Sobre a construção de representações mentais em performance musical (original) (raw)

Representações mentais e performance na clarineta

A performance nos instrumentos de sopro requer a coordenação de diversas habilidades e memórias no processo de construção da interpretação musical. Essa coordenação precisa ser mediada por processos cognitivos organizados e sedimentados a partir de representações mentais dos aspectos musicais, mecânicos, visuais, auditivos e cinestésicos. A partir dos referenciais teóricos de Smith e Kosslyn , Lehman e Davidson , Newell e Simon (1972) e Jeannerod (1995) são discutidos os conceitos de representação mental e suas aplicações na performance da clarineta. Foram realizadas entrevistas com clarinetistas que manifestaram suas práticas de preparo e memorização de obras orquestrais que foram discutidas a partir da literatura de referência.

Reflexões sobre liberdade interpretativa na performance musical dos cantores

ENSAIO: Revista Cultural do Conservatório de Tatuí, 2013

Um dos principais desafios do intérprete musical consiste em conjugar a expressividade imanente a cada obra que executa com aquela que só e1e mesmo consegue dar à performance. Ao mesmo tempo em que a música que se executa pertence a um compositor, a música que se escuta também pertence a um intérprete/executor. Há casos em que ambos são a mesma pessoa, mas na maioria das vezes a elaboração da música que se escuta conta com a colaboração de pelo menos duas inteligências: compositor e intérprete. Essa seria a problemática da performance musical, pois a musica é uma arte que precisa ser recriada no tempo e espaço para ser fruída. A complicação se estende em se tratando da performance de cantores, uma vez que o intérprete vocal é o elo entre o texto e a musica em uma tríplice teia interpretativa poesia-música-intérprete.

Aspectos psicológicos da performance musical e possíveis aplicações didáticas

Anais do XI Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais - SIMCAM 11, 2015

Este texto apresenta uma breve revisão do conceito de EPM-Elementos da Performance Musical com ênfase no aspecto psicológico e discute possibilidades de aplicações didáticas do mesmo no ensino da performance musical, além de apresentar os conceitos de didática e ensino. O objetivo geral é oferecer uma reflexão sobre as possibilidades de inclusão de noções do aspecto psicológico no ensino da performance por profissionais da área de música (instrumentistas, cantores e regentes) a fim de oferecer uma contribuição para a otimização deste ensino. O texto é fruto de reflexão sobre literatura recente publicada sobre o tema.

Crítica às teorias representacionalistas da percepção musical

A grande maioria das atuais teorias de modelização da percepção musical estão inseridas num paradigma representacionalista da cognição e trabalham predominantemente com exemplos baseados em músicas tonais. Estas teorias postulam que nossa percepção realiza uma extração de gestalten do continuum sonoro para formar um grupamento em unidades perceptivas e que, em seguida, nós organizamos estas unidades em uma hierarquização seqüencial. Nesta perspectiva, esta organização perceptiva é vista como uma segmentação da superfície musical. Evidentemente, o principal -e por vezes o único -elemento musical morfofórico (i.e. portador de forma) levado em consideração em tais modelos é a altura musical (i.e. pitch, hauteur, Tonhöhe). Este texto desenvolve uma análise baseada na percepção de músicas não-tonais e em alguns exemplos extraídos da etnomusicologia e propõe uma inversão dos modelos teóricos em questão. Em ressonância com a fenomenologia, a hermenêutica, a fisiologia da ação, a enação e as epistemologias construtivistas, eu entendo a percepção não como um tratamento passivo de informações dos estímulos de um mundo pré-estabelecido, mas como uma ação constitutiva do fenômeno percebido. Neste sentido, perceber as estruturas que compõem uma obra musical é visto não como a realização de uma análise que extrai descontinuidades de uma unidade funcional global, mais uma atividade que faz emergir um continuo articulado à partir dos elementos discretos que formam os "postulados musicais".

A natureza da representação musical na música concreta

Resumo: Em um texto de 1950, Pierre Schaeffer esclarecia o sentido do termo 'concreto' à prática musical que inventara em 1948, enfatizando que o termo designava uma prática composicional que tomava o som gravado fonograficamente, condição a qual construía, por meio de técnicas de manipulação sonora dos estúdios de rádio, sua música. O presente artigo parte desta concepção para analisar tal representação musical (a representação fonográfica) sob o prisma da teoria da arte em Nelson Goodman, além de compará-la com outras inscrições musicais, como a notação neumática e a notação musical moderna. Busca-se assim as particularidades de uma inscrição musical específica totalmente baseada na escuta e manipulação de fonogramasa musique concrète.

MODOS DE REPRESENTAÇÃO DO PENSAMENTO MUSICAL

RESUMO: Neste texto são discutidas diversas questões relacionadas aos modos de representação do pensamento musical. São consideradas as inter-relações entre sensação e representação e feitas observações sobre como os modos de representação da música determinam os campos possíveis de articulações do sonoro -os tipos de materiais musicais e suas formas de organização. Em seguida, após uma abordagem teórica dos conceitos de material musical e modelo, são estudados alguns modelos recorrentes no processo composicional da música de concerto: mapa temporal, tipos texturais, gesto e envelope.

Relações da Musicalidade no Exercício do Raciocínio em Adultos Musicistas

Revista de Psicologia da IMED

Este artigo tem por objetivo compreender a relação entre raciocínio e musicalidade em adultos. Sendo assim, para maior compreensão das habilidades cognitivas influenciadas pela atividade eufônica, uma pesquisa quantitativa foi realizada com 40 musicistas/instrumentistas, entre 18 e 64 anos (Média: 32,35 e DP:11,66), divididos em quatro grupos de acordo com a teoria organológica da execução dos instrumentos: três grupos (corda, sopro ou percussão) e um grupo de multi-instrumentistas. Em cada grupo foi aplicada a Bateria de Provas de Raciocínio (BPR-5), compreendendo as seguintes escalas: Raciocínio Verbal (RV), Raciocínio Numérico (RN), Raciocínio Abstrato (RA) e Raciocínio Espacial (RE). A aplicação das escalas permitiu entender se há relação entre a atividade exercida e/ou instrumento utilizado e o desempenho entre os diferentes tipos de raciocínio. Em relação às escalas, o grupo dos multi-instrumentistas apresentou desempenho melhor, em relação aos demais musicistas, em duas dessa...

Música e a questão da interpretação

anppom.com.br

Este estudo parte do princípio de que música e interpretação são ao mesmo tempo produtos e produtores da cultura. Esse relacionamento recíproco não possui data de nascimento cronologicamente falando, mas se constitui como um fenômeno originário na Cultura Ocidental. Assim, uma investigação histórico-natural do tema se encontra limitada pelo caráter imemorial da inserção do ser humano no mundo. No Ocidente, o relacionamento música/interpretação nos chegou através do legado do mito de Hermes. O presente estudo pretende articular música e interpretação a partir de sua constituição ontológica, bem como através de sua inserção originária e mitológica na cultura ocidental.

A influência da representação visual no ato de compor

Simpósio Internacional de Cognição e Artes Musicais – SIMCAM 4, 2008

Antes da criação de uma notação apropriada, a música era transmitida e preservada pela tradição oral. Com o passar do tempo, os próprios criadores, dependentes unicamente da memória, provavelmente perdiam ou iam modificando suas composições. Isso tudo eventualmente contribuiria para a utilização de formas mais simples, a proliferação de variações, o predomínio da improvisação, etc. Com isso, por falta de registro, todo um universo de tradições musicais estava fadado ao esquecimento, ao desaparecimento numa "pré-história musical". Com a invenção da escrita musical, as canções poderiam ser registradas para a posteridade, tocadas, cantadas e transmitidas por outros que não os próprios autores. Além disso, formas mais complexas começaram a surgir. A composição, que originalmente era uma experiência sonora, uma combinação de idéias tocadas e ouvidas, começa aos poucos a ganhar outra dimensão: o registro das idéias musicais permite uma posterior análise das mesmas e, conseqüentemente, uma elaboração de "estruturas discursivas mais densas e extensas". Um universo de novas ferramentas amplia de forma impressionante as possibilidades do compositor e transforma radicalmente a maneira de se fazer e ouvir música no ocidente. À medida que os processos de criação musical vão se afastando da experiência meramente sensorial para se aprofundar no desenvolvimento de estruturas intelectualmente muito mais complexas, o ato de compor começa a se transformar cada vez mais numa experiência espaçovisual, uma exploração de possibilidades matemático-geométricas. A escrita musical, ferramenta criada para representar a música, passa a ser, ela própria, o objeto a ser criado, analisado e julgado, muitas vezes em detrimento de seu resultado sonoro. É certo que processos como a retrogradação (execução de uma linha melódica de trás para frente) ou o dodecafonismo (técnica composicional baseada numa seqüência com as 12 notas cromáticas, sem que nenhuma seja repetida até que as outras 11 sejam tocadas), que só músicos muito bem treinados podem identificar simplesmente pela audição, são frutos diretos dessa tecnologia gráfica para compor, porém, a despeito de toda as possibilidades que a escrita musical trouxe, como em qualquer forma de representação, ela possui limites e também "facilidades" tendenciosas. A música feita no ocidente nos últimos séculos, com a predominância de métricas regulares e o abandono dos intervalos microtonais, foi um fruto direto dos limites desta forma de representação musical. No começo do século XX, alguns compositores começam a explorar novos recursos, fazendo uso de equipamentos elétricos e eletrônicos, acabam por desenvolver uma linguagem com ênfase em sonoridades impossíveis de serem obtidas pelos meios acústicos convencionais. Uma música que os instrumentos tradicionais não poderiam produzir, instrumentistas não poderiam executar e para qual a escrita convencional não apresentava soluções. A música dispensava a escrita, rompia sua relação com a representação gráfica em prol de uma experiência estritamente sonora. Com essa prática, a criação musical voltava a ganhar espaço como experiência auditiva em vez de visual. Atualmente, com os computadores, seqüenciadores MIDI editores não-lineares de áudio e tantas novas ferramentas privilegiando e facilitando a experiência da "composição auditiva", estaria a escrita musical tradicional fadada a extinção?