O ‘Monstro’ e o ‘Homem’: Aspectos da construção institucional de mortos no Instituto Médico Legal do Rio de Janeiro (original) (raw)

“Matar o morto”: a construção institucional de mortos no Instituto Médico-Legal do Rio de Janeiro

2012

Esta dissertação aborda os processos de construção institucional de um morto no Instituto Médico-Legal do Rio de Janeiro - IML, destacando as relações sociais ativadas a partir dos procedimentos burocráticos realizados pelos policiais civis em relação aos cadáveres. Busca identificar como auxiliares e técnicos de necrópsia, papiloscopistas, peritos médico-legais e outros funcionários do IML interagem entre si e com os mortos seja através da burocracia público-estatal, seja através de procedimentos de identificação e exames necroscópicos, ou pelos sentidos e sentimentos envolvidos na relação cotidiana de trabalho com os cadáveres. Dessa maneira, pretende-se elucidar como corpos sem vida são construídos enquanto pessoas sem vida e como cotidianamente se dá essa construção. As questões tratadas nesta dissertação, fruto de pesquisa etnográfica, estão estruturadas a partir da representação, das práticas e das narrativas daqueles que trabalham na instituição e de suas relações com os vivos e os mortos.

O caminho burocrático da morte e a máquina de fazer desaparecer: propostas de análise da documentação do Instituto Médico Legal-SP para antropologia forense

Resumo O artigo traz um panorama sobre a pesquisa desenvolvida com a documentação do Instituto Médico Legal de São Paulo (IML-SP), sob guarda do Arquivo Público do Estado de São Paulo, no âmbito dos trabalhos de buscas de desaparecidos e mortos políticos desenvolvido pela Antropologia Forense para tentativa de identificação dos remanescentes humanos encontrados na Vala Clandestina de Perus (SP). Foram analisadas três séries documentais (exames necroscópicos, declarações de óbito e livros de fotografias) como passo fundamental frente à desmaterialização e fugacidade acarretadas pelas políticas de desaparecimento. O objetivo foi o de seguir o caminho burocrático da morte, porém, a pesquisa elucidou os mecanismos de desaparecimento e de produção de desconhecidos do período, permitindo uma compreensão de como estratégias repressivas utilizaram um sistema institucionalizado, já em andamento, para também forçar o desaparecimento de opositores do regime. Palavras-chave: Desaparecimento forçado. Antropologia Forense. Instituto Médico Legal. Abstract The article provides an overview of the research carried out with documentation of the Legal Medical Institute of São Paulo (IML-SP), under the custody of the São Paulo Public Archive, as part of the search work developed by Forensic Anthropology to attempt to identify the human remains found in a mass grave called Vala de Perus (SP). Three documentary series were analyzed (necropsy reports, death certificates and photo books) as a fundamental step forward dematerialisation and transience brought about by the disappearance policies. The aim was to follow the bureaucratic way of death, however, the research has elucidated the disappearance mechanisms and the production of people

"Linhas de investigação": técnicas e moralidades policiais na gestão de mortos na região metropolitana do Rio de Janeiro 1

Resumo No presente trabalho descrevo processos de investigação por policiais civis referente ao homicídio de um jovem negro com o objetivo de refletir sobre o fluxo de relações entre pessoas e coisas que se dão nas "linhas de investigação". O trabalho de campo realizado em 2014, no âmbito da Divisão de Homicídios de Niterói, Itaboraí e São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, permitiu compreender certos procedimentos técnicos acionados em uma investigação policial, bem como identificar valores morais e interesses articulados na gestão de mortos conduzidos burocrática e operacionalmente pelos policiais que lidavam com "homicídios". Nesta análise etnográfica considero os processos institucionais de administração de mortes naquele contexto para identificar a multiplicidade de técnicas e moralidades acionadas pelos agentes investidos dos poderes "de polícia" e "da polícia" que serviam para elaborar e definir aquilo que denominavam de "linhas de investigação", construindo uma "verdade policial" sobre um "homicídio". Palavras-chave: mortos; polícia; investigação de homicídios; linhas; Rio de Janeiro. Abstract In this work I describe several processes of investigation by civil police concerning a homicide of a young black man with the purpose of reflecting on the flow of relations between people and things that take place as "lines of investigation". Fieldwork conducted in 2014 within the Homicide Division of Niterói, Itaboraí and São Gonçalo, in the metropolitan area of Rio de Janeiro, allowed me to understand technical procedures triggered in a police investigation, as well as moral values and interests were articulated in the management of deaths conducted bureaucratically and operationally by policemen.

Dois Anos De Antropologia Forense No Centro De Medicina Legal (Cemel) Da Faculdade De Medicina De Ribeirão Preto-Usp

Medicina (Ribeirão Preto), 2008

A Antropologia Forense é uma área do conhecimento que busca estabelecer a identidade de um sujeito através da individualização de características intrínsecas a ele. O Centro de Medicina Legal (CEMEL) da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) possui um Laboratório de Antropologia Forense, criado em parceria com a University of Sheffield (UK), que elaborou um protocolo para análise de ossadas e esforça-se para desenvolver um trabalho mais confiável, que permita resultados sociais e científicos de alta qualidade. Após dois anos de funcionamento, constatou-se que muitas das ossadas encaminhadas ao CEMEL não possuem elementos que são de extrema importância para a realização do exame antropológico, o que pode evitar a elaboração de um perfil biológico adequado da ossada e, em virtude disso, postergar a sua identificação. Considerando-se que não há dados antropológicos recentes na literatura nacional sobre casos médico-legais de ossadas, este é o pr...

A saúde mental dos auxiliares médico-legais na atividade de serviços de necropsia no instituto médico legal no extremo-oeste catarinense

Vittalle Revista De Ciencias Da Saude, 2015

RESUMO Esta pesquisa teve como objetivo conhecer e discutir os sentimentos diante dos atendimentos de necropsia e como está a saúde mental dos auxiliares médico-legais que atuam no IML no extremooeste catarinense. A intenção foi lançar um olhar sobre o fazer destes profissionais que lidam com a morte, tema ainda considerado tabu e de difícil manejo para grande parte dos profissionais da saúde. Para realizar o estudo de campo, utilizou-se o método qualitativo fenomenológico, com entrevistas que se iniciaram com uma questão aberta: Como tu te sentes no momento em que estás fazendo a necropsia? Foram entrevistados três auxiliares médicos legais, com tempo de atuação na área de vinte e sete anos; dezenove e outro com um ano. Compreendeu-se que os sentimentos que advêm do momento das necropsias são, muitas vezes, de completa impotência diante da morte e de autocontrole para evitar o choro e a expressão de sentimentos. O pedido de ajuda não manifestado, muitas vezes, revela sentimentos de vergonha e cobrança sentidos como oriundos da sociedade. Estes profissionais percebem como refúgio a presença e a confiança dos familiares e amigos. A perda dos próprios familiares também aparece como fator que provoca grande abalo emocional. A presença e o afeto da família são considerados importantes para esses profissionais, pois funcionam como alento ante as dores que carregam, mesmo que no silêncio. Fica evidente, neste estudo, a necessidade de apoio emocional para os profissionais. Não há um espaço de escuta apropriado para a expressão de sentimentos e vivências. O espaço de escuta é buscado no seio da família e no contato com amigos. Não há um serviço especializado para o acompanhamento sistemático a esses profissionais, fator que pode levar à doença mental ou, no mínimo, ao excesso de estresse e diminuição da qualidade de vida. PALAVRAS-CHAVE: Sentimentos de auxiliares médico-legais. Profissionais diante da necropsia. Morte. Saúde mental ABSTRACT THE MENTAL HEALTH OF NECROPSY ASSISTANTS AT THE LEGAL MEDICAL INSTITUTE IN THE WEST OF THE STATE OF SANTA CATARINA This study aims to understand and discuss the feelings that necropsy assistants have and what are the general mental health conditions of such professionals who work in the west of the State of Santa Catarina. The intention was to analyze the duties and responsibilities of these workers, who must deal so closely with death-a topic that is still considered a taboo and a difficult situation to handle for most health professionals. For the field study, the phenomenological qualitative method was used. The interview started with the open-ended question: How do you feel when you are performing necropsy? Three necropsy assistants, who have been working in the field for twentyseven, nineteen and one year, respectively, were interviewed. The professionals reported that they feel impotent before death and that they need to use their self-control in order to avoid crying and expressing feelings during the autopsies. Unmanifested request for help often reveals feelings of shame and pressure that comes from society. These professionals have the presence and the trust of their family and friends as an em otional refuge. The loss of their own family members is also a factor that causes great emotional upheaval. The presence and affection of family is considered very important for these professionals, since they are an encouragem ent that helps them carry their pain, even if in silence. This study evidences the need that autopsy assistants have for em otional support. There is no suitable listening space for them to express their feelings and experiences. A listening space is found within the family unit and through contact with friends. There is no specialized service for the systematic monitoring of these professionals, a factor that can lead to mental illness or, at least, to excessive stress and poor quality of life.

O morto no lugar dos mortos: classificações, sistemas de controle e necropolítica no Rio de Janeiro

Revista M

Neste artigo apresento reflexões elaboradas a partir das etnografias que realizei em instituições policiais que atuam na gestão de mortes e mortos na região metropolitana do Rio de Janeiro/Brasil entre 2010 a 2014. Particularmente, apresento dados produzidos no âmbito do Instituto Médico-Legal e da Divisão de Homicídios para demonstrar como a violência que produz mortos é tratada pelos mecanismos de classificação e poder mobilizados por um estado, através de suas instituições policiais. Por práticas, burocracias e moralidades, demonstro como agentes policiais organizam um regime necropolítico presente, tanto pela centralidade da morte no cotidiano dos sujeitos e instituições quanto na multiplicidade de tempos e espacialidades que os mortos constituem. Neste sentido, abordo o papel do controle estatal da vida social dos mortos, para discutir o que os mortos alvo da violência submetidos a essa política de morte podem vir a produzir. Palavras-chave: Mortos-Sistemas classificatórios-Controles estatais-Governo-Necropolítica ABSTRACT: In this article, I present reflections based on ethnographies that I have conducted in police institutions that work in the management of death and dead people in the metropolitan region of Rio de Janeiro / Brazil between 2010 and 2014. I particularly present data produced within the scope of the Medical-Legal Institute and Homicide Division to demonstrate how violence that produces dead is treated by the mechanisms of classification and power mobilized by the state, through its police institutions. By means of practices, bureaucracies and moralities, they demonstrate how police agents organize a necropolitical regime both by the centrality of death in the daily life of subjects and institutions, and by the multiplicity of times and spatiality that the dead constitute. In this sense, I intend to address the role of state control of the social life of the dead, to discuss what the dead targets of violence submitted to this death policy may produce.

Profissionais do Serviço Funerário e a Questão da Morte

Psicologia: Ciência e Profissão, 2014

Este artigo aborda a questão da morte no cotidiano de trabalho de profissionais funerários. Profissionais de funerária têm condições de trabalho com risco físico e psíquico com possibilidade de desenvolvimento de burnout. Há sobrecarga de trabalho, contato com famílias enlutadas, sem ter preparo para essas tarefas. Não escolheram sua profissão, não têm capacitação nem órgão de classe que os represente. São vistos com desconfiança quando os trabalhos são cobrados ou há demora para realizar os trâmites necessários. São analisados fatores que podem tornar seu trabalho difícil: mortes violentas, suicídio, corpos deteriorados e crianças. Consideramos esses profissionais como cuidadores do corpo morto e de famílias enlutadas. São discutidas formas de cuidados a esses profissionais: luto, famílias, expressão de sentimentos e rituais, e também responder às questões pessoais. Foram oferecidas informações e esclarecimentos sobre modalidades de cuidado pessoal e psicológico.