Autorretrato: ato performativo (original) (raw)

2022, Revista COR LGBTQIA+, v. 1, n. 3, p. 328-335, jul

A presente série reflete sobre o autorretrato enquanto criação que documenta e inventa uma realidade, menos como testemunho indicial e mais como construção ou ato performativo, considerando a linguagem como ação (BUTLER, 2018). Estou seguindo a noção de fotografia como performance, que tem no experimento de Hippolyte Bayard, O Afogado (1840), um de seus começos. A fotografia, segundo González Flores (2011), pode significar uma “vontade de ficção”. Esse entendimento aproxima pintura e fotografia, enxergando esta última por sua artisticidade. Desse modo, a verdade fotográfica funciona apenas pelo consenso em torno de convenções culturais como “exatidão”, “precisão”, “continuidade com o real”. Nas imagens a seguir, exploro a linguagem fotográfica para gerar torções, distorções, optando pelo preto e branco para enfatizar o não realismo. Aqui o autorretrato é pensado como “tecnologia de corporalidade” (LIMÓN SERRANO, 2014), meio para projetar-se como um “não se quer ser” ou, ao contrário, um “eu que se quer ser” (DOMÍNGUEZ ROMERO, 2014). A arte-fotografia, assim, escapa do realismo, capta forças, não “representa” estados de coisas, não “registra”, expressa, produz sentidos na fronteira entre imagens e coisas (ROUILLÉ, 2009). Estou me distanciando da noção de fotografia “tirada”, que aparenta ser “descritiva”, “análoga ao real”. Inspirado na produção de Duane Michals, que afirma a sua condição de fotógrafo-autor (misturando imagem e verbo, trabalhando em fotografias pintadas), exploro as possibilidades da fotografia “feita” (VASQUEZ, 2014), como um acontecimento que realiza aquilo que torna visível/dizível. Na série, foram exploradas possibilidades criativas de movimento, luz, torções corporais, objetivando uma fotografia “realizada”, tornada real.