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D. Manuel de Aguiar nasceu em Évora a 8 de Dezembro de 1751. Depois dos estudos elementares em Évora, passou à Universidade de Coimbra, em 1772. Em 23 de Março de 1776, provavelmente em Coimbra, recebeu a prima tonsura, as ordens menores... more
D. Manuel de Aguiar nasceu em Évora a 8 de Dezembro de 1751. Depois dos estudos elementares em Évora, passou à Universidade de Coimbra, em 1772. Em 23 de Março de 1776, provavelmente em Coimbra, recebeu a prima tonsura, as ordens menores e a de subdiácono. E em 13 de Julho de 1778 foi-lhe outorgado, «no meio dos aplausos e admiração gerais,
o grau de doutor na sagrada teologia, com as insígnias e condecorações académicas que lhe são inerentes».
Terminados os estudos em Coimbra, regressou a Évora onde terá tomado as ordens de diácono e de presbítero. Com a vaga aberta na abadia de Santa Cruz do Douro, no concelho de Baião, Bispado do Porto, foi ali apresentado em finais de 1779 e ali permaneceu até 1885, tendo sido depois transferido para S. Martinho de Soalhães, no Marco de Canaveses.
Com a morte do Bispo de Leiria, D. Lourenço de Lencastre (4 de
Março de 1790), vagou a Sé de Leiria. A Rainha D. Maria I indicou então o nome de D. Manuel de Aguiar para lhe suceder. O aviso régio de apresentação é de 20 de Março de 1790. Foi confirmado logo a 21 de Junho, sagrado a 15 de Agosto, em Lisboa, e fez a sua entrada solene na cidade de Leiria em 31 de Agosto de 1790. Tinha 39 anos.
Enquanto Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Leiria, cargo que aceitou assim que entrou na Diocese, D. Manuel de Aguiar logo providenciou melhores condições de saúde, promovendo a construção de um novo Hospital no local onde existia a capela dos Anjos, que foi demolida. As obras começaram em Dezembro de 1798, e em Junho de 1800 o Hospital já entrou em funcionamento:
«Chegado que foi o dia 8 de Junho de 1800, pela manhã, a hora competente, depois de preparados e dispostos os pobres doentes, que se achavam no Hospital velho, viram os habitantes desta Cidade, cheios de pasmo e admiração, o acto da mais rara e ardente caridade, praticado pelo dito Ex.mo
Bispo, conduzindo ele mesmo na sua carruagem, e à sua direita, um pobre doente do velho ao novo Hospital, por cada uma das vezes que repetiu este acto, cujo exemplo tão digno de imitar-se seguiram algumas pessoas pias, e irmãos da Casa, conduzindo também alguns doentes em outras carruagens
da Cidade, que para este fim de boa vontade se prestaram.»
Segundo o P. Inácio José de Matos, responsável pela 2.ª edição do Couseiro, D. Manuel de Aguiar «sagrou a sé, a 24 de Julho de 1791; edificou o cemitério da mesma sé, que também sagrou em 4 de Novembro de 1798; mais edificou o hospital, que se começou em Dezembro de 1798 e se abriu ao uso no dia 8 de Junho de 1800; mandou fundir, em 1801, os 8 sinos que tem a torre, excepto o 7.º ou o abaixo do maior; restaurou o (…) seminário episcopal, cuja obra se principiou no ano de 1803 e acabou em Novembro de 1804; e o consertou à sua custa depois da invasão francesa; também fundou o seminário ou colégio de meninas, junto ao Recolhimento, cujas aulas
foram abertas no [ano] de 1803».
D. Manuel de Aguiar era justamente o Bispo de Leiria no período das invasões francesas (1807-1811). Com a 3.ª invasão, o prelado foi mesmo obrigado a fugir para Lisboa. Diz o mesmo editor do Couseiro que, mal os franceses debandaram, o Bispo «voltou à diocese, entrando em Aljubarrota no dia 2 de Abril de 1811; porque o paço episcopal tinha sido queimado, se
foi alojar nas Cortes, em umas casas pertencentes à igreja, enquanto no seminário episcopal, que também tinha sofrido grande estrago, principalmente nas madeiras, durante a mesma invasão, se lhe consertava um quarto e a ele se recolheu no dia 10 de Agosto deste mesmo ano». «E aos três quartos para as sete horas da tarde do dia 19 de Março de
1815, aí mesmo [no seminário] entregou a sua alma a Deus este tão virtuoso e digno prelado!» Os seus restos mortais, transferidos da cripta dos Prelados do antigo cemitério, por si fundado, encontram-se no transepto norte da Sé catedral de Leiria, assinalados com uma enorme lápide funerária.
É sobre esta vida odisseica de uma homem dinâmico e com uma grande visão humanística que trata o livro que agora se apresenta em 2.ª edição ou em edição fac-similada da 1.ª, de 1885, publicado sem a indicação expressa do autor ou somente com a indicação “Um filho da extincta Diocese”,
que se sabe ser o Dr. Vitorino da Silva Araújo, então professor do antigo Liceu de Leiria.
Mas em 1884 ele já estava editado ou, pelo menos, já se divulgava em Leiria a sua edição. No jornal “O Districto de Leiria”, n.º 119, de 6-7-1884 (Domingo), na pág. 2, coluna 3, lê-se: «Temos em nosso poder um prospecto que nos foi enviado pelo correio, no qual se noticia a publicação
recente de um livro que para os Leirienses, deve ser de elevado interesse, pois que deve elle tratar da vida de um varão illustre, a quem a nossa cidade muito deve e de quem fallam bem alto os estabelecimentos de caridade e d’instrucção que hoje ahi se observam.// Terá o livro a que nos referimos o titulo de – Um Bispo segundo Deus ou memorias para a vida de D. Manuel d’Aguiar, – 17º Bispo de Leiria./ Coligidas e coordenadas, e agora dadas á estampa por um filho da extincta diocese.// Por nos faltar o espaço não publicamos na integra o prospecto a que nos referimos, e por isso só diremos que este precioso livro deve custar por assignatura 600 réis, e que todo aquelle que se responsabilisar por 10 assignaturas tem um exemplar
gratis.// A correspondência deverá ser dirigida ao editor, José Joaquim dos Reis Leitão, rua do Norte n.º 6 – Coimbra.»
Uns anos mais tarde, no mesmo jornal, na edição n.º 489, de 8-8--1891, pág. 3, col. 2, lê-se: «Sepultou-se hontem [7 de Agosto] o sr. Victorino da Silva Araujo, professor jubilado d’esta cidade./ Era um virtuoso velho./ Paz á sua alma.»
Para além da edição fac-similada integral do livro “Um Bispo segundo Deus”, tomámos a liberdade de inserir um conjunto de anexos que poderão ajudar os leitores e os investigadores a contextualizar o livro e/ou a esclarecer algumas dúvidas.
Antes de mais, o fac-simile da “Memória Biográfica do Exm.º D. Manuel de Aguiar”, publicada no “Jornal de Coimbra”, n.º XLIV, em 1816, pouco tempo depois da morte do Prelado e atribuída ao Padre Manuel Xavier de Sousa.
Depois, o fac-simile da “Oração Fúnebre”, recitada por Frei Fortunato de S. Boaventura «nas solenes exéquias do Excelentíssimo Senhor D. Manuel de Aguiar, Bispo de Leiria”, com data de impressão de 1820.
Um anexo extenso é aquele que denominámos “Comentários sobre Vitorino da Silva Araújo”, feitos pelo Padre Inácio José de Matos no Apêndice à 2.ª edição do Couseiro (1898) e em diversas notas daquele documento, de alguma forma corrigindo ou contestando algumas informações ou considerações de Vitorino da Silva Araújo sobre D. Manuel de Aguiar ou sobre alguns aspectos da história da região.
Terminamos com a biografia do autor, num texto do Padre José Fernandes de Almeida com o título “Vitorino da Silva Araújo, um ilustre leiriense”, e “Outros elementos sobre Vitorino da Silva Araújo”, da lavra do editor.
O nosso desejo é que os interessados possam finalmente ter acesso a uma obra de manifesta importância para a Diocese e região de Leiria, passando a dispor de um conjunto de informações essenciais, não só com base na biografia estabelecida por Vitorino, mas também nos anexos que
agora inserimos e que acreditamos oportunos quando se procede à reedição de um trabalho com a dimensão historiográfica destas “Memórias para a Vida de D. Manuel de Aguiar”.
Sendo uma co-edição da Textiverso e da Santa Casa da Misericórdia de Leiria, a sua importância avulta ainda mais na altura em que se evocam os 200 anos do falecimento do Prelado e memorável Provedor da Instituição a quem deixou um Hospital ainda hoje emblemático na cidade e marco
incontornável da vida na região.
Carlos Fernandes (editor)