PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (34) (original) (raw)

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (30)

Tive o grande prazer de ser uma das primeiras leitoras da edição em português desta sua obra, em coautoria com Ira Shor. Senti-me muito estimulada e identificada com o conteúdo deste livro. Por ter o privilégio de trabalhar ao seu lado, nos seminários que você dirige no Curso de Pós-Graduação em Supervisão e Currículo da PUC/SP, pude ver descrito e cuidadosamente analisado o seu trabalho na universidade, desde sua volta ao Brasil. Encontrei, ao longo dos capítulos, as questões que os nossos alunos, turma após turma, lhe propõem. Depareime também com as respostas que você, com paciência pedagógica, tem construído e colocado em discussão. Porém, nos depoimentos apresentados neste livro, não há um simples arrolamento das posições que você tem expressado em seminários. Notei, sim, coerentemente com o que você propõe a respeito da construção do conhecimento, um conjunto de reflexões recriadas à luz das indagações e discussões argutas do jovem professor da City University of New York, seu brilhante interlocutor. Foi surpreendente notar que as perguntas dos educadores brasileiros em torno da educação libertadora são coincidentes com aquelas expostas pelos professores norte-americanos. Ira Shor, ao colecionar as dúvidas de professores ao longo dos Estados Unidos e dispondo-se a discuti-las com você, tendo como pano de fundo as características culturais de cada um dos países, trouxe à tona a potencialidade, dimensão e possibilidades da educação libertadora para além das fronteiras do Terceiro Mundo. Este livro propõe um sério desafio a todos aqueles professores, do primeiro grau à universidade, que querem assumir o compromisso com uma sociedade mais justa, desenvolvendo a sua ação pedagógica dentro e fora da escola, conhecendo, porém, os limites da educação no conjunto geral das práticas sociais. Mais do que um convite e um desafio a uma educação transformadora, encontrei nos seus depoimentos e nos de Ira um caminho para aqueles professores que estão dispostos a fazer a trajetória transformando-se de um "professor transmissor" em um "professor libertador". Na análise dessa caminhada defrontei-me com o tratamento dos temas que estão necessariamente no bojo do pensar sobre a educação libertadora. A natureza da educação como ato político, as possibilidades e os limites da educação, a relação desta com a transformação social, a importância do trabalho do professor na escola, a necessidade da atuação pedagógica no nível da educação formal e informal, as características do método dialógico, temas tratados em alguns momentos anteriores de sua obra, adquiriram neste livro um significado especial. Estão recriados com o crivo de sua própria crítica e acrescidos de clareza, concretude e aprofundamento cada vez maiores. Acredito, Paulo, que dentre as discussões contidas no texto, uma delas é de singular relevância para os educadores brasileiros. Ela está no fato de que este trabalho poderá dirimir muitas das percepções equivocadas sobre o seu pensamento no que diz respeito às possibilidades da educação libertadora no contexto escolar. Você e Ira demonstram não somente que isso é possível, mas, principalmente, necessário. A partir dessa posição, bastante bem-explicitada, os educadores poderão apreender as concepções fundamentais sobre o currículo numa perspectiva libertadora. Mais de uma vez você tem destacado que a principal função do currículo é desocultar a ideologia dominante. Desta vez, porém, as propostas concretas sobre como trabalhar com os objetos do conhecimento reconstruindo-os numa perspectiva crítica, a partir da cultura do aluno, como expressão de classe social, são retomadas de uma forma bastante profunda e clara. Creio que não restarão dúvidas a respeito do método dialógico utilizado para conhecer e reconstruir o conhecimento, e nessa perspectiva ficou mais uma vez demonstrado que essa proposta, ao contrário de ser espontaneísta, como muitas visões míopes interpretam, propõe-se rigorosa e com horizontes bem definidos. Finalmente, Paulo, quero afirmar que percebo este livro extremamente oportuno no momento atual da política e da educação brasileira. Sinto que Elza não acompanhe a repercussão positiva que ele certamente terá.

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (42)

Na década de 1970, Paulo Freire assessorou vários países da África que haviam se libertado da colonização europeia, cooperando na implantação de seus sistemas de ensino pós-coloniais. O processo de descolonização e reconstrução nacional tinha por base de suas políticas o princípio da autodeterminação e a valorização da sua cultura e da sua história. O trabalho de Paulo Freire na África foi decisivo para a sua trajetória, não só por reencontrar-se com sua própria história e por empreender novos desa os no campo da alfabetização de adultos, mas, principalmente, pelo encontro com a teoria e a prática desse extraordinário pensador e revolucionário que foi Amílcar Cabral, por quem Paulo Freire nutria enorme apreço. Em suas obras, ele faz frequentes referências ao pensamento de Amílcar Cabral. A África, berço da humanidade, foi para Paulo Freire uma grande escola. Amílcar Cabral sustentava que a libertação nacional é um ato cultural. A libertação política não elimina a presença do colonizador. Ele continua na cultura imposta e introjetada no colonizado. O trabalho educativo pós-colonial se impõe como tarefa de descolonização das mentes e dos corações. Assim como é necessária a luta social para a descolonização política, também é necessária a luta por uma outra educação, libertada dos traumas coloniais e que consiga descolonizar as mentes. Os autores deste livro mostram as convergências entre Amílcar Cabral e Paulo Freire na luta intransigente contra todas as formas de opressão, em defesa da autoconscientização, portanto da descolonização das mentes, e da conquista da autonomia pelos(as) próprios(as) oprimidos(as), e os nexos mais profundos entre o legado de ambos, especialmente no que diz respeito à Razão Revolucionária, tanto em seu sentido político quanto em seu signi cado gnosiológico, epistemológico e pedagógico.

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (39)

PAULO FREIRE NASCEU NO RECIFE em 19 de setembro de 1921. Cresceu dentro de um ambiente de fraternidade, solidariedade e retidão de princípios ensinados pelos pais. Formou-se como gente, cidadão e intelectual engajado, inicialmente, em sua cidade natal, no Colégio Osvaldo Cruz e na Faculdade de Direito. Com o golpe militar de 1964, no Brasil, tornou-se cidadão do mundo, o "peregrino do óbvio", como ele mesmo se designou. Aprendeu e ensinou num processo dialético ininterrupto de sentir, observar, pensar, escrever e praticar, sem nunca ter perdido as suas origens nordestinas, tipicamente recifenses, até o último dia de sua vida. Escreveu algumas dezenas de trabalhos: livros, conferências, ensaios. Recebeu reconhecimento, por sua teoria e sua práxis, de movimentos sociais, de universidades, de Organizações Não Governamentais (ONGS) e de governos de quase todo o mundo. É Doutor Honoris Causa de 39 universidades do Brasil e do exterior. Recebeu também mais outros quatro títulos congêneres, acadêmicos e honoríficos, de instituições educacionais do Brasil e dos Estados Unidos. Recebeu Título de Cidadão de treze cidades e de um estado no Brasil, além de mais duas cidades estrangeiras. Entre outros importantes prêmios recebidos, destacam-se: o "Reza Pahlevi", da Unesco; o "Rei Balduíno", do próprio rei da Bélgica; o "Educador para a Paz", da Unesco; o "Andrés Bello", da Organização dos Estados Americanos (OEA); e o "Moinho Santista", do Brasil. Foi um homem que educou as virtudes fazendo dele mesmo o aprendiz de um mestre que praticava a Paideia com os seus alunos, à maneira de como os filósofos gregos da Antiguidade educavam os seus discípulos. Assim, faziam parte intrínseca de seu modo de ser, de postar-se diante do outro/a e da vida social: o respeito, a generosidade, a coerência e uma capacidade ímpar de amar. Tornou-se, assim, por sua inteligência política e compaixão ética para com os oprimidos/as, o "educador/pedagogo da consciência ético-crítica", como o nomeou o filósofo da libertação Enrique Dussel. Paulo faleceu na cidade de São Paulo, em 2 de maio de 1997, em plena atividade político-educativa, surpreendido por um enfarte agudo do miocárdio.

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (32)

ACEITEI O DESAFIO DE ESCREVER o prefácio deste livro do prof. Paulo Freire movida mesmo por uma das exigências da ação educativo-crítica por ele defendida: a de testemunhar a minha disponibilidade à vida e aos seus chamamentos. Comecei a estudar Paulo Freire no Canadá, com meu marido, Admardo, a quem este livro é em parte dedicado. Não poderia aqui me pronunciar sem a ele me referir, assumindo-o afetivamente como companheiro com quem, na trajetória possível, aprendi a cultivar vários dos saberes necessários à prática educativa transformadora. E o pensamento de Paulo Freire foi, sem dúvida, uma de suas grandes inspirações. As ideias retomadas nesta obra resgatam de forma atualizada, leve, criativa, provocativa, corajosa e esperançosa, questões que no dia a dia do professor continuam a instigar o conflito e o debate entre os educadores e as educadoras. O cotidiano do professor na sala de aula e fora dela, da educação fundamental à pós-graduação. É explorado como numa codificação, enquanto espaço de reafirmação, negação, criação, resolução de saberes que constituem os "conteúdos obrigatórios à organização programática e o desenvolvimento da formação docente". São conteúdos que, extrapolando os já cristalizados pela prática escolar, o educador progressista, principalmente, não pode prescindir para o exercício da pedagogia da autonomia aqui proposta. Uma pedagogia fundada na ética, no respeito à dignidade e à própria autonomia do educando. Como os demais saberes, este demanda do educador um exercício permanente. É a convivência amorosa com seus alunos e na postura curiosa e aberta que assume e, ao mesmo tempo, provoca-os a se assumirem enquanto sujeitos sócio-histórico-culturais do ato de conhecer, é que ele pode falar do 1 PRÁTICA DOCENTE: PRIMEIRA REFLEXÃO DEVO DEIXAR CLARO QUE, embora seja meu interesse central considerar neste texto saberes que me parecem indispensáveis à prática docente de educadoras ou educadores críticos, progressistas, alguns deles são igualmente necessários a educadores conservadores. São saberes demandados pela prática educativa em si mesma, qualquer que seja a opção política do educador ou educadora. Na continuidade da leitura vai cabendo ao leitor ou leitora o exercício de perceber se este ou aquele saber referido corresponde à natureza da prática progressista ou conservadora ou se, pelo contrário, é exigência da prática educativa mesma independentemente de sua cor política ou ideológica. Por outro lado, devo sublinhar que, de forma não sistemática, tenho me referido a alguns desses saberes em trabalhos anteriores. Estou convencido, porém, é legítimo acrescentar, da importância de uma reflexão como esta quando penso a formação docente e a prática educativo-crítica. O ato de cozinhar, por exemplo, supõe alguns saberes concernentes ao uso do fogão, como acendê-lo, como equilibrar para mais, para menos, a chama, como lidar com certos riscos, mesmo remotos, de incêndio, como harmonizar os diferentes temperos numa síntese gostosa e atraente. A prática de cozinhar vai preparando o novato, ratificando alguns daqueles saberes, retificando outros, e vai possibilitando que ele vire cozinheiro. A prática de velejar coloca a necessidade de saberes fundantes como o do domínio do barco, das partes que o compõem e da função de cada uma delas, como o conhecimento dos ventos, de sua força, de sua direção, os ventos e as velas, a posição das velas, o papel do motor e da combinação entre motor e velas. Na prática de velejar se confirmam, se modificam ou se ampliam esses saberes.

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (28)

Antes que me esqueça: quanto à história do carnaval, Louis Porcher é quem nos joga a chave para a compreensão de mais um lance ao nos apresentar mais adiante o russo Mikhail Bakhtin: Segundo Bakhtin, nossa vida é carnavalesca, isto é, feita de camadas múltiplas, de ingredientes diversos, de festas e tristezas, de máscaras e de verdade. A mídia também é eminentemente carnavalesca. É a espetacularização, a prática das máscaras, a festa e o trágico, o trágico tornado festivo, assim como as diferentes camadas de sentidos, imbricadas umas nas outras, que só são percebidas se o destinatário dispõe de um capital. Quanto maior for o nosso capital cultural, tanto mais significações plurais nós veremos num programa ou num artigo. Em suma, a mídia não fala, a não ser em função das competências culturais do receptor. Será? Leia, julgue. E acredite se quiser: o novo Houaiss já registra carnavalização como termo em literatura, comunicação e sociologia, com o sentido de: 1.1 mistura de elementos diversos em que as regras ou padrões (sociais, morais ou ideológicos) comumente seguidos são subvertidos ou postos de lado, em favor de estímulos, formas e conteúdos mais ligados aos instintos e aos sentidos, à expansão do riso e da sensualidade (a carnavalização é um aspecto da literatura de Rabelais); 1.2 condição daquilo que apresenta tal mistura. Etimologia carnavalizar +-ção; nas duas últimas acepções, é conceito criado por Mikhail Bakhtin (1895-1975, crítico literário russo). 6 Boa leitura e olho na mídia! Sérgio Guimarães Bissau, 2 de março de 2003 Notas 1 Para as edições de 2011, optou-se por trabalhar cada livro de forma independente. Dessa maneira, Sobre educação: diálogos I tornou-se Partir da infância: diálogos sobre educação; Sobre educação: diálogos II ficou com o título Educar com a mídia: novos diálogos sobre educação; Aprendendo com a própria história I se manteve, mas sem a indicação de volume; e Aprendendo com a própria história II tornou-se Dialogando com a própria história.

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (23)

Recebi a notícia pouco depois da meia-noite de 2 de maio de 1997, em Luanda, Angola, através da RTP-Rádio e Televisão Portuguesa. Choque? Só não terá sido certamente maior que o baque sentido por aqueles que amavam o Velho e viviam perto dele. Sérgio Guimarães Tegucigalpa, 27 de janeiro de 2010 Notas 1 Para as edições de 2011, optou-se por trabalhar cada livro de forma independente. Dessa forma, Sobre educação: diálogos I tornou-se Partir da infância: diálogos sobre educação; e Sobre educação: diálogos II, ficou com o título Educar com a mídia: novos diálogos sobre educação. O livro posterior a este Aprendendo…tem como título Dialogando com a própria história. (N.E.) 2 V. seu artigo "Amor e perda em tempos de vida: em dois momentos entrelaçados".

PAULO FREIRE PARA PEDAGOGIA (25)

A Amílcar Cabral, educador-educando de seu povo " Posso ter minha opinião sobre muitos temas, sobre a maneira de organizar a luta; de organizar um partido; uma opinião que se formou em mim, por exemplo, na Europa, na Ásia, ou ainda em outros países da África, a partir de livros, de documentos, de encontros que me influenciaram. Não posso porém pretender organizar um partido, organizar a luta, a partir de minhas idéias. Devo fazê-lo a partir da realidade concreta do país."