Arqueologia Industrial Research Papers - Academia.edu (original) (raw)
O uso do tabaco foi prática quase ubíqua entre os luso-brasileiros, desde a implantação da colônia no século XVI. Hábito adquirido dos nativos e ressignificado ao longo dos séculos, ele podia ser mastigado, aspirado como rapé, ou inalado... more
O uso do tabaco foi prática quase ubíqua entre os luso-brasileiros, desde a implantação da colônia no século XVI. Hábito adquirido dos nativos e ressignificado ao longo dos séculos, ele podia ser mastigado, aspirado como rapé, ou inalado em cachimbos, cigarros, e, posteriormente, charutos. A iconografia histórica e os relatos dos cronistas ilustram vários desses momentos cotidianos. Neles o fumo aparece como coadjuvante e em segundo plano, mas recorrente. Nesta tese, procuro trazer o fumo e os cachimbos arqueológicos, em especial os de caulim, para um primeiro plano, valendo-me de ambas as fontes de informação: históricas e arqueológicas. Esses cachimbos, pouco estudados no Brasil, são o foco material principal desse trabalho, sobre os quais está sintetizada aqui a principal bibliografia internacional de análise, para futuras referências. Apresenta-se também uma distribuição amostral de tipos de cachimbo no registro arqueológico brasileiro, a partir de informações secundárias compiladas sobre vários sítios arqueológicos. Para trabalhar em escala mais local e aproximar contextos pontuais de consumo e uso de tabaco, são então expostas as análises realizadas em seis coleções arqueológicas de cachimbos de caulim. São elas a do Forte Orange e a do Recife Antigo, PE; a da Sé Primacial de Salvador, BA; as da Zona Portuária do Rio de Janeiro – Etapas 1 e 2, RJ; e a da Praça Cel. Osório, Pelotas, RS. A partir desses dados arqueológicos, do seu padrão de dispersão e dos períodos a que se referem, ficou evidente que os maiores acervos de cachimbos de caulim no Brasil se referem principalmente a duas conjunturas históricas: às investidas e ocupações holandesas seiscentistas e à abertura dos portos e a modernização do Império do Brasil que se seguiu. Os cachimbos da ocupação batava do século XVII foram discutidos aqui como símbolos militar-nacionalistas de um elemento exógeno, que nunca se integraria de fato à sociedade brasileira. Já os do século XIX, evidenciam uma tentativa de pouco sucesso de penetração desse item no território. Entre essas duas amplas conjunturas, intercalaram-se outros cachimbos, também identificados em regiões litorâneas e portuárias, onde circulavam marinheiros, mercadores, soldados, estivadores e outros trabalhadores do mar. Considerando os contextos de identificação dos acervos robustos de cachimbos de caulim, penso que eles recorrentemente estão associados a grupo estrangeiros ou a luso-brasileiros em contato frequente e direto com eles: em um primeiro momento, os holandeses, e num segundo, comerciantes e trabalhadores do mar.