Matheus de Brito | UERJ - Universidade do Estado do Rio de Janeiro / Rio de Janeiro State University (original) (raw)
Papers by Matheus de Brito
Letras (Santa Maria), 2022
Abstract: This paper presents a brief ad hoc typology of uses through which we can think the prob... more Abstract: This paper presents a brief ad hoc typology of uses through which we can think the problem of imitation in the work of Luís de Camões, and which can be applied to other poems made under this rhetorical-poetic principle. Three forms are to be considered here: the imitation or emulation of textual models; the citation and allusion; and, finally, the resort to commonplaces. These are techniques of a discursive practice that establish a historical continuity through the reformulation of a previous model text or inflection of a topic stemming from the tradition, and that also produces the expectation of a future elaboration. Keywords: Imitation; 16th
Century; Camonian Studies; Topic
*
Resumo: Este artigo sugere uma breve tipologia ad hoc de usos a partir dos quais pensar a problemática da imitação na obra Rimas de Luís de Camões, passível de extensão a demais poemas construídos sob esse princípio retórico- poético. São três as formas aqui consideradas: a imitação ou emulação de modelos textuais; a citação e a alusão; e, por fim, o recurso aos lugares-comuns. Trata-se de técnicas de uma prática discursiva que estabelece uma continuidade histórica através da reformulação do texto-modelo prévio ou inflexão de um tópico da tradição, e que igualmente engendra uma expectativa de futura elaboração. Palavras-chave: Imitação; Século XVI; Estudos Camonianos; Tópica
*
DE BRITO, Matheus. A imitatio Camoniana, uma tipologia. Letras (Santa Maria), v. 32, n. 65, p. 146–162, 2022.
Literatura: teoría, historia, crítica, 2023
DE BRITO, Matheus. O ethos do dissídio na obra de Camões, o poema como argumento. Literatura: teo... more DE BRITO, Matheus. O ethos do dissídio na obra de Camões, o poema como argumento. Literatura: teoría, historia, crítica, v. 25, n. 1, p. 41–71, 2023.
Para entender Camões e a poesia lírica ibérica do século xvi é indispensável compreender o espaço moral-retórico que organiza cada poema enquanto ato comunicativo. Uma importante contribuição para essa tarefa reside na observação dos textos não literários que assinalam operadores culturais do período. Este artigo começa discutindo uma preceptiva retórica que pode iluminar algumas questões de interesse para o discurso poético, especialmente seu propósito, para avaliar alguns aspectos argumentativos da poesia de Camões, explorando o horizonte no qual se configura uma persona lírica a partir de um ethos. A reflexão aqui proposta pretende avançar em um capítulo da história literária, bem como levantar alguns problemas teóricos. Palavras-chave: poesia lírica; século xvi; estudos camonianos; ethos; estudos de tópica poética.
Terceira Margem, 2021
ABSTRACT: The aim of this study is to examine the current state of art in Camonian studies. The f... more ABSTRACT: The aim of this study is to examine the current state of art in Camonian studies. The first part relates the critique of historiography to the relativization of the author figure, as well as to the cultural identity forged around Camões. In the second part, we aim to grasp some disciplinary stages of Camonology and to outline some of its recent achievements. In the third, we briefly discuss some cognitive purposes within Camões studies today.
::
RESUMO: Este artigo consiste numa revisão bibliográfica dos estudos camonianos. Na primeira parte, articulamos a crítica da historiografia à relativização da figura autoral, como também à identidade cultural forjada à volta de Camões. Na segunda, procuramos pensar algumas fases disciplinares da camonologia e delinear alguns de seus recentes resultados. Já na terceira, a modo de sumário, discutimos alguns propósitos ou interesses cognitivos hoje presentes nos estudos camonianos.
Conferências do Cinquentenário da Teoria da Literatura de Vítor Aguiar e Silva, 2020
DE BRITO, Matheus. Algumas coordenadas epistemológicas da obra de Aguiar e Silva. In: Osvaldo Man... more DE BRITO, Matheus. Algumas coordenadas epistemológicas da obra de Aguiar e Silva. In: Osvaldo Manuel Silvestre; Rita Patrício. (Org.). Conferências do Cinquentenário da Teoria da Literatura de Vítor Aguiar e Silva. 1ed.Braga: Uminho Editora, 2020, p. 67-88.
Trabalho em que se sedimentam estratos conceituais da mais recente história dos estudos literários e das Humanidades, o Teoria da Literatura de Aguiar e Silva situa-se a um só tempo num ponto de viragem – aquele relativamente aos estudos literários que hoje designaríamos “pré-teóricos” – e através de diversas vagas teórico-críticas, com as quais se viu obrigada a negociar. Concebido a partir da década de 1960, quando o lugar da Literatura era já institucionalmente garantido e a disciplina da Teoria já prevista em muitos curricula, as transformações por que o livro passaria refletem não tanto a necessidade de pensar mudanças efetivas do conceito de literatura ou de obra literária, bastante estáveis desde o século XIX, mas de responder às reconfigurações institucionais intencionadas ou levadas a cabo junto ao discurso da crítica no último quartel do século. É o caso da tensão entre o conceito referencial e o conceito intencional de literatura, que em si registra uma dessas reconfigurações, mas que nunca aparece por um prisma institucional nas suas manifestações no conjunto da obra de Aguiar e Silva. Essa tensão entre o intencional e o referencial, configurando diversos pares oposicionais – história e sistema, objeto empírico e epistêmico, particular ou transtemporal, &c. – que estruturam o Teoria da Literatura, desenrola-se sobre um plano ético e epistemológico determinado, não diretamente visível, e cuja validade em parte se limita a esses conflitos particulares. Nesse sentido, se se pode dizer que amadureceu ao longo de suas edições, também se pode dizer que algo nele envelheceu, que algo venceu a prazo.
Mas não se implica assim que o trabalho mantenha sua atualidade “apesar” de algumas ideias residuais, antes, pelo contrário, que hoje é de maior pertinência epistemocrítica precisamente aquilo que conflita com certo senso comum dos estudos literários. Por que desistimos da legitimação científica? Em que medida a deseticização do estudo, perpetrada pelo avanço da reflexão dita “teórica”, não favoreceu a injeção de temas políticos e mesmo a arregimentação, algo aporética, da literatura por interesses sociais difusos? Partindo de alguns de seus trabalhos, começaremos por abordar brevemente alguns nexos da ideia de literatura na teoria de Aguiar e Silva, com especial atenção ao motivo, que lhe é caro, das litterae humaniores; de seguida, deter-nos-emos sobre sua discussão dum conceito referencial de literatura e à constante (e epifonemática) preocupação com a “teoria científica da literatura”; por fim, rearticularemos as nossas considerações, imaginando quais seriam as suas intervenções no atual quadro da reflexão teórico-crítica sobre Literatura. Mais do que uma obra sobre literatura, e em verdade sobre o próprio discurso teórico, suas diversas fases permitem prismar todo o campo de objetos e interesses cujos conflitos em grande medida determinam o estado atual – e potencialmente alguns estados futuros – do estudo da literatura.
Remate de Males, 2019
Abstract: To read Camões’ poetry as if it were a discursive act similar to the contemporary “lite... more Abstract: To read Camões’ poetry as if it were a discursive act similar to the contemporary “literature” is somewhat anachronistic. This epistemic limitation feeds on the lack of a strong counter-concept. The attempt to compensate for the pragmatic defectiveness of written communication through the hermeneutical filling of historical gaps is also an ungrateful task, for it submits all of its findings to the rule of current literary studies, their theoretical as well as institutional inertia. Not only that, but also Camões’ very work seem to “require” not to be confused among others: it accuses the lyrical poets of being “sophists”, in the well-known “Sôbolos rios que vão”; it mocks, through Duriano’s speech, a platonic “love fine like a melon” to which the passionate Filodemo gave himself; in the ridiculous figure of the unhappy Satyre, it represents the despair of love as a “depiction” of what “roughness and savage science had taught him.” These figures become all the more important when we intend to conceive the ethic-rhetorical coordinates of poetic writing in the 16th Century. Our article poses some questions around this “Anti-literary Camões” as a small contribution to the reconstruction of the pragmatic space of his poetry, perhaps also applicable to pre-bourgeois poetry in general.Keywords: Lyric Poetry; Topic; Rhetorics.
::
Resumo: É algo anacrônico ler a lírica de Camões como se fosse um ato discursivo afim à contemporânea "literatura". Essa limitação epistêmica se nutre da ausência de um "contraconceito" rigoroso. Corrigir a defectividade pragmática da escrita por meio do preenchimento hermenêutico de lacunas históricas é uma tarefa ingrata, pois tudo submete à regra dos atuais estudos literários, suas inércias teórico-institucionais. Não bastasse isso, a própria obra camoniana em diversos passos exprime um non confundar: acusa, nas conhecidas redondilhas "Sôbolos rios que vão", os poetas que cantaram o amor profano de "sofistas"; ironiza, na boca dum Duriano, o "amor fino como melão" a que o apaixonado Filodemo se entregava; representa, na figura ridícula do infeliz sátiro da égloga, o desespero amoroso como "imaginação" do que "a rudeza e a ciência agreste lhe ensinara". Essas figuras ganham importância quando reimaginamos as coordenadas ético-retóricas da escrita de Quinhentos. Nosso trabalho propõe algumas questões à volta desse "Camões antiliteratura" como pequena contribuição para a reconstrução do espaço pragmático de sua obra, aplicável talvez à poesia pré-burguesa.
Palavras-chave: poesia lírica; tópica; Retórica.
Diacrítica, 2020
The article discusses the Song (cansó, canzone, canción, canção) as a genre within a historical... more The article discusses the Song (cansó, canzone, canción, canção) as a genre within a historical framework. This task demands an approach from Rhetorics, as well as from Theory and History of written media, and Literary History. Through the comparison of tornadas or commiati in a chronological order, we can see how this structure progressively acquires the role of stabilizing a moral content rhetorically suitable to the genre, and how this orientation towards ‘textual semantics’ is later displaced and leads to the undermining of that moral purport, thus making the tornada a specific index to the historical pragmatics of poetry writing. In the last part, this article focus mainly on Luís de Camões’ tornadas, especially the way how his Songs enact this displacement.
Keywords: Canção. Literary History. Camonian Studies.
COLÓQUIO/Letras, 2019
To discuss Camões in Brazil means dealing with a complex web of cultural agency. It would be poss... more To discuss Camões in Brazil means dealing with a complex web of cultural agency. It would be possible to address Camões inside and outside specific circles of readership, such as the Luso-Brazilians from the nineteenth century or Brazilian Northeast folk culture, "a" Camões between the Lusophiles and Lusophobes in Brazilian Modernism, or one disputed by scholars and another, non-institutional one - a Camões, in short, always understood as part of an argument and received through processes of capillarization and cultural differentiation. Recent Brazilian literary studies have developed particular cognitive aims, which do not stem from a national grid imposed upon the poet's work, but instead, as if from the outside, from the emergency of new problems, thus assisting Camonian studies. This article briefly presents an overview of those, paying special attention to in progress research and its theoretical perspectives.
Discutir Camões no Brasil significa lidar com uma complexa rede de agências culturais. Seria possível abordar Camões dentro e fora de círculos específicos de leitores, como os luso-brasileiros do século XIX ou a cultura popular nordestina brasileira, "um" Camões entre lusófobos e lusófobos no modernismo brasileiro, ou um disputado por estudiosos e outro, não institucional - um Camões, em suma, sempre entendido como parte de um argumento e recebido através de processos de capilarização e diferenciação cultural. Recentes estudos literários brasileiros têm desenvolvido objetivos cognitivos particulares, que não decorrem de uma grade nacional posta sobre a obra do poeta, mas sim, como que de fora, da emergência de novos problemas, que assim integram os estudos camonianos. Este artigo apresenta brevemente uma visão geral dessas questões, dando especial atenção à pesquisa em andamento e às suas perspectivas teóricas.
Revista Letras
This paper is about the theoretical-critical implications of the renewal of rhetoric studies, wit... more This paper is about the theoretical-critical implications of the renewal of rhetoric studies, with special attention to the studies of Hansen, Pécora, Muhana, Alves and Pereira. In the first part, we discuss the limitation of literary categories when ít comes to dealing with texts prior to the “theoretical” concept of literature. In the second part, we draw a few thoughts towards a study model that should meet the cognitive imperative of periodological discrimination without falling into those epistemic limitations. What is intended is the possibility of periodization within a rhetorical framework, ultimately aiming at the idea of “ethical-rhetorical space” as a periodological tool.
::
O artigo trata das implicações teórico-críticas da renovação dos estudos de retórica, com atenção para os estudos de João Hansen, Alcir Pécora, Adma Muhana, Hélio Alves e Belmiro Pereira. Numa primeira parte, discutimos esquematicamente a limitação das categorias literárias para abordagem de textos anteriores ao conceito “teórico” de literatura; numa segunda, fazemos observações para um modelo de estudo que atenda ao imperativo cognitivo da discriminação de períodos e que não recaia naquelas limitações epistêmicas. Trata-se de pensar a possibilidade de periodizar a partir dos estudos de retórica, tomando por horizonte a elaboração de uma ideia de “espaço ético-retórico” como ferramenta periodológica. (Projeto Fapesp No. 2017/11260-4.)
Alea, 2019
Aguiar e Silva's Teoria da Literatura has been a reference for many generations of literary resea... more Aguiar e Silva's Teoria da Literatura has been a reference for many generations of literary researchers. Departing from old scholarly models, this work seems however torn between its properly theoretical interests, which are potentially universal and explanation-based, and the imperative to understand its object in a strict adherence to its historical character. The work strived to reconcile incompatible disciplinary premises, affording to do so in an institutional framework that recently underwent deep transformations. These concerned both the cognitive purposes and the means through which Literature is studied. Nevertheless, understanding how the theoretical matrix of this investigation was brought about is important if we intend to grasp the possibilities that it might still offer for Literary Studies. This article addresses the concept of “literature” employed in this model of History, theorized in Aguiar e Silva’s textbook. We also discuss the search of alternatives to the current periodological catalog, especially concerning the author’s doctoral thesis on Mannerism and Baroque.
::::
Teoria da Literatura de Aguiar e Silva (2011 [1973]) foi referência para gerações de pesquisadores em Portugal e Brasil. Afastando-se de antigos modelos, a obra surge dividida entre interesses propriamente teóricos, universais e de caráter explicativo, e o imperativo à compreensão historicamente ancorada do objeto. A fundamentação que aí se oferece para o programa disciplinar da História Literária esforça-se por conciliar premissas disciplinares diversas e fá-lo num quadro institucional particular, hoje diferente no tocante quer aos interesses cognitivos quer aos meios disponíveis para a investigação. Entender como se engendrou a matriz teórica desse programa é importante para pensar as possibilidades que a História Literária oferece para as Letras. Este artigo dedica-se ao conceito do literário implicado nesse modelo de História de que a Teoria da Literatura partilha e que assenta. Também procuramos justificar a busca por alternativas ao catálogo periodológico, especialmente respeitante à tese do autor sobre Maneirismo e barroco (1971).
::
Teoría de la Literatura de Aguiar e Silva fue referencia para generaciones de investigadores de literatura. Alejándose de viejos modelos académicos, esta obra parece dividida entre sus propios intereses teóricos, potencialmente universales y visando la explicación, y el imperativo de comprender su objeto históricamente. El trabajo se esfuerza por conciliar premisas disciplinarias incompatibles, en una situación institucional que recientemente sufrió varias transformaciones, tanto en sus propósitos cognitivos como en los medios a través de los cuales se estudia la literatura. Entender cómo se engendró la matriz teórica de ese programa es importante para pensar las posibilidades que la Historia Literaria aún ofrece para las Letras. Este artículo se dedica al concepto de literatura implicado en ese modelo de Historia teorizado por Aguiar e Silva. También intentamos justificar la búsqueda por alternativas al catálogo periodológico, especialmente concerniente a la tesis del autor sobre Maneirismo e Barroco.
Revista da Anpoll nº 43, 2017
Trata-se da tradução da conferência de abertura do XXXI Encontro Nacional da ANPOLL, pronunciada ... more Trata-se da tradução da conferência de abertura do XXXI Encontro Nacional da ANPOLL, pronunciada pelo Professor Doutor Suman Gupta (Open University) em 29 de julho de 2016 no Centro de Conferências da Universidade Estadual de Campinas. Gupta discute a herança filológica como horizonte das práticas acadêmicas correntes nos estudos literários, suas transformações e possibilidades de renovação.
Literatura: teoría, historia, crítica, 2018
Literatura: teoría, historia, crítica DOI: https://doi.org/10.15446/lthc.v20n2.70501 Lit. Teo... more Literatura: teoría, historia, crítica
DOI: https://doi.org/10.15446/lthc.v20n2.70501
Lit. Teor. Hist. Crít., Volumen 20, Número 2, p. 85-102, 2018. ISSN electrónico 2256-5450. ISSN impreso 0123-5931.
Para uma teoria da burrice
Toward a Theory of Stupidity
Hacia una teoría de la estupidez
Matheus de Brito
Texto completo:
PDF (Português (Brasil))
Bookmark and Share
Resumen (pt_BR)
Este artigo pensa as condições da burrice como um estado de coisas e um processo, os quais estão associados, como tratamos na primeira parte do texto, a um quadro institucional que não consegue ou prefere não dar uma resposta teórica adequada ao que poderíamos chamar, frouxamente, de “epistemologia naturalizada”, no sentido de “natural ao capitalismo tardio”, e que será o tema da segunda parte. Na terceira, pensaremos como essa burrice sistematicamente produzida, por sua vez, está intrinsecamente associada à própria concepção dos objetos de estudo e de crítica literária
Palabras clave (pt_BR)
estudos literários; anti-intelectualismo; crítica; teoria; discurso.
Resumen (en_US)
The first part of the article discusses stupidity as a state of things and processes associated with an institutional framework that fails to or prefers not to provide an adequate theoretical response to what we could loosely call “naturalized epistemology”, in the sense of “natural to late capitalism”, which is dealt with in the second section. In the third part, we reflect on the way this systematically produced stupidity is, at the same time, intrinsically related to the very conception of the objects of study and of literary criticism.
Palabras clave (en_US)
literary studies; anti-intellectualism; criticism; theory; discourse.
Resumen (es_ES)
El artículo se ocupa de las condiciones de la estupidez como un estado de cosas y procesos que están asociados, como tratamos en el primer apartado del texto, a un marco institucional que no logra o prefiere no dar una respuesta teórica adecuada a lo que podríamos llamar, laxamente, “epistemología naturalizada”, en el sentido de “natural al capitalismo tardío”, de la que se ocupa la segunda parte. En la tercera, pensaremos cómo esta estupidez sistemáticamente producida, a su vez, está intrínsecamente asociada a la propia concepción de los objetos de estudio y de crítica literaria.
Palabras clave (es_ES)
estudios literarios; antintelectualismo; crítica; teoría; discurso.
: :
Vou propor aqui uma ou duas narrativas para como a burrice virou teoria, virtude ou práxis teórica. Em sua versão mais próxima à crônica disciplinar, que é patente na expressão “teoria da literatura”, teríamos primeiro a literatura, um corpo de textos ligados a alguns grupos humanos, e só então passaríamos à sua incorporação ao espaço acadêmico – isto é, primeiro circulam uma variedade de objetos que levam o nome de literatura e então se constrói uma disciplina teórica e métodos de estudo em torno dessa coisa literatura. A falha desse retrato é não dar conta – tal como acontece ao que se pretende fora da burrice – das inércias que constituem a própria posição enunciativa. Falta-lhe não algum dado histórico, mas consciência das implicações. A segunda narrativa põe as implicações à vista, partindo do processo: primeiro se concebe um modelo normativo de “ciência”, a partir do qual se propõe um programa de formalização específico sob o nome de “literatura”, e esse conceito formal de literatura é preenchido por uma série de coisas que são de interesse para o conhecimento humanístico, mas que são conceitualmente estropiadas para caber na designação “conhecimento literário”. De seguida, o consenso parte de premissas mais ou menos concordantes com o espírito da formalização e, no plano mais amplo do discurso, funde o caráter estropiado do objeto teórico ao caráter estropiado dos homens reais . O método empobrece – lamentação conhecida –, o discurso legitima o estado de coisas.
STUDIA UBB PHILOLOHIA, 2017
Camões and the Civilization of Commerce | Camões și civilizația comerțului | Abstract: This pa... more Camões and the Civilization of Commerce | Camões și civilizația comerțului |
Abstract: This paper compares Os Lusíadas and William J. Mickle’s The Lusiad; Or, the Discovery of India (1776), intending to approach the process of actualization of meaning which led Camões’ poem to be regarded as the “Epic of Commerce.” In the first part, we briefly present some discursive features that both resist and afford this change of meaning. In the second part, we address some properties of Mickle’s book. Finally, we pose a theoretical-historiographic question concerning Camonian studies.
Keywords: Literature. Translation. History. Criticism. XVI Century. Portugal. Camonian Studies.
Resumé: Cet article compare Os Lusíadas et The Lusiad; Or, the Discovery of India (1776) de William Mickle, dans le but d’aborder le processus d’actualisation du sens qui a permis de comprendre le poème de Camões comme “l’Épopée du Commerce.” La première partie fait ressortir sommairement quelques caractéristiques discursives qui résistent et à la fois se prêtent à ce changement du sens. Dans la deuxième partie, on aborde quelques propriétés du livre de Mickle. À la fin, on propose une question théorique et historiographique pour les études camoniennes.
Mots clés: Littérature. Traduction. Histoire. Critique. XVI siècle. Portugal. Études camoniennes.
Rezumat: Camões și civilizația comerțului. Acest articol compară Os Lusíadas și The Lusiad; Or, the Discovery of India (1776) de William Mickle, cu scopul de a aborda procesul de actualizare a sensului care a permit înțelegerea poemului camonian ca o „epopee a comerțului”. În prima parte, prezentăm sumar câteva caracteristici discursive care se opun, dar în același timp permit această schimbare de sens. În partea a doua, ne aplecăm asupra câtorva trăsături ale cărții lui Mickle. În final, adresăm o întrebare teoretic și istoriografică pentru studiile camoniene.
Cuvinte cheie: Literatură. Traducere. Istorie. Critico. secolul al XVI-lea. Portugalia. studii camoniene.
: : http://www.studia.ubbcluj.ro/arhiva/abstract_en.php?editie=PHILOLOGIA&nr=4&an=2017&id_art=15619
: : http://www.studia.ubbcluj.ro/arhiva/cuprins_en.php?id_editie=1122&serie=PHILOLOGIA&nr=4&an=2017
A comunicação trata dalguns eixos dos estudos camonianos, considerando o modo como questões histó... more A comunicação trata dalguns eixos dos estudos camonianos, considerando o modo como questões históricas, teóricas e historiográficas se entretecem ao conteúdo experiencial da obra de Luís de Camões. Nesse ínterim, discutem-se (1) as motivações históricas e intrainstitucionais que levaram a sucessivas e não raro incompatíveis abordagens da obra do poeta, bem como (2) o estado atual de sua crítica relativamente à teoria literária e à fundamentação teórica da periodologia literária. O trabalho também em parte consiste numa apresentação breve dalgumas linhas fundamentais do projeto de investigação pós-doutoral “O ethos do dissídio na lírica camoniana” (IEL/Unicamp - FAPESP 2017/11260-4).
CO-AUTHOR Manuel Portela (UC) Almost three decades ago, Jerome McGann stated that if the Humanit... more CO-AUTHOR Manuel Portela (UC)
Almost three decades ago, Jerome McGann stated that if the Humanities were facing a crisis, it did not concern propositions on literary artifacts but our scholarly practices (1988). Attentive to these, he helped to bring them to the forefront of discussion in both textual scholarship and literary criticism. This work was not solely theoretical, but it was solidly built upon his long-time experience, first, as print editor of Byron’s works (1980-1993), and, later, as hypermedia editor of the Rossetti Archive (1993–2008; http://www.rossettiarchive.org/). Equally important for the development of his thought have been his teaching career as John Stewart Bryan Professor at the University of Virginia (1986–), and his many institutional appointments.
Changes brought about by digital textuality upon the modes of production and circulation of both literary works and scholarly discourses led him to publish one of the most seminal essays for rethinking the technologies and forms of the book in hypermedia environments (“The Rationale of Hypertext”, written in 1995). Distinguished scholar and critic, McGann soon became widely acknowledged for his interventions on the Digital Humanitiesdebates, for which his fifteen-year old Radiant Textuality: Literature After the World Wide Web (2001) is a sort of “classic”. He has recently published A New Republic of Letters: Memory and Scholarship in the Age of Digital Reproduction (2014), gathering essays that follow from his pioneering book on the matter. From Blake to Byron, from Dickinson to Drucker, from social text to online scholarship, his groundbreaking combination of philological investigation and philosophical provocation has resulted in textual artifacts and conceptual models that continue to resonate as we plunge deeper and deeper into the regime of computation.
McGann’s editorial and theoretical work on the social and bibliographic dimensions of textual events has been at the core of the Materialities of Literature PhD Program at the University of Coimbra. Focusing mostly on McGann’s recent work, our interview addresses the reasons underlying his critical moves, and looks at his scholarly poetics of interpretation as a material engagement with imaginative works.
\\\
Centrando-se em obras recentes de McGann, esta entrevista aborda as razões subjacentes à sua perspetiva crítica, e analisa a sua poética da interpretação como uma interrogação material das criações da imaginação.
Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary stu... more Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary studies in Brazil, meaning took a sense utterly semiotic. To speak of meaning is thus equivalent to think of sign. However, unlike "referent", for instance, which immediately invokes a linguistic context, meaning can be thought of in other ways. The persistence of the semiotic model, its mindset as well as its jargon, is the basis of several problems concerning the current brazilian literary studies. Another account of meaning and a different conceptual attitude towards the literary work of art may provide solutions to many of these problems.
//
Devido a especificidades que acompanharam a profissionalização e academização dos estudos literários no Brasil, o sentido tomado pela noção de sentido foi quase unanimemente semiótico. Falar de sentido, assim, equivale a pensar em signo. No entanto, diferentemente de “referente”, por exemplo, que imediatamente invoca um contexto linguístico, o sentido pode ser pensado de outras maneiras. A persistência do modelo semiótico, tanto como mentalidade quanto jargão, está na base de vários problemas que marcam os estudos literários brasileiros atuais. Uma outra noção de sentido e uma diferente atitude conceitual em relação à obra literária podem oferecer saídas para muitos desses problemas.
Research Interests:
Critical Theory, Literary Criticism, Literary Theory, Lingüística, and Teoría Literaria
Revista Desenredo, Dec 2014
Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary stu... more Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary studies in Brazil, meaning took a sense utterly semiotic. To speak of meaning is thus equivalent to think of sign. However, unlike "referent", for instance, which immediately invokes a linguistic context, meaning can be thought of in other ways. The persistence of the semiotic model, its mindset as well as its jargon, is the basis of several problems concerning the current brazilian literary studies. Another account of meaning and a different conceptual attitude towards the literary work of art may provide solutions to many of these problems.
//
Devido a especificidades que acompanharam a profissionalização e academização dos estudos literários no Brasil, o sentido tomado pela noção de sentido foi quase unanimemente semiótico. Falar de sentido, assim, equivale a pensar em signo. No entanto, diferentemente de “referente”, por exemplo, que imediatamente invoca um contexto linguístico, o sentido pode ser pensado de outras maneiras. A persistência do modelo semiótico, tanto como mentalidade quanto jargão, está na base de vários problemas que marcam os estudos literários brasileiros atuais. Uma outra noção de sentido e uma diferente atitude conceitual em relação à obra literária podem oferecer saídas para muitos desses problemas.
From its foundation, Literary Theory held with Structuralism some epistemological affinities whic... more From its foundation, Literary Theory held with Structuralism some epistemological affinities which added to the convergence between the critical intention of the former and the analytical method of the latter. If those affinities implied not only the normalization and conceptual demystification of literary discourse during the XXth century, their academic charge coincided with a radical de-aesthecization. The claim to universality, contained in the thoughtless equation of valid knowledge and system of propositions, fostered an objectivity at the expense of the object, in Language and Literature Studies: linguistic definitions concurred to the erasure of the material dimension of the experience of language. Even the post-structuralist criticism maintained the “transcendental impossibility” of the eradicated dimension, as a felix culpa concerning the totalizer claims of science – reversing into a game the very inadequacy between Sign and Referent, Subject and Object. If we’re dealing, however, with an epistemological error – namely, assuming as commensurable the activities of analysis and criticism, the notions of knowledge and truth, of linguistic universal and aesthetic particular –, the critical self-reflection ought to strive to find, in the mutual opposition between the aesthetic and the linguistic discourses, the overcoming of the deficiencies that follow their historical intertwinement. The criticism of the scientific presuppositions shall point to the possibility of a qualitatively irreducible experience, of a full restitution of the object.
//
De sua gênese, a Teoria da Literatura manteve com o Estruturalismo afinidades epistemológicas que subsidiaram a convergência da intenção crítica e do método analítico. Se isso implicou não apenas alguma normalização e a desmistificação conceitual do discurso literário no séc. XX, seu encargo acadêmico coincidiu com uma radical desestetização. A ambição de universalidade contida na equação irrefletida entre conhecimento válido e sistema de proposições teóricas promoveu nas Letras uma objetividade às expensas do objeto: as definições da linguística concorreram para o apagamento da dimensão material da experiência da linguagem. Mesmo a crítica pós-estruturalista se ateve à “impossibilidade transcendental” da dimensão extirpada, na forma de uma felix culpa em relação à pretensão totalizadora da ciência – versando em jogo a inadequação entre signo e referente, sujeito e objeto. Se lidamos, porém, com um erro epistemológico – a saber, triplo: pressupor comensuráveis análise e crítica, saber e verdade, universal linguístico e particular estético –, a autorreflexão crítica deve esforçar-se por encontrar na oposição recíproca entre o discurso linguístico e o estético a superação das insuficiências que acompanham seu entrelaçamento histórico. A crítica aos pressupostos da ciência deve indicar a possibilidade de uma experiência qualitativamente irredutível, de uma restituição integral do objeto.
This article focuses on the concept of "mediation" as used by Adorno throughout his philosophical... more This article focuses on the concept of "mediation" as used by Adorno throughout his philosophical and critical work. Starting with his discussion about culture in contemporary society, the paper examines his reflections on language as a process lacerated between the social aspect of communication and an emphatic (and dialectic) notion of truth. In a dialectical framework that privileges the motif of the "non-identity" of Art, I discuss the relationship between literature – as the model for the "aesthetic dignity of words" – and the possibility of overcoming that laceration in the sense of communicating differentiality.
Conference Presentations by Matheus de Brito
Anais do XV CONGRESSO INTERNACIONAL DA ABRALIC (2017), 2018
Resumo: A ausência de parâmetros para efetuar juízos seguros não raro celebra-se de forma precipi... more Resumo: A ausência de parâmetros para efetuar juízos seguros não raro celebra-se de forma precipitada nos estudos literários. Um vago entusiasmo habita em torno da “theory”. Configurado segundo interesses particulares, a delimitação e estabilização do conhecimento disciplinar sucumbiram à impossibilidade de escapar aos “jogos de linguagem”, à vacuidade imanente às proposições, etc. – os des- e correlatos pós- que se conjugaram para novamente dar cabo do projeto “iluminista” de Humanidade. Conforme certas vozes, porém, sua impotência efetiva e sua inconsistência são a felix culpa da teoria. Há crise, há saída? Nosso trabalho aborda algumas questões da discussão e delineia, junto à obra de Theodor Adorno, outra forma de pensá-las.
Palavras-chave: Teoria literária; Crise das Humanidades; Estética.
:: Em suma, é preciso colocar a crítica como condição preliminar da Teoria, e não, como já ensinou um dos antigos catecismos, como uma etapa posterior à análise pretensamente objetiva. Nem como ensinam os novos catecismos, em que crítica só detém o primado na medida em que é imediatamente comensurável com interesses de “representação”. A única crítica que ainda diz algo é aquela que se dirige ao mundo corrente, e entender como a literatura se entrelaça à ordem de coisas e em que sentido dessa mesma ordem escapa – se ainda é esse o caso – é o que interessa. Do contrário, os impulsos para algo melhor, que podem existir mesmo nos mais obtusos lugares-comuns, vão se ver rendidos à inércia discursiva. O que a literatura ainda pode ser e dizer ou fazer aos homens é sempre mais do que aquilo que o mundo fez deles, e a obra de Adorno sugere vias para pensá-lo junto à Teoria Literária.
Letras (Santa Maria), 2022
Abstract: This paper presents a brief ad hoc typology of uses through which we can think the prob... more Abstract: This paper presents a brief ad hoc typology of uses through which we can think the problem of imitation in the work of Luís de Camões, and which can be applied to other poems made under this rhetorical-poetic principle. Three forms are to be considered here: the imitation or emulation of textual models; the citation and allusion; and, finally, the resort to commonplaces. These are techniques of a discursive practice that establish a historical continuity through the reformulation of a previous model text or inflection of a topic stemming from the tradition, and that also produces the expectation of a future elaboration. Keywords: Imitation; 16th
Century; Camonian Studies; Topic
*
Resumo: Este artigo sugere uma breve tipologia ad hoc de usos a partir dos quais pensar a problemática da imitação na obra Rimas de Luís de Camões, passível de extensão a demais poemas construídos sob esse princípio retórico- poético. São três as formas aqui consideradas: a imitação ou emulação de modelos textuais; a citação e a alusão; e, por fim, o recurso aos lugares-comuns. Trata-se de técnicas de uma prática discursiva que estabelece uma continuidade histórica através da reformulação do texto-modelo prévio ou inflexão de um tópico da tradição, e que igualmente engendra uma expectativa de futura elaboração. Palavras-chave: Imitação; Século XVI; Estudos Camonianos; Tópica
*
DE BRITO, Matheus. A imitatio Camoniana, uma tipologia. Letras (Santa Maria), v. 32, n. 65, p. 146–162, 2022.
Literatura: teoría, historia, crítica, 2023
DE BRITO, Matheus. O ethos do dissídio na obra de Camões, o poema como argumento. Literatura: teo... more DE BRITO, Matheus. O ethos do dissídio na obra de Camões, o poema como argumento. Literatura: teoría, historia, crítica, v. 25, n. 1, p. 41–71, 2023.
Para entender Camões e a poesia lírica ibérica do século xvi é indispensável compreender o espaço moral-retórico que organiza cada poema enquanto ato comunicativo. Uma importante contribuição para essa tarefa reside na observação dos textos não literários que assinalam operadores culturais do período. Este artigo começa discutindo uma preceptiva retórica que pode iluminar algumas questões de interesse para o discurso poético, especialmente seu propósito, para avaliar alguns aspectos argumentativos da poesia de Camões, explorando o horizonte no qual se configura uma persona lírica a partir de um ethos. A reflexão aqui proposta pretende avançar em um capítulo da história literária, bem como levantar alguns problemas teóricos. Palavras-chave: poesia lírica; século xvi; estudos camonianos; ethos; estudos de tópica poética.
Terceira Margem, 2021
ABSTRACT: The aim of this study is to examine the current state of art in Camonian studies. The f... more ABSTRACT: The aim of this study is to examine the current state of art in Camonian studies. The first part relates the critique of historiography to the relativization of the author figure, as well as to the cultural identity forged around Camões. In the second part, we aim to grasp some disciplinary stages of Camonology and to outline some of its recent achievements. In the third, we briefly discuss some cognitive purposes within Camões studies today.
::
RESUMO: Este artigo consiste numa revisão bibliográfica dos estudos camonianos. Na primeira parte, articulamos a crítica da historiografia à relativização da figura autoral, como também à identidade cultural forjada à volta de Camões. Na segunda, procuramos pensar algumas fases disciplinares da camonologia e delinear alguns de seus recentes resultados. Já na terceira, a modo de sumário, discutimos alguns propósitos ou interesses cognitivos hoje presentes nos estudos camonianos.
Conferências do Cinquentenário da Teoria da Literatura de Vítor Aguiar e Silva, 2020
DE BRITO, Matheus. Algumas coordenadas epistemológicas da obra de Aguiar e Silva. In: Osvaldo Man... more DE BRITO, Matheus. Algumas coordenadas epistemológicas da obra de Aguiar e Silva. In: Osvaldo Manuel Silvestre; Rita Patrício. (Org.). Conferências do Cinquentenário da Teoria da Literatura de Vítor Aguiar e Silva. 1ed.Braga: Uminho Editora, 2020, p. 67-88.
Trabalho em que se sedimentam estratos conceituais da mais recente história dos estudos literários e das Humanidades, o Teoria da Literatura de Aguiar e Silva situa-se a um só tempo num ponto de viragem – aquele relativamente aos estudos literários que hoje designaríamos “pré-teóricos” – e através de diversas vagas teórico-críticas, com as quais se viu obrigada a negociar. Concebido a partir da década de 1960, quando o lugar da Literatura era já institucionalmente garantido e a disciplina da Teoria já prevista em muitos curricula, as transformações por que o livro passaria refletem não tanto a necessidade de pensar mudanças efetivas do conceito de literatura ou de obra literária, bastante estáveis desde o século XIX, mas de responder às reconfigurações institucionais intencionadas ou levadas a cabo junto ao discurso da crítica no último quartel do século. É o caso da tensão entre o conceito referencial e o conceito intencional de literatura, que em si registra uma dessas reconfigurações, mas que nunca aparece por um prisma institucional nas suas manifestações no conjunto da obra de Aguiar e Silva. Essa tensão entre o intencional e o referencial, configurando diversos pares oposicionais – história e sistema, objeto empírico e epistêmico, particular ou transtemporal, &c. – que estruturam o Teoria da Literatura, desenrola-se sobre um plano ético e epistemológico determinado, não diretamente visível, e cuja validade em parte se limita a esses conflitos particulares. Nesse sentido, se se pode dizer que amadureceu ao longo de suas edições, também se pode dizer que algo nele envelheceu, que algo venceu a prazo.
Mas não se implica assim que o trabalho mantenha sua atualidade “apesar” de algumas ideias residuais, antes, pelo contrário, que hoje é de maior pertinência epistemocrítica precisamente aquilo que conflita com certo senso comum dos estudos literários. Por que desistimos da legitimação científica? Em que medida a deseticização do estudo, perpetrada pelo avanço da reflexão dita “teórica”, não favoreceu a injeção de temas políticos e mesmo a arregimentação, algo aporética, da literatura por interesses sociais difusos? Partindo de alguns de seus trabalhos, começaremos por abordar brevemente alguns nexos da ideia de literatura na teoria de Aguiar e Silva, com especial atenção ao motivo, que lhe é caro, das litterae humaniores; de seguida, deter-nos-emos sobre sua discussão dum conceito referencial de literatura e à constante (e epifonemática) preocupação com a “teoria científica da literatura”; por fim, rearticularemos as nossas considerações, imaginando quais seriam as suas intervenções no atual quadro da reflexão teórico-crítica sobre Literatura. Mais do que uma obra sobre literatura, e em verdade sobre o próprio discurso teórico, suas diversas fases permitem prismar todo o campo de objetos e interesses cujos conflitos em grande medida determinam o estado atual – e potencialmente alguns estados futuros – do estudo da literatura.
Remate de Males, 2019
Abstract: To read Camões’ poetry as if it were a discursive act similar to the contemporary “lite... more Abstract: To read Camões’ poetry as if it were a discursive act similar to the contemporary “literature” is somewhat anachronistic. This epistemic limitation feeds on the lack of a strong counter-concept. The attempt to compensate for the pragmatic defectiveness of written communication through the hermeneutical filling of historical gaps is also an ungrateful task, for it submits all of its findings to the rule of current literary studies, their theoretical as well as institutional inertia. Not only that, but also Camões’ very work seem to “require” not to be confused among others: it accuses the lyrical poets of being “sophists”, in the well-known “Sôbolos rios que vão”; it mocks, through Duriano’s speech, a platonic “love fine like a melon” to which the passionate Filodemo gave himself; in the ridiculous figure of the unhappy Satyre, it represents the despair of love as a “depiction” of what “roughness and savage science had taught him.” These figures become all the more important when we intend to conceive the ethic-rhetorical coordinates of poetic writing in the 16th Century. Our article poses some questions around this “Anti-literary Camões” as a small contribution to the reconstruction of the pragmatic space of his poetry, perhaps also applicable to pre-bourgeois poetry in general.Keywords: Lyric Poetry; Topic; Rhetorics.
::
Resumo: É algo anacrônico ler a lírica de Camões como se fosse um ato discursivo afim à contemporânea "literatura". Essa limitação epistêmica se nutre da ausência de um "contraconceito" rigoroso. Corrigir a defectividade pragmática da escrita por meio do preenchimento hermenêutico de lacunas históricas é uma tarefa ingrata, pois tudo submete à regra dos atuais estudos literários, suas inércias teórico-institucionais. Não bastasse isso, a própria obra camoniana em diversos passos exprime um non confundar: acusa, nas conhecidas redondilhas "Sôbolos rios que vão", os poetas que cantaram o amor profano de "sofistas"; ironiza, na boca dum Duriano, o "amor fino como melão" a que o apaixonado Filodemo se entregava; representa, na figura ridícula do infeliz sátiro da égloga, o desespero amoroso como "imaginação" do que "a rudeza e a ciência agreste lhe ensinara". Essas figuras ganham importância quando reimaginamos as coordenadas ético-retóricas da escrita de Quinhentos. Nosso trabalho propõe algumas questões à volta desse "Camões antiliteratura" como pequena contribuição para a reconstrução do espaço pragmático de sua obra, aplicável talvez à poesia pré-burguesa.
Palavras-chave: poesia lírica; tópica; Retórica.
Diacrítica, 2020
The article discusses the Song (cansó, canzone, canción, canção) as a genre within a historical... more The article discusses the Song (cansó, canzone, canción, canção) as a genre within a historical framework. This task demands an approach from Rhetorics, as well as from Theory and History of written media, and Literary History. Through the comparison of tornadas or commiati in a chronological order, we can see how this structure progressively acquires the role of stabilizing a moral content rhetorically suitable to the genre, and how this orientation towards ‘textual semantics’ is later displaced and leads to the undermining of that moral purport, thus making the tornada a specific index to the historical pragmatics of poetry writing. In the last part, this article focus mainly on Luís de Camões’ tornadas, especially the way how his Songs enact this displacement.
Keywords: Canção. Literary History. Camonian Studies.
COLÓQUIO/Letras, 2019
To discuss Camões in Brazil means dealing with a complex web of cultural agency. It would be poss... more To discuss Camões in Brazil means dealing with a complex web of cultural agency. It would be possible to address Camões inside and outside specific circles of readership, such as the Luso-Brazilians from the nineteenth century or Brazilian Northeast folk culture, "a" Camões between the Lusophiles and Lusophobes in Brazilian Modernism, or one disputed by scholars and another, non-institutional one - a Camões, in short, always understood as part of an argument and received through processes of capillarization and cultural differentiation. Recent Brazilian literary studies have developed particular cognitive aims, which do not stem from a national grid imposed upon the poet's work, but instead, as if from the outside, from the emergency of new problems, thus assisting Camonian studies. This article briefly presents an overview of those, paying special attention to in progress research and its theoretical perspectives.
Discutir Camões no Brasil significa lidar com uma complexa rede de agências culturais. Seria possível abordar Camões dentro e fora de círculos específicos de leitores, como os luso-brasileiros do século XIX ou a cultura popular nordestina brasileira, "um" Camões entre lusófobos e lusófobos no modernismo brasileiro, ou um disputado por estudiosos e outro, não institucional - um Camões, em suma, sempre entendido como parte de um argumento e recebido através de processos de capilarização e diferenciação cultural. Recentes estudos literários brasileiros têm desenvolvido objetivos cognitivos particulares, que não decorrem de uma grade nacional posta sobre a obra do poeta, mas sim, como que de fora, da emergência de novos problemas, que assim integram os estudos camonianos. Este artigo apresenta brevemente uma visão geral dessas questões, dando especial atenção à pesquisa em andamento e às suas perspectivas teóricas.
Revista Letras
This paper is about the theoretical-critical implications of the renewal of rhetoric studies, wit... more This paper is about the theoretical-critical implications of the renewal of rhetoric studies, with special attention to the studies of Hansen, Pécora, Muhana, Alves and Pereira. In the first part, we discuss the limitation of literary categories when ít comes to dealing with texts prior to the “theoretical” concept of literature. In the second part, we draw a few thoughts towards a study model that should meet the cognitive imperative of periodological discrimination without falling into those epistemic limitations. What is intended is the possibility of periodization within a rhetorical framework, ultimately aiming at the idea of “ethical-rhetorical space” as a periodological tool.
::
O artigo trata das implicações teórico-críticas da renovação dos estudos de retórica, com atenção para os estudos de João Hansen, Alcir Pécora, Adma Muhana, Hélio Alves e Belmiro Pereira. Numa primeira parte, discutimos esquematicamente a limitação das categorias literárias para abordagem de textos anteriores ao conceito “teórico” de literatura; numa segunda, fazemos observações para um modelo de estudo que atenda ao imperativo cognitivo da discriminação de períodos e que não recaia naquelas limitações epistêmicas. Trata-se de pensar a possibilidade de periodizar a partir dos estudos de retórica, tomando por horizonte a elaboração de uma ideia de “espaço ético-retórico” como ferramenta periodológica. (Projeto Fapesp No. 2017/11260-4.)
Alea, 2019
Aguiar e Silva's Teoria da Literatura has been a reference for many generations of literary resea... more Aguiar e Silva's Teoria da Literatura has been a reference for many generations of literary researchers. Departing from old scholarly models, this work seems however torn between its properly theoretical interests, which are potentially universal and explanation-based, and the imperative to understand its object in a strict adherence to its historical character. The work strived to reconcile incompatible disciplinary premises, affording to do so in an institutional framework that recently underwent deep transformations. These concerned both the cognitive purposes and the means through which Literature is studied. Nevertheless, understanding how the theoretical matrix of this investigation was brought about is important if we intend to grasp the possibilities that it might still offer for Literary Studies. This article addresses the concept of “literature” employed in this model of History, theorized in Aguiar e Silva’s textbook. We also discuss the search of alternatives to the current periodological catalog, especially concerning the author’s doctoral thesis on Mannerism and Baroque.
::::
Teoria da Literatura de Aguiar e Silva (2011 [1973]) foi referência para gerações de pesquisadores em Portugal e Brasil. Afastando-se de antigos modelos, a obra surge dividida entre interesses propriamente teóricos, universais e de caráter explicativo, e o imperativo à compreensão historicamente ancorada do objeto. A fundamentação que aí se oferece para o programa disciplinar da História Literária esforça-se por conciliar premissas disciplinares diversas e fá-lo num quadro institucional particular, hoje diferente no tocante quer aos interesses cognitivos quer aos meios disponíveis para a investigação. Entender como se engendrou a matriz teórica desse programa é importante para pensar as possibilidades que a História Literária oferece para as Letras. Este artigo dedica-se ao conceito do literário implicado nesse modelo de História de que a Teoria da Literatura partilha e que assenta. Também procuramos justificar a busca por alternativas ao catálogo periodológico, especialmente respeitante à tese do autor sobre Maneirismo e barroco (1971).
::
Teoría de la Literatura de Aguiar e Silva fue referencia para generaciones de investigadores de literatura. Alejándose de viejos modelos académicos, esta obra parece dividida entre sus propios intereses teóricos, potencialmente universales y visando la explicación, y el imperativo de comprender su objeto históricamente. El trabajo se esfuerza por conciliar premisas disciplinarias incompatibles, en una situación institucional que recientemente sufrió varias transformaciones, tanto en sus propósitos cognitivos como en los medios a través de los cuales se estudia la literatura. Entender cómo se engendró la matriz teórica de ese programa es importante para pensar las posibilidades que la Historia Literaria aún ofrece para las Letras. Este artículo se dedica al concepto de literatura implicado en ese modelo de Historia teorizado por Aguiar e Silva. También intentamos justificar la búsqueda por alternativas al catálogo periodológico, especialmente concerniente a la tesis del autor sobre Maneirismo e Barroco.
Revista da Anpoll nº 43, 2017
Trata-se da tradução da conferência de abertura do XXXI Encontro Nacional da ANPOLL, pronunciada ... more Trata-se da tradução da conferência de abertura do XXXI Encontro Nacional da ANPOLL, pronunciada pelo Professor Doutor Suman Gupta (Open University) em 29 de julho de 2016 no Centro de Conferências da Universidade Estadual de Campinas. Gupta discute a herança filológica como horizonte das práticas acadêmicas correntes nos estudos literários, suas transformações e possibilidades de renovação.
Literatura: teoría, historia, crítica, 2018
Literatura: teoría, historia, crítica DOI: https://doi.org/10.15446/lthc.v20n2.70501 Lit. Teo... more Literatura: teoría, historia, crítica
DOI: https://doi.org/10.15446/lthc.v20n2.70501
Lit. Teor. Hist. Crít., Volumen 20, Número 2, p. 85-102, 2018. ISSN electrónico 2256-5450. ISSN impreso 0123-5931.
Para uma teoria da burrice
Toward a Theory of Stupidity
Hacia una teoría de la estupidez
Matheus de Brito
Texto completo:
PDF (Português (Brasil))
Bookmark and Share
Resumen (pt_BR)
Este artigo pensa as condições da burrice como um estado de coisas e um processo, os quais estão associados, como tratamos na primeira parte do texto, a um quadro institucional que não consegue ou prefere não dar uma resposta teórica adequada ao que poderíamos chamar, frouxamente, de “epistemologia naturalizada”, no sentido de “natural ao capitalismo tardio”, e que será o tema da segunda parte. Na terceira, pensaremos como essa burrice sistematicamente produzida, por sua vez, está intrinsecamente associada à própria concepção dos objetos de estudo e de crítica literária
Palabras clave (pt_BR)
estudos literários; anti-intelectualismo; crítica; teoria; discurso.
Resumen (en_US)
The first part of the article discusses stupidity as a state of things and processes associated with an institutional framework that fails to or prefers not to provide an adequate theoretical response to what we could loosely call “naturalized epistemology”, in the sense of “natural to late capitalism”, which is dealt with in the second section. In the third part, we reflect on the way this systematically produced stupidity is, at the same time, intrinsically related to the very conception of the objects of study and of literary criticism.
Palabras clave (en_US)
literary studies; anti-intellectualism; criticism; theory; discourse.
Resumen (es_ES)
El artículo se ocupa de las condiciones de la estupidez como un estado de cosas y procesos que están asociados, como tratamos en el primer apartado del texto, a un marco institucional que no logra o prefiere no dar una respuesta teórica adecuada a lo que podríamos llamar, laxamente, “epistemología naturalizada”, en el sentido de “natural al capitalismo tardío”, de la que se ocupa la segunda parte. En la tercera, pensaremos cómo esta estupidez sistemáticamente producida, a su vez, está intrínsecamente asociada a la propia concepción de los objetos de estudio y de crítica literaria.
Palabras clave (es_ES)
estudios literarios; antintelectualismo; crítica; teoría; discurso.
: :
Vou propor aqui uma ou duas narrativas para como a burrice virou teoria, virtude ou práxis teórica. Em sua versão mais próxima à crônica disciplinar, que é patente na expressão “teoria da literatura”, teríamos primeiro a literatura, um corpo de textos ligados a alguns grupos humanos, e só então passaríamos à sua incorporação ao espaço acadêmico – isto é, primeiro circulam uma variedade de objetos que levam o nome de literatura e então se constrói uma disciplina teórica e métodos de estudo em torno dessa coisa literatura. A falha desse retrato é não dar conta – tal como acontece ao que se pretende fora da burrice – das inércias que constituem a própria posição enunciativa. Falta-lhe não algum dado histórico, mas consciência das implicações. A segunda narrativa põe as implicações à vista, partindo do processo: primeiro se concebe um modelo normativo de “ciência”, a partir do qual se propõe um programa de formalização específico sob o nome de “literatura”, e esse conceito formal de literatura é preenchido por uma série de coisas que são de interesse para o conhecimento humanístico, mas que são conceitualmente estropiadas para caber na designação “conhecimento literário”. De seguida, o consenso parte de premissas mais ou menos concordantes com o espírito da formalização e, no plano mais amplo do discurso, funde o caráter estropiado do objeto teórico ao caráter estropiado dos homens reais . O método empobrece – lamentação conhecida –, o discurso legitima o estado de coisas.
STUDIA UBB PHILOLOHIA, 2017
Camões and the Civilization of Commerce | Camões și civilizația comerțului | Abstract: This pa... more Camões and the Civilization of Commerce | Camões și civilizația comerțului |
Abstract: This paper compares Os Lusíadas and William J. Mickle’s The Lusiad; Or, the Discovery of India (1776), intending to approach the process of actualization of meaning which led Camões’ poem to be regarded as the “Epic of Commerce.” In the first part, we briefly present some discursive features that both resist and afford this change of meaning. In the second part, we address some properties of Mickle’s book. Finally, we pose a theoretical-historiographic question concerning Camonian studies.
Keywords: Literature. Translation. History. Criticism. XVI Century. Portugal. Camonian Studies.
Resumé: Cet article compare Os Lusíadas et The Lusiad; Or, the Discovery of India (1776) de William Mickle, dans le but d’aborder le processus d’actualisation du sens qui a permis de comprendre le poème de Camões comme “l’Épopée du Commerce.” La première partie fait ressortir sommairement quelques caractéristiques discursives qui résistent et à la fois se prêtent à ce changement du sens. Dans la deuxième partie, on aborde quelques propriétés du livre de Mickle. À la fin, on propose une question théorique et historiographique pour les études camoniennes.
Mots clés: Littérature. Traduction. Histoire. Critique. XVI siècle. Portugal. Études camoniennes.
Rezumat: Camões și civilizația comerțului. Acest articol compară Os Lusíadas și The Lusiad; Or, the Discovery of India (1776) de William Mickle, cu scopul de a aborda procesul de actualizare a sensului care a permit înțelegerea poemului camonian ca o „epopee a comerțului”. În prima parte, prezentăm sumar câteva caracteristici discursive care se opun, dar în același timp permit această schimbare de sens. În partea a doua, ne aplecăm asupra câtorva trăsături ale cărții lui Mickle. În final, adresăm o întrebare teoretic și istoriografică pentru studiile camoniene.
Cuvinte cheie: Literatură. Traducere. Istorie. Critico. secolul al XVI-lea. Portugalia. studii camoniene.
: : http://www.studia.ubbcluj.ro/arhiva/abstract_en.php?editie=PHILOLOGIA&nr=4&an=2017&id_art=15619
: : http://www.studia.ubbcluj.ro/arhiva/cuprins_en.php?id_editie=1122&serie=PHILOLOGIA&nr=4&an=2017
A comunicação trata dalguns eixos dos estudos camonianos, considerando o modo como questões histó... more A comunicação trata dalguns eixos dos estudos camonianos, considerando o modo como questões históricas, teóricas e historiográficas se entretecem ao conteúdo experiencial da obra de Luís de Camões. Nesse ínterim, discutem-se (1) as motivações históricas e intrainstitucionais que levaram a sucessivas e não raro incompatíveis abordagens da obra do poeta, bem como (2) o estado atual de sua crítica relativamente à teoria literária e à fundamentação teórica da periodologia literária. O trabalho também em parte consiste numa apresentação breve dalgumas linhas fundamentais do projeto de investigação pós-doutoral “O ethos do dissídio na lírica camoniana” (IEL/Unicamp - FAPESP 2017/11260-4).
CO-AUTHOR Manuel Portela (UC) Almost three decades ago, Jerome McGann stated that if the Humanit... more CO-AUTHOR Manuel Portela (UC)
Almost three decades ago, Jerome McGann stated that if the Humanities were facing a crisis, it did not concern propositions on literary artifacts but our scholarly practices (1988). Attentive to these, he helped to bring them to the forefront of discussion in both textual scholarship and literary criticism. This work was not solely theoretical, but it was solidly built upon his long-time experience, first, as print editor of Byron’s works (1980-1993), and, later, as hypermedia editor of the Rossetti Archive (1993–2008; http://www.rossettiarchive.org/). Equally important for the development of his thought have been his teaching career as John Stewart Bryan Professor at the University of Virginia (1986–), and his many institutional appointments.
Changes brought about by digital textuality upon the modes of production and circulation of both literary works and scholarly discourses led him to publish one of the most seminal essays for rethinking the technologies and forms of the book in hypermedia environments (“The Rationale of Hypertext”, written in 1995). Distinguished scholar and critic, McGann soon became widely acknowledged for his interventions on the Digital Humanitiesdebates, for which his fifteen-year old Radiant Textuality: Literature After the World Wide Web (2001) is a sort of “classic”. He has recently published A New Republic of Letters: Memory and Scholarship in the Age of Digital Reproduction (2014), gathering essays that follow from his pioneering book on the matter. From Blake to Byron, from Dickinson to Drucker, from social text to online scholarship, his groundbreaking combination of philological investigation and philosophical provocation has resulted in textual artifacts and conceptual models that continue to resonate as we plunge deeper and deeper into the regime of computation.
McGann’s editorial and theoretical work on the social and bibliographic dimensions of textual events has been at the core of the Materialities of Literature PhD Program at the University of Coimbra. Focusing mostly on McGann’s recent work, our interview addresses the reasons underlying his critical moves, and looks at his scholarly poetics of interpretation as a material engagement with imaginative works.
\\\
Centrando-se em obras recentes de McGann, esta entrevista aborda as razões subjacentes à sua perspetiva crítica, e analisa a sua poética da interpretação como uma interrogação material das criações da imaginação.
Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary stu... more Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary studies in Brazil, meaning took a sense utterly semiotic. To speak of meaning is thus equivalent to think of sign. However, unlike "referent", for instance, which immediately invokes a linguistic context, meaning can be thought of in other ways. The persistence of the semiotic model, its mindset as well as its jargon, is the basis of several problems concerning the current brazilian literary studies. Another account of meaning and a different conceptual attitude towards the literary work of art may provide solutions to many of these problems.
//
Devido a especificidades que acompanharam a profissionalização e academização dos estudos literários no Brasil, o sentido tomado pela noção de sentido foi quase unanimemente semiótico. Falar de sentido, assim, equivale a pensar em signo. No entanto, diferentemente de “referente”, por exemplo, que imediatamente invoca um contexto linguístico, o sentido pode ser pensado de outras maneiras. A persistência do modelo semiótico, tanto como mentalidade quanto jargão, está na base de vários problemas que marcam os estudos literários brasileiros atuais. Uma outra noção de sentido e uma diferente atitude conceitual em relação à obra literária podem oferecer saídas para muitos desses problemas.
Research Interests:
Critical Theory, Literary Criticism, Literary Theory, Lingüística, and Teoría Literaria
Revista Desenredo, Dec 2014
Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary stu... more Due to specific facts that followed the academization and the professionalization of literary studies in Brazil, meaning took a sense utterly semiotic. To speak of meaning is thus equivalent to think of sign. However, unlike "referent", for instance, which immediately invokes a linguistic context, meaning can be thought of in other ways. The persistence of the semiotic model, its mindset as well as its jargon, is the basis of several problems concerning the current brazilian literary studies. Another account of meaning and a different conceptual attitude towards the literary work of art may provide solutions to many of these problems.
//
Devido a especificidades que acompanharam a profissionalização e academização dos estudos literários no Brasil, o sentido tomado pela noção de sentido foi quase unanimemente semiótico. Falar de sentido, assim, equivale a pensar em signo. No entanto, diferentemente de “referente”, por exemplo, que imediatamente invoca um contexto linguístico, o sentido pode ser pensado de outras maneiras. A persistência do modelo semiótico, tanto como mentalidade quanto jargão, está na base de vários problemas que marcam os estudos literários brasileiros atuais. Uma outra noção de sentido e uma diferente atitude conceitual em relação à obra literária podem oferecer saídas para muitos desses problemas.
From its foundation, Literary Theory held with Structuralism some epistemological affinities whic... more From its foundation, Literary Theory held with Structuralism some epistemological affinities which added to the convergence between the critical intention of the former and the analytical method of the latter. If those affinities implied not only the normalization and conceptual demystification of literary discourse during the XXth century, their academic charge coincided with a radical de-aesthecization. The claim to universality, contained in the thoughtless equation of valid knowledge and system of propositions, fostered an objectivity at the expense of the object, in Language and Literature Studies: linguistic definitions concurred to the erasure of the material dimension of the experience of language. Even the post-structuralist criticism maintained the “transcendental impossibility” of the eradicated dimension, as a felix culpa concerning the totalizer claims of science – reversing into a game the very inadequacy between Sign and Referent, Subject and Object. If we’re dealing, however, with an epistemological error – namely, assuming as commensurable the activities of analysis and criticism, the notions of knowledge and truth, of linguistic universal and aesthetic particular –, the critical self-reflection ought to strive to find, in the mutual opposition between the aesthetic and the linguistic discourses, the overcoming of the deficiencies that follow their historical intertwinement. The criticism of the scientific presuppositions shall point to the possibility of a qualitatively irreducible experience, of a full restitution of the object.
//
De sua gênese, a Teoria da Literatura manteve com o Estruturalismo afinidades epistemológicas que subsidiaram a convergência da intenção crítica e do método analítico. Se isso implicou não apenas alguma normalização e a desmistificação conceitual do discurso literário no séc. XX, seu encargo acadêmico coincidiu com uma radical desestetização. A ambição de universalidade contida na equação irrefletida entre conhecimento válido e sistema de proposições teóricas promoveu nas Letras uma objetividade às expensas do objeto: as definições da linguística concorreram para o apagamento da dimensão material da experiência da linguagem. Mesmo a crítica pós-estruturalista se ateve à “impossibilidade transcendental” da dimensão extirpada, na forma de uma felix culpa em relação à pretensão totalizadora da ciência – versando em jogo a inadequação entre signo e referente, sujeito e objeto. Se lidamos, porém, com um erro epistemológico – a saber, triplo: pressupor comensuráveis análise e crítica, saber e verdade, universal linguístico e particular estético –, a autorreflexão crítica deve esforçar-se por encontrar na oposição recíproca entre o discurso linguístico e o estético a superação das insuficiências que acompanham seu entrelaçamento histórico. A crítica aos pressupostos da ciência deve indicar a possibilidade de uma experiência qualitativamente irredutível, de uma restituição integral do objeto.
This article focuses on the concept of "mediation" as used by Adorno throughout his philosophical... more This article focuses on the concept of "mediation" as used by Adorno throughout his philosophical and critical work. Starting with his discussion about culture in contemporary society, the paper examines his reflections on language as a process lacerated between the social aspect of communication and an emphatic (and dialectic) notion of truth. In a dialectical framework that privileges the motif of the "non-identity" of Art, I discuss the relationship between literature – as the model for the "aesthetic dignity of words" – and the possibility of overcoming that laceration in the sense of communicating differentiality.
Anais do XV CONGRESSO INTERNACIONAL DA ABRALIC (2017), 2018
Resumo: A ausência de parâmetros para efetuar juízos seguros não raro celebra-se de forma precipi... more Resumo: A ausência de parâmetros para efetuar juízos seguros não raro celebra-se de forma precipitada nos estudos literários. Um vago entusiasmo habita em torno da “theory”. Configurado segundo interesses particulares, a delimitação e estabilização do conhecimento disciplinar sucumbiram à impossibilidade de escapar aos “jogos de linguagem”, à vacuidade imanente às proposições, etc. – os des- e correlatos pós- que se conjugaram para novamente dar cabo do projeto “iluminista” de Humanidade. Conforme certas vozes, porém, sua impotência efetiva e sua inconsistência são a felix culpa da teoria. Há crise, há saída? Nosso trabalho aborda algumas questões da discussão e delineia, junto à obra de Theodor Adorno, outra forma de pensá-las.
Palavras-chave: Teoria literária; Crise das Humanidades; Estética.
:: Em suma, é preciso colocar a crítica como condição preliminar da Teoria, e não, como já ensinou um dos antigos catecismos, como uma etapa posterior à análise pretensamente objetiva. Nem como ensinam os novos catecismos, em que crítica só detém o primado na medida em que é imediatamente comensurável com interesses de “representação”. A única crítica que ainda diz algo é aquela que se dirige ao mundo corrente, e entender como a literatura se entrelaça à ordem de coisas e em que sentido dessa mesma ordem escapa – se ainda é esse o caso – é o que interessa. Do contrário, os impulsos para algo melhor, que podem existir mesmo nos mais obtusos lugares-comuns, vão se ver rendidos à inércia discursiva. O que a literatura ainda pode ser e dizer ou fazer aos homens é sempre mais do que aquilo que o mundo fez deles, e a obra de Adorno sugere vias para pensá-lo junto à Teoria Literária.
Trabalho em que se sedimentam estratos conceituais da mais recente história dos estudos literário... more Trabalho em que se sedimentam estratos conceituais da mais recente história dos estudos literários e das Humanidades, o Teoria da Literatura de Aguiar e Silva situa-se a um só tempo num ponto de viragem – aquele relativamente aos estudos literários que hoje designaríamos “pré-teóricos” – e através de diversas vagas teórico-críticas, com as quais se viu obrigada a negociar. Concebido a partir da década de 1960, quando o lugar da Literatura era já institucionalmente garantido e a disciplina da Teoria já prevista em muitos curricula, as transformações por que o livro passaria refletem não tanto a necessidade de pensar mudanças efetivas do conceito de literatura ou de obra literária, bastante estáveis desde o século XIX, mas de responder às reconfigurações institucionais intencionadas ou levadas a cabo junto ao discurso da crítica no último quartel do século. É o caso da tensão entre o conceito referencial e o conceito intencional de literatura, que em si registra uma dessas reconfigurações, mas que nunca aparece por um prisma institucional nas suas manifestações no conjunto da obra de Aguiar e Silva. Essa tensão entre o intencional e o referencial, configurando diversos pares oposicionais – história e sistema, objeto empírico e epistêmico, particular ou transtemporal, &c. – que estruturam o Teoria da Literatura, desenrola-se sobre um plano ético e epistemológico determinado, não diretamente visível, e cuja validade em parte se limita a esses conflitos particulares. Nesse sentido, se se pode dizer que amadureceu ao longo de suas edições, também se pode dizer que algo nele envelheceu, que algo venceu a prazo.
Mas não se implica assim que o trabalho mantenha sua atualidade “apesar” de algumas ideias residuais, antes, pelo contrário, que hoje é de maior pertinência epistemocrítica precisamente aquilo que conflita com certo senso comum dos estudos literários. Por que desistimos da legitimação científica? Em que medida a deseticização do estudo, perpetrada pelo avanço da reflexão dita “teórica”, não favoreceu a injeção de temas políticos e mesmo a arregimentação, algo aporética, da literatura por interesses sociais difusos? Partindo de alguns de seus trabalhos, começaremos por abordar brevemente alguns nexos da ideia de literatura na teoria de Aguiar e Silva, com especial atenção ao motivo, que lhe é caro, das litterae humaniores; de seguida, deter-nos-emos sobre sua discussão dum conceito referencial de literatura e à constante (e epifonemática) preocupação com a “teoria científica da literatura”; por fim, rearticularemos as nossas considerações, imaginando quais seriam as suas intervenções no atual quadro da reflexão teórico-crítica sobre Literatura. Mais do que uma obra sobre literatura, e em verdade sobre o próprio discurso teórico, suas diversas fases permitem prismar todo o campo de objetos e interesses cujos conflitos em grande medida determinam o estado atual – e potencialmente alguns estados futuros – do estudo da literatura.
Texto apresentado por ocasião da defesa da tese.
Frequentes têm sido as injunções de "retorno à Filologia" nos estudos literários, que não raro to... more Frequentes têm sido as injunções de "retorno à Filologia" nos estudos literários, que não raro tomam "filologia" como comportamento geral, negando seu caráter disciplinar. Nosso trabalho repensa a intenção dessas injunções, enfatizando, através de um comentário à obra de Segismundo Spina, heranças específicas à prática filológica de inquestionável urgência para a contemporânea crítica literária.
Diversas teorias do texto disputam o espaço terminológico dos estudos literários. De origem pré-c... more Diversas teorias do texto disputam o espaço terminológico dos estudos literários. De origem pré-científica e amplamente empregue na Filologia do século XIX (ARAÚJO, 1986; SPINA, 1977), foi sua operacionalização pela Linguística estrutural que deu ao lexema texto os principais contornos com que hoje figura na língua franca das Letras. Recodificada por essa disciplina científica, a expressão retornou à crítica literária no contexto do pós-guerra, então dotada das conotações de objetividade que confeririam legitimidade ao ainda difuso campo dos estudos acadêmicos da literatura. O texto crescia em prejuízo da imagem da obra. Nesse ínterim, as abordagens estética e filológica à literatura foram paulatinamente preteridas – já não pareciam nem epistemologicamente convincentes nem consistentes diante do discurso da Linguística (EAGLETON, 1994). As divergências e semelhanças entre os construtos que então se esboçavam – texto semiológico e texto literário – formaram a entidade evasiva que é hoje o (simples, indeterminado e ubíquo) texto, num processo catalisado pela complexificação interna das disciplinas da Linguística e da Teoria Literária.
O multiforme quadro da textualidade contemporânea, porém, não parece indicar, como querem alguns (ISER, 2006; LEITCH, 2014; MOWITT, 1992) a confirmação discursivo-cognitiva de uma exuberância essencial atribuída à Literatura e à Cultura. É hoje visível que as reduções conceituais, necessárias à formulação desses dois grandes modos de abordagem textual, foram ingenuamente tomadas como algo real e a seguir remediadas pela proliferação de definições cosméticas. O instrumento de descrição confundiu-se à coisa descrita. Por essa razão, não raro a noção transversal de texto permanece simplesmente aquém dos propósitos cognitivos relativos a cada um desses usos (JAMESON, 2008) – a saber, restringindo o estudo da literatura aos efeitos semióticos da construção verbal e, em contrapartida, esboroando os limites metodológicos em função dos quais a linguística textual mobiliza essa categoria (MARGOLIN, 2007). Na crítica literária atual, essa confusão preside um estranho retorno academicizado do estilo impressionista, com seus usos adjetivais e o concorrente esvaziamento pragmático do gesto crítico. Paradoxalmente, a Teoria vive hoje o seu momento pós-teórico.
Nosso trabalho consiste em avaliar algumas situações em que obra e texto figuraram como fatores decisivos para tomadas de partido teórico-críticas nos estudos literários. Trata-se de expor, numa primeira parte, a herança filológica e estética ainda perceptível na gênese da Teoria Literária e as dificuldades com que então se deparava a disciplina no Brasil, como exemplar de um quadro global (MOISÉS, 2003; WARREN; WELLEK, 2003). Num segundo momento, consideraremos o afastamento da crítica em relação a essa dupla herança e a concomitante adoção da terminologia ou de uma moldura linguística (BARTHES, 1989; DE MAN, 1986), com especial atenção ao processo de desmaterialização por que a noção de texto assim passava. Para concluir, avaliaremos algumas propostas teóricas que tentam dar conta do que é específico à textualidade literária, isto é, daquilo que ainda resiste à abordagem linguística. De modo mais preciso, trata-se de pensar o retorno de certas investidas filológicas e estéticas (DRUCKER, 2009, 2014; GUMBRECHT, 2002, 2004; MCGANN, 1991, 2014) ao campo dos estudos literários, orientadas para a problematização da materialidade da literatura.
O século XX é conhecido por uma intensa recusa estética aos ideais de representação e referencial... more O século XX é conhecido por uma intensa recusa estética aos ideais de representação e referencialidade, que alimentavam a chamada indústria da cultura. Por "tabu mimético", Theodor Adorno indicava o recalcamento dos elementos sensórios em favor dos elementos conceituais, o qual se prolongava da ontologia burguesa à experiência da arte (Teoria Estética). Por um lado, esse gesto de recusa a certos modos de significação - que refletem uma oposição epistemológica entre conhecimento sensível e conceito - fez-se paradoxalmente suceder da sofisticação da hermenêutica e de sua universalização no ambiente acadêmico, numa exaustiva intimação aos significantes artísticos. Tal como na indústria da cultura, a consciência acadêmica se viu domesticada por mecanismos de produção e veiculação de sentido, sob o imperativo de que uma obra proporcione ou retenha em si uma mais-valia semântica. Por outro lado, a persistente insatisfação com os tradicionais postulados da interpretação, ou com a racionalidade tout court, levou a novas investigações no âmbito da Estética, à recusa de compreender as obras de arte como objetos hermenêuticos e a ulteriores reelaborações da possibilidade de "apreender a sua ininteligibilidade" (Adorno, TE). Mas se isso implica que a Teoria toma da Estética certa inclinação, até que ponto a recusa às funções de significação e comunicação pode hoje ser reelaborada no âmbito acadêmico? Nosso trabalho começa, assim, (1) da recente discussão sobre o hiato entre a apropriação sensória do mundo e o trabalho do conceito, como elaborada pelo paradigma das "materialidades da comunicação" - de que trata a obra de H. U. Gumbrecht (sobretudo Produção de Presença) -, e (2) resgata o materialismo estético de Adorno na sua Teoria, a fim de (3) confrontar as duas propostas. Nesse confronto, procuraremos pensar como o espaço acadêmico ainda pode resistir às exigências inestéticas da cultura sob um regime industrial.
De sua gênese, a Teoria da Literatura manteve com o Estruturalismo afinidades epistemológicas que... more De sua gênese, a Teoria da Literatura manteve com o Estruturalismo afinidades epistemológicas que subsidiaram a convergência da intenção crítica e do método analítico. Se isso implicou não apenas alguma normalização e a desmistificação conceitual do discurso literário no séc. XX, seu encargo acadêmico coincidiu com uma radical desestetização. A ambição de universalidade contida na equação irrefletida entre conhecimento válido e sistema de proposições teóricas promoveu nas Letras uma objetividade às expensas do objeto: as definições da linguística concorreram para o apagamento da dimensão material da experiência da linguagem; mesmo a crítica pós-estruturalista se ateve à “impossibilidade transcendental” da dimensão extirpada, na forma de uma felix culpa em relação à pretensão totalizadora da ciência – versando em jogo a inadequação entre signo e referente, sujeito e objeto. Se lidamos, porém, com um erro epistemológico – a saber, triplo: pressupor comensuráveis análise e crítica, saber e verdade, universal linguístico e particular estético –, a autorreflexão crítica deve esforçar-se por encontrar na oposição recíproca, não na complementaridade, entre o discurso linguístico e o estético a superação das insuficiências que acompanham seu entrelaçamento histórico. A crítica aos pressupostos da ciência deve indicar a possibilidade de uma experiência qualitativamente irredutível, de uma restituição integral do objeto.
Legados do pós-estruturalismo, os debates sobre a formalização de procedimentos interpre... more Legados do pós-estruturalismo, os debates sobre a formalização de procedimentos interpretativos e dos pressupostos epistemológicos da Teoria da Literatura não raro assumem feições (ou discursos) de uma crise geral dos estudos literários e das ciências humanas - uma crise em verdade aguçada tanto pelas transformações da experiência social da literatura e das demais artes quanto, por outro lado, pelo desenvolvimento dos novos media de comunicação, os quais cobram novos empreendimentos conceituais. Recentes intenções teóricas, nesse espaço, apresentam-se como vias alternativas e propõem uma transformação paradigmática dos estudos literários pela renovação de seus modelos críticos. Sob o influxo das atuais teorias dos media ou propondo a revisão das abordagens extrínsecas que caíram em descrédito com a emergência da doutrina formalista da imanência, uma dessas intenções investiga a possibilidade de tematizar a literatura sem cair nas insuficiências detectadas pelo pós-estruturalismo na tradicional hermenêutica (diferimento, indecidibilidade, o aprisionamento nos limites do discurso), reaproximando assim a literatura à contemporânea teoria estética. Nossa comunicação consiste em apresentar as Materialidades da Literatura, programa que pesquisa o literário como prática enunciativa realizada em simétrica correlação com seus meios. A apresentação tem três momentos: explicam-se algumas linhas da “crise”; discute-se a problemática dos media nos estudos literários ou o que Sepp Gumbrecht (“Corpo e Forma”, 1998) nomeou “Campo Não-Hermenêutico”; apresentam-se, então, as possibilidades deste novo capítulo da teoria crítica da literatura. Convocaremos para tal um pequeno corpus de caráter teórico. Espera-se, no geral, apresentar o problema da interpretação “numa nova chave”.
https://www.dropbox.com/s/jchl50t8qjh73az/EnELF%20-%20Anais%20-%20Vol%20I.pdf?dl=0 pp. 266-275
W. Benjamin é conhecido sobretudo por sua tomada de partido no contexto das discussões sobre o pr... more W. Benjamin é conhecido sobretudo por sua tomada de partido no contexto das discussões sobre o progresso técnico no início do século XX. Seu esforço de impelir a técnica aos limites de sua repercussão social, pensando as intenções que grassavam em torno do poder então disponibilizado aos homens, acabou produzindo imagens culturais de temporalidades descontínuas. Se a técnica rompe a relação entre Homem e Natureza, Benjamin procurava resgatar nessa ruptura a própria natureza humana; perceber as mesmas disrupções em suas reflexões é imprescindível.
No final dos anos 20, Benjamin parecia divisar todo seu discurso sobre a técnica na década seguinte. Tudo a que alguns se referem por sua teoria é produto de uma capacidade imaginativa apurada. A busca, na teoria, pelo que pertence ao imaginário entende que sua validade sócio-histórica é determinada pelos interesses a que dada imagem se vincula; isso implica que a teoria tem um momento de verdade irredutível à sua adequação à “objetividade”. Nossa apresentação é uma leitura bastante concisa do aforismo “A caminho do planetário” (Rua de Mão Única, 1995:68-69 [1927]).
Book review [Recensão crítica de] Jerome McGann, A New Republic of Letters: Memory and Scholarshi... more Book review [Recensão crítica de] Jerome McGann, A New Republic of Letters: Memory and Scholarship in the Age of Digital Reproduction, Cambridge, MA: Harvard University Press, 2014, 238 pp. ISBN: 978-0-674-72869-1.
DOI: http://dx.doi.org/10.14195/2182-8830_4-1_11
Que um título como Entrevistas com Robert Hullot-Kentor soe algo estranho ao público é inevitável... more Que um título como Entrevistas com Robert Hullot-Kentor soe algo estranho ao público é inevitável e, a seu modo, vem a propósito. À partida, o livro haveria de ser julgado por sua capa, na qual uma fotografia em p&b nos apresenta uma figura acasacada de que só é mesmo visível a face, uns olhos calmos focando a câmera, como se, enquanto se deixa entrever, sempre-já se prontificasse a nos devolver o olhar. Essa prefiguração de uma resposta parece dissolver a ameaça do "monólogo dirigido", acepção usual de "entrevista", e assim reafirmar a intenção de conversação. Apesar do reconhecimento geral em meio àqueles que estudam a teoria crítica e especialmente a obra de Theodor Adorno -e Hullot-Kentor é quase sinônimo de suas edições anglófonas -, o breve estranhamento do nome se encadeia, pois no Brasil não há senão traduções esporádicas de seus ensaios, a um outro: por que "entrevistar" um intelectual pouco familiar?
RESENHA: GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera, ambiência, Stimmung: sobre um potencial oculto da li... more RESENHA:
GUMBRECHT, Hans Ulrich. Atmosfera, ambiência, Stimmung: sobre um potencial oculto da literatura. Trad. Ana Isabel Soares. Rio de Janeiro: Contraponto : Editora PUC Rio, 2014, Pp. 174. [1ª ed. Munich, Carl Hanser Verlag, 2011].
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S2316-40182015000100485&script=sci_arttext&tlng=en
// Book review on one of Gumbrecht's latest books in its brazilian portuguese translation. Final text is almost the same as "Stimmungen or 'In the Mood for Differentiality'" (published in MatLit, the link as follows: http://iduc.uc.pt/index.php/matlit/article/view/1791)
sobre um potencial oculto da literatura Trad. Ana Isabel Soares. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed.... more sobre um potencial oculto da literatura Trad. Ana Isabel Soares. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2014 Matheus de Brito 1
co-autoria com Manuel Portela
co-autoria com Osvaldo Manuel Silvestre
Pável Nikoláievitch Medviédev. O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma p... more Pável Nikoláievitch Medviédev. O método formal nos estudos literários: introdução crítica a uma poética sociológica, Trad. Ekaterina Vólkova Américo e Sheila
Materialidade e Contingência, 2017
Os dois polos que tentamos justificar aqui são uma reflexão sobre materialidade conceitualmente r... more Os dois polos que tentamos justificar aqui são uma reflexão sobre materialidade conceitualmente rigorosa, e a realimentação da especulação estético-filosófica como horizonte da crítica e da atividade literária e humanística. O hiato entre as duas dimensões deve ser explorado à exaustão, para que, fazendo nossas palavras de Adorno, não se limitem os estudos literários a configurar um corpo de saberes “para o qual não deve acontecer mais nada”.
During the twentieth century, Literary Theory emerged, consolidated itself as an academic discipl... more During the twentieth century, Literary Theory emerged, consolidated itself as an academic discipline and finally fell into crisis. As part of the academic institutionalization of literary studies, Literary Theory rebutted both the old historicist approach associated with Philology and the aesthetic-philosophical approach to literary works, promoting instead an epistemological paradigm that intended to be more adequate than the previous one. Fostering the contempt for factors then regarded as “extrinsic” to the literary text, its disciplinary commitment to Linguistics was decisive for such a process. However, as a result of the very methodological limits it subscribed, along with the general criticism of traditional concepts and cognitive interests of Humanities – a criticism carried out by “linguistic” and “cultural” turns in the second half and late twentieth century –, Literary Theory steadily gave way to other discursive forms. This process concerned the institutionalization of post-structuralism and deconstruction, of cultural studies and other thematic approaches to literature – as well as its subsequent fragmentation in the current “post-theoretical” era. In a certain sense, these manifestations can be understood as part of a process of internal differentiation, as competing catalogues of description inside a same paradigm, and not as a result of a radical rupture. They all have in common a semiotic-transmissive understanding of literary textuality, merely inflected with regard to textual semantics. For this reason, the dissident theories failed to avoid problems that were analogous to those perceived in the more traditional approaches, and even inherited from them – first of all from their link to linguistics, which, besides remaining unquestioned, also became their critical device par excellence. Nevertheless, a host of other theoretical intentions gradually came forth as a counterpart to such efforts, concerning what we could summarize as the inquiry of materiality. Common to these intentions and along with this category, an epistemology of non-identity seems to operate, with a double role: on the one hand, it allows them to be more than a sheer regression to those pre-theoretical approaches earlier mentioned; on the other, it exempts them from modelling catalogues of description under the rule of linguistic-dependent theory. If we could, at first, understand this category – materiality – as a sign of a return to philology, it is also around this concept that we can perceive a return of aesthetic theory in literary studies. Our thesis questions and measures the validity of this literary theorizing, with special attention to the idea of “contingency,” non-identity. In order to do this, we inquire the theoretical-critical works of three authors: first, Hans Ulrich Gumbrecht’s work, which strives more explicitly – and in a conceptually massive and unstable fashion – to develop the category of materiality through ways radically distinct from those subscribed by literary theory; second, the works of Jerome McGann and Johanna Drucker, which sought to implement and measure in a practical manner what could be and how such alternatives could operate, the very process through which different conceptual models gradually arose. We examine how these authors, among others, react to the current scene of literary theory and criticism, and how their inquiries resonate both within and outside of this context, that is, how they also partake in a wider epistemological discussion. Through reassessing the methods employed by literary studies, the main purpose of this thesis is to contribute to the ongoing relocation of literary theory within the framework of contemporary aesthetic thinking. Inquiring materiality implies not only to question the fundamental predicates and assumptions of literary theory, but also the attempt to change it.
Keywords: Materiality; Aesthetics; Textual Criticism; Epistemology; Non-identity.
\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\\
A Teoria Literária surgiu, consolidou-se e entrou em colapso durante o século XX. Enquanto parte da institucionalização do estudo da literatura, a Teoria rechaçou tanto o historicismo da Filologia como a abordagem estético-filosófica da obra literária, promovendo um paradigma epistemológico mais “adequado”. Decisivo foi seu compromisso com a disciplina da Linguística, que alimentou o desprezo por fatores “extrínsecos” ao texto. No entanto, em consequência dos próprios limites metodológicos que subscreveu, e junto à crítica geral aos conceitos e interesses cognitivos tradicionais das Humanidades – crítica então levada a cabo pela “virada linguística” e a seguir pela “virada cultural” –, a Teoria da Literatura pouco a pouco perdeu espaço para outras formas de discurso. Trata-se da institucionalização do pós-estruturalismo e da Desconstrução, dos estudos culturais e demais abordagens temáticas – e de sua subsequente fragmentação no atual quadro “pós-teórico.” Essas manifestações podem ser compreendidas como uma complexificação interna ao paradigma, como catálogos descritivos em disputa, e não como resultantes de uma ruptura radical. Permanece-lhes comum uma concepção transmissivo-semiótica da textualidade literária, apenas infletida no tocante à semântica textual. Por essa razão, os dissidentes não deixaram de incorrer em problemas análogos àqueles acusados nas abordagens tradicionais, e mesmo delas herdados – desde já do fato de que seu enlace com a linguística não só permaneceu inquestionado como se tornou sua ferramenta crítica por excelência. Entretanto, como contraparte dessas abordagens hoje correntes, fez-se progressivamente visível uma série de outras intenções teóricas, que se poderiam sumarizar como uma problematização da materialidade. Comum a essas outras intenções e junto a essa categoria, parece estar em operação uma epistemologia da não-identidade, dotada de uma dupla função: por um lado, permite-lhes serem mais do que simples recaídas nas abordagens pré-teóricas do historicismo e do esteticismo; por outro, exime-lhes de construírem seus catálogos descritivos com base nas mesmas regras da Teoria de penhor linguístico. Se se poderia entender a materialidade como signo de um retorno à Filologia, é também à volta dela que se percebe um retorno da Estética nos estudos literários. Nosso trabalho questiona e mensura a validade dessa teorização literária, com especial atenção à ideia de “contingência,” não-identidade. Seguimos o percurso teórico-crítico de três autores: primeiro, o trabalho de Hans Gumbrecht, que de modo mais explícito e inconstante esforça-se por elaborar a categoria da materialidade por vias radicalmente distintas daquela adotada pela tradicional teoria literária; noutro momento, os trabalhos de Jerome McGann e Johanna Drucker, que procuraram implementar e medir de maneira prática o que poderia ser uma tal via alternativa. Consideramos como eles respondem ao atual cenário da crítica literária e como suas reflexões têm ressonância dentro e fora desse contexto, isto é, como também se inserem numa discussão epistemológica mais ampla. Repensando os métodos de que se valem os estudos literários, este trabalho visa contribuir com a reorientação da teoria literária no âmbito da contemporânea reflexão estético-filosófica. Em última instância, pensar a materialidade exige não apenas que se considerem os predicados fundamentais e as premissas da teoria literária mas que se faça o esforço por sua transformação.
Palavras-chave: Materialidade; Estética; Crítica Textual; Epistemologia; Não-identidade.
SOBRE O MATERIALISMO NAS LETRAS " Verdadeiro é aquilo que não entra em conformidade com esse mu... more SOBRE O MATERIALISMO NAS LETRAS
" Verdadeiro é aquilo que não entra em conformidade com esse mundo"
Theodor Adorno
Ocupar-se da semiose, dando por neutro o substrato social que condiciona os processos de significação, incluindo nisso o fetiche da ideia de polissemia, otimização da complexidade, etc., oculta a questão mais básica a que nossas disciplinas de Teoria e História se entregavam em seu período mais vivo, isto é, sobre as próprias condições de existência e funcionamento do objeto cultural que é a obra literária. Nossas disciplinas mensuram processos dinâmicos, não estruturas anistóricas. Há hoje, e talvez desde sempre sob o imperativo à profissionalização, uma tendência perniciosa a transformar os cursos de Teoria da Literatura em " especialização na teoria determinada " muito mais do que avivar a genuína inquisição e debate sobre a situação dos estudos literários e das condições materiais de que o fenômeno literário depende em todos os seus momentos. A convergência imediata entre a interpretação semiótica e a observação teórica, o fato de se tornarem sinônimos mesmo quando não estamos preocupados com a gramática narrativa ou o percurso gerativo, concorre para o empobrecimento não apenas da própria obra, considerando a literatura como evento num nível semântico-pragmático, mas também do potencial do sujeito para produzir uma nova imediatidade em sua relação com as entidades que reconhecemos como obras de arte – e com a sociedade, o mundo como tal, de que as obras tomam parte e que (não raro à contre-goût) tematizam. A interpretação como núcleo metodológico, armada em chave universal das letras e humanidades, até hoje só serviu para trancar todas as portas, para dotar o sistema de uma inércia e esterilidade incomparável: nunca se produziu tanta literatura de baixa qualidade, nunca se produziu tanta ladainha acadêmica. A crítica decidiu que os textos originários ou são ou se dão a perceber como portadores de sentido, e por isso seu objetivo haveria de ser revelar – ou mesmo " desconstruir " – esse sentido; isso entorpeceu a escrita literária, " anestetizou-a " , isto é, porque ela se deu ao narcótico do sentido. A Desconstrução percebeu e acusou, com efeito, a naturalização da ansiedade de " presença " na busca pelo sentido mas reproduziu a mesma miséria idealista ao se recusar a, abandonando os trocadilhos do plano discursivo, sujar as mãos com a pergunta por quão real seria esse mundo e, com esta, quanto dele anseia por transformação, muito para além de sua crise epistêmica ou cognitiva. Sua ofensiva contra a metafísica abriu mão do que estava antes desta, porque hipostasiou o
Dois modos de angolanidade, a fluente e a experimental. (Literaturas Africanas, com o Prof. Dr. ... more Dois modos de angolanidade, a fluente e a experimental.
(Literaturas Africanas, com o Prof. Dr. Pires Laranjeira. Trabalho de disciplina da licenciatura em Estudos Portugueses e Lusófonos)
[ Materialidades da Literatura 2. Estudos Avançados em Materialidades da Literatura (FLUC). Prof.... more [ Materialidades da Literatura 2. Estudos Avançados em Materialidades da Literatura (FLUC).
Prof. Dr. Manuel Portela]
Da Constelação como conceito " á não se sente a violência que as palavras sofrem " , observa Theodor Adorno quanto à exploração racionalizada da linguagem na comunicação massiva. Certa contextura filosófica – crise nominalista, relativismo- acompanha a emergência dos media, a democratização da escrita, a consolidação do positivismo. Entende-se com facilidade Adorno, que é nosso familiar por natureza. A era industrial intensifica esse contexto: a instrumentalização do conhecimento sob imperativos da produção, o caráter utilitário que a informação adquire, solapa o horizonte histórico-social que deu à palavra seus matizes e redu-la a mero material a serviço do significado abstrato. Uma abordagem filológica acusaria a linguística estruturalista de ratificar este declínio ao rasurar as motivações diacrônicas da língua sob um fantasmático sistema sincrônico, ao reiterar a "arbitrariedade"; a miúdos, ao meter os pés pelas mãos. * (Herculano de Carvalho, bibliog.) Essa desconfiança perante a linguagem não é nova; enfaticamente, nominalismo sintetiza a experiência europeia desde a queda da ordo medieval. O " sôbolos rios " camoniano é sintomático, e reflete a situação de estranhamento que o sujeito e sua linguagem (em Camões, sua verve) experienciam: " Como poderei entoar os cânticos de Jerusalém?) O século XX julgou encerrar o assunto abandonando a o que se entenderia como a vacuidade do esforço metafísico. Parece-nos, porém, que a dessublimação estética mais tencionava revelar e reparar este fracasso linguístico. Essa negação motivada despoleta tanto interseccionismo como concretismo, ou o mais do que dejà vu hermético da linguagem transracional; encontramo-la também em práticas menos conhecidas, como a poesia sonora. Elaborações variadíssimas da dissolução das fronteiras verbais; todas, sem exceção, renunciam à garantia da palavra e deslocam o decisivo para a objetivação textual, o corpo de materialidades sonoras e gráficas, a massa conceitual (caso pessoano) e o gesto performático. Curiosa será a " constelação " mallarmeana, que tramita do famoso " Un coup de dés " à filosofia, sobretudo a dialética. Neste âmbito, a última " constelação " surge na paralaxe epistemológica de Zizek, que a coroa: " o olhar do sujeito é sempre já inscrito no objeto percebido, como seu 'ponto cego', como aquilo que 'no objeto é mais do que o próprio objeto', ponto do qual ele mesmo retorna esse olhar ". Seja, na sintaxe constelada, cada termo se determina por intrínseca remissão ao outro. Essa dinâmica é própria à variação paratática, a coordenação. Em seu percurso literário, constelação assinala insubordinação do texto poético à intentio recta, sulcando nexos estruturais à procura do oblíquo: assimetria, desmantelamento do verso, desagregação verbal. Propõe-se não mera " indeterminação " – produto no cotejo entre o literário e a comunicação pragmática – mas a exigência de que os elementos textualmente objectivados entreteçam-se num jogo de forças afins, difusas e concentradas, sem que os astros materiais desapareçam na figura-poema, sem que " poema " signifique acúmulo semântico. " Toute pensée émet un Coup de Dés " , Mallarmé denunciava seu jogo: causalidade, o constrangimento racionalizado do sintagma não é decisivo. O esforço literário de abrir à contingência implica estiolar a comunicação protocolada e, impelindo o desencantamento linguístico aos limites, reafirma certa " magia imanente " à dimensão estético-verbal. Faz-se prova da tese da convencionalidade que detrai os materiais, em certo sentido detraindo-os a própria literatura, a fim de salvaguardar-lhes um " espírito " próprio, substância insolúvel no éter apriórico intencional, então resgatada como experiência que a racionalidade abstrata já não recalca. Lyotard diria " Quelque chose comme: communication... sans communication " , e Beckett, temperamental, " a desecration of silence ". Mas se falamos de uma " magia imanente " à literatura, esta não deve ser entendida senão no sentido forte de imanência. A constelação não é simplesmente um método de arranjo de signos mas tem seu conteúdo naquilo que a forma material visa: que a experiência não seja sobredeterminada pelo fixado por protocolo, que o poema não se resuma a um acúmulo causal de informação mas opere como sintaxe em processo, como força que participa da formação
Materialidades da Literatura
Matheus de Brito Materialidades da Literatura 1, Estudos Avançados em Materialidades da Literatur... more Matheus de Brito
Materialidades da Literatura 1, Estudos Avançados em Materialidades da Literatura (FLUC)
Prof. Dr. Osvaldo Silvestre
A caminho da tecnocultura: a imagem da técnica em Walter Benjamin
A tarefa atual da arte é reintroduzir o caos na ordem. Theodor Adorno Introdução " Materialidades... more A tarefa atual da arte é reintroduzir o caos na ordem. Theodor Adorno Introdução " Materialidades " inicialmente refere-se ao estudo das propriedades físicas dos artefactos; podemos, ou devemos, estender sua compreensão às práticas culturais através dos quais os artefactos se integram à experiência dos indivíduos que compõem a sociedade e fazem a cultura; em outras palavras, ter em conta os objetos com que os sujeitos se deparam-e a cujos constrangimentos específicos devem sujeitar-se com o objectivo de realizar determinados fins-enquanto eles mesmos determinados pelos usos, coerções e fins sociais, e enquadrados em dado contexto histórico. Estender o conceito de " materialidades " dos facta bruta às mediações, como algo de inelutável, tem assim o efeito precisamente oposto. Impõem-se limites epistemológicos às ambições mais universais do pensamento teórico, ao mesmo tempo que surge a oportunidade de corrigir a teoria a partir do estado específico do objeto a que se propõe observar. Ao longo do século XX, a problemática das materialidades desenvolveu-se em diversos âmbitos do conhecimento, uma vez postos em causa e progressivamente dissolvidos os vestígios do pensamento metafísico que os paradigmas epistemológicos ainda conservavam. Nas artes, desde fins do séc. XIX, surgia a intenção de ostentar a aparência de uma inversão radical do paradigma mental vigente na sociedade; com o declínio da subjetividade tanto na ciência quanto na arte, os materiais estéticos foram instituídos como verdade da atividade estética.