Improbidade Administrativa Research Papers - Academia.edu (original) (raw)

A bandeira do combate à corrupção no Brasil se tornou justificativa para uma série de mudanças no funcionamento das instituições e, por conta disto, o tema ganhou papel de destaque nos debates jurídicos da última década. De críticos a... more

A bandeira do combate à corrupção no Brasil se tornou justificativa para uma série de mudanças no funcionamento das instituições e, por conta disto, o tema ganhou papel de destaque nos debates jurídicos da última década. De críticos a entusiastas, várias foram as perspectivas utilizadas para analisar o novo paradigma que se instituiu na prática jurídica do Brasil. Este novo paradigma se funda em mudanças legislativas e alterações interpretativas de dispositivos já presentes no ordenamento jurídico. A reformulação do modo como o Direito tem sido aplicado perpassa por um crescente peso da valoração das consequências esperadas da decisão enquanto fundamento jurídico das mesmas. Entretanto, o exercício de decidir em busca do melhor futuro coloca uma série de problemas conceituais e de compatibilidade da jurisdição com valores democráticos dentro de um Estado de Direito. Questiona-se, por exemplo, se a abordagem consequencialista representa um extrapolamento da legalidade ou tão somente uma forma de conferir significado ao texto normativo. Além disso, é preciso refletir se os juízes têm alguma legitimidade para propor quais consequências o sistema jurídico deve buscar, e em quais condições é possível afirmar com segurança que as consequências desejáveis serão produzidas.
A partir de tais indagamentos, este artigo tem por objetivo analisar o seguinte problema: qual a relação entre consequencialismo jurídico e o moralismo que fundamenta o combate à corrupção no discurso jurídico brasileiro? A problemática se insere no debate sobre meios e fins na aplicação do Direito, uma vez que, a partir de uma retórica consequencialista, os resultados esperados de uma determinada decisão podem ser utilizados para relativizar garantias processuais instituídas pelo Direito. Para tanto, busca-se, no primeiro capítulo, verificar as possibilidades na construção de uma concepção jurídica a respeito da função das consequências na fundamentação decisória, isto é, como se pode construir um consequencialismo jurídico, propriamente dito. Esse exploramento conceitual é realizado junto à análise dos potenciais problemas da abordagem consequencialista e dos riscos que sua aplicação ocasiona à coerência do sistema jurídico, à proteção de direitos fundamentais e à segurança jurídica. Parte-se do debate entre pragmatismo e integridade realizado entre Richard Posner e Ronald Dworkin, objetivando situar os problemas relacionados ao consequencialismo para, a partir disso, propor uma reflexão contemporânea sobre o tema. Tendo por escopo contextualizar o consequencialismo no combate à corrupção, em seguida, no segundo capítulo, aborda-se a problemática em torno do conceito de corrupção, suas consequências para o sistema político dos países e os mecanismos jurídicos de combate no ordenamento jurídico brasileiro. Tal investigação é imprescindível, na medida em que a corrupção é um fenômeno de difícil conceituação, pois as práticas que a caracterizam se alteram com o passar do tempo e dependem do contexto no qual são realizadas. Esta mutabilidade permite que o fenômeno seja trabalhado sob recortes epistemológicos distintos, tais como o dogmático, sociológico, criminológico, antropológico, moral, culturalista e político.
Por fim, a partir da compreensão sobre algumas formas pelas quais o combate à corrupção pode ser realizado, apresenta-se, no último capítulo, de que modo o consequencialismo jurídico está presente no combate repressivo à corrupção, destacando-se que as consequências valoradas pelos magistrados estão relacionadas a preocupações morais, em detrimento da lógica instituída pela Constituição Federal de 1988. Decisões recentes evidenciam o argumento apontado, demonstrando a presença da retórica moralista no momento de se definir quais consequências são almejadas e quais medidas devem ser tomadas para tanto.