, tem trabalhado em suas exposições temas relacionados à composição desses ecossistemas, ressaltando sua biodiversidade e discutindo sustentabilidade e conservação, bem como patrimônio cultural e natural. Discutimos nesse trabalho, a mudança de paradigma desse espaço a partir da construção do diálogo com seus visitantes, viabilizada através das exposições e ações educativas. A prática de tais atividades contribui para uma mudança e ampliação da função do MUCIN.

O museu transformado em campo operatório em guardiães do Louvre

Revista Memorare, 2019

A graphic novel Guardiães do Louvre propõe uma visita pouco ortodoxa ao Museu do Louvre, em Paris, focada não nos roteiros turísticos, mas na apreciação de obras de autores como Jean-Baptiste Camille Corot e Vincent Willem Van Gogh. A abordagem do autor, Jiro Taniguchi, se assemelha à perspectiva de “campo operatório” (table) sugerida por Georges Didi-Huberman, onde o processo se sobrepõe à obra pronta (tableau). Em uma visão historiográfica, a proposta de Taniguchi apresenta múltiplas (e infinitas) possibilidades de interpretação, abrindo-se em um panorama dinâmico e heterogêneo, semelhante à ideia de olhar o passado “a contrapelo” proposta por Walter Benjamin.

Sobre Museus e Monstros

Anos atrás, em viagem à Espanha, percorri o Museu do Prado inteiro arrastando meu caçula para ver El sueño de la razon produce monstruos (1797-1799) de Francisco de Goya. Não podíamos perder aquela oportunidade: monstros haviam me acompanhado ao longo da escrita de tese -Leviatãs, Golens, Cyborgs, Calibãs, etc -mas não eram monstros produzidos pelo sono da razão e sim pelo acordar ou abertura da razão a uma multiplicidade de formas de vida. Esses monstros da ambivalência, do excesso, da desmedida e da resistência eu os havia encontrado na leitura de Antonio Negri e dela estava impregnada quando me deparei com um cartaz-faixa que, pendurado no alto de uma imensa ocupação em pleno centro da cidade de São Paulo, gritava "Zumbi somos nós!"[i]. Impactada pela sublime visão da Prestes Maia, decidi pesquisar sua potente produção social, cultural e artística, e a ela dedicar um texto: Outros monstros possíveis [ii]. Anos mais tarde, voltei a me deparar com o monstro, desta vez na cidade do Rio de Janeiro em plena "ressignificação" criativa e "revitalização" urbana. Nesse processo, a museificação (ou simplesmente institucionalização) da cultura e da arte carioca organiza em termos econômicos a primeira e legitima em termos políticos a segunda. É no seio desse projeto que remove favelas, gentrifica bairros populares e elimina qualquer possibilidade de alteridade e heterogeneidade na cidade,

O museu das insignificancias

Primeiro contemplei no tocador as pequenas joias, as loções e os objetos que usava. Peguei-os e os olhei. Dei-lhe voltas e voltas na mão ao seu diminuto relógio. Depois olhei o armário. Todas aquelas roupas e aqueles acessórios, empilhados uns sobre os outros. Os objetos que completam a todo ser me produziram uma solidão e uma dor terríveis e a sensação e o desejo de ser seu. Ahmet Hamdi Tanpinar I. Não é o museu o que me interessa, o que me interessa são as insignificâncias e sua existência precária. Afinal, quem ou que pode determinar a significância ou a insignificância das coisas? Os objetos descartados, perdidos ou olvidados, perdem o valor de uso, mas ganham, em poder de sugestão, um acréscimo que os coloca em algum lugar entre a relíquia e o testemunho; que os afasta da insignificância e os impregna de sentidos íntimos e pessoais, mas que, paradoxalmente, são uma e outra vez compartilhados. Na Casa Museu de Bolívar, na cidade de Bucaramanga, nordeste da Colômbia 1 , há, numa vitrine, um peinetón: um grande pente convexo de tartaruga que, na época colonial, as mulheres usavam como enfeite de cabelo, sob a mantilha de rendas. A legenda sob a vitrine diz: Peinetón usado por una mujer que danzó con el libertador Simon Bolívar. E imaginamoscriamos imagensdo garboso oficial, da bela mulher (tem que ter sido bela), dos salões iluminados com velas. O pente é quase uma antiguidade, mas o que importa não é seu desenho, nem o material do qual está feito, nem a ocasião em que foi usado, nem sequer a identidade dessa mulher que 1 Devo essa informação ao Dr. Adolfo Cifuentes.

Fazer um museu numa ruína moderna

Midas, 2014

Ambiguidade. O museu e a galeria 1 Abordar o programa museu implica hoje reconhecer a experiência deste espaço na vida das comunidades, bem como o posicionamento do seu lugar numa estratégia mais abrangente na política cultural das cidades. Um museu não é, geralmente, uma decisão isolada-partilha de diversas ligações sociais, políticas, até circunstanciais, que transcendem a fixação dos conteúdos. Delinear um museu implica também uma investigação específica-uma investigação disciplinar. Esta investigação incide habitualmente sobre as precedentes posições de diretores de museus, comissários, soluções museográficas e temas de arquitetura. Estas posições provêm de exemplos construídos ou de projetos. Este artigo desenvolve uma abordagem ao museu a partir da arquitetura, e toma como estudo de caso a instalação provisória do MUDE-Museu do Design e da Moda, Coleção Francisco Capelo (daqui em diante apenas MUDE) em Lisboa, um projeto dos autores do texto. 2 Na segunda metade do século XX, o programa museu permitiu um conjunto de reflexões no domínio do espaço e da perceção, sobretudo a partir do universo da arte, que muito Fazer um museu numa ruína moderna MIDAS, 4 | 2014

O museu é um espelho ustório

Remate de Males

Resumo: "O museu é o espelho colossal onde o homem se contempla, finalmente, sob todos os ângulos, julga-se literalmente admirável e se abandona ao êxtase expresso em todas as revistas de arte" (BATAILLE, 1970, p. 240). De acordo com Georges Bataille (Documents, publicado em 1929), o espelho é uma metáfora do museu como um todo. Uma longa tradição intelectual no pensamento latino-americano (em especial no Chile, de Sarmiento a Lihn) manteve a divisão sujeito/objeto para analisar de que modo as construções materiais, culturais, sociais e políticas funcionam, de ambos os lados dessa relação, na medida em que ambas estão inscritas com histórias e identidades e podem até modificar-se reciprocamente no interior do espaço do museu. Palavras-chave: formação identitária; experiência de memória; pesquisa acadêmica.