Ana Carolina Estrela da Costa | Universidade de São Paulo (original) (raw)
Tese de doutorado by Ana Carolina Estrela da Costa
Os Tikmũ´ũn, também conhecidos como Maxakali, habitam uma pequena área designada pelo Estado no V... more Os Tikmũ´ũn, também conhecidos como Maxakali, habitam uma pequena área designada pelo Estado no Vale do Mucuri, no norte de Minas Gerais. Muito mais amplos, seus territórios tradicionais, devastados por uma colonização violenta, abrangem quase todo o Vale do Jequitinhonha, até sua foz na Bahia, alcançando áreas de trânsitos e trocas com povos Pataxó, no sul da Bahia, e de conflitos com povos Botocudo, na região do Vale do Rio Doce. Através dos séculos, os Tikmũ´ũn enfrentaram todo o tipo de ameaças ao seu trânsito: o extermínio da colonização, o surgimento das cidades, o avanço das pastagens, das doenças, o espólio das terras e a violência dos fazendeiros, e, mais recentemente, o proselitismo religioso infiltrado em instituições estatais, políticas públicas desastrosas, e todo o tipo de extorsão por parte de comerciantes locais. No entanto, seu sofisticado sistema cosmopolítico, através das alianças com os encantados-cantores yãmĩyxop, mantém vivos entre eles inumeráveis seres da Mata Atlântica, seus saberes, suas memórias, seus trânsitos, suas ligações com seu território. Mobilizados por saudades e desejos de (re)encontros, os Tikmũ´ũn continuam a traçar seus percursos, seja caminhando por semanas através das cercas e estradas, seja cantando por noites a fio com seus aliados de outros mundos.
O objetivo desta tese de doutorado é descrever modos como os Tikmũ´ũn percorrem e habitam seus territórios, e como propõem e atualizam relações entre si, com os Yãmĩyxop e outros aliados, em seus deslocamentos. A partir das relações cosmopolíticas entre as diversas gentes que partilham experiências sensíveis com os Tikmũ´ũn, nas quais o olhar e a escuta aparecem como aptidões fundamentais para o estabelecimento e a celebração de encontros e alianças, se desdobram processos de conhecimento, de produção de subjetividades e territorialidades.
Papers by Ana Carolina Estrela da Costa
r@u, 2023
Os Tikmũ'ũn 2 , também conhecidos como Maxakali, vivem confinados em pequenos territórios na regi... more Os Tikmũ'ũn 2 , também conhecidos como Maxakali, vivem confinados em pequenos territórios na região nordeste do estado de Minas Gerais. Ainda hoje, em suas viagens, costumam percorrer as cidades que foram construídas sobre as aldeias de seus antepassados, nas bacias dos rios Mucuri, Jequitinhonha e Doce, pelo sul da Bahia, leste de Minas Gerais e norte do Espírito Santo. A principal razão pela qual trilham seus caminhos ancestrais, dizem, é estabelecer novas alianças, mas também relembrar e celebrar alianças mais antigas com uma miríade de seres que outrora habitaram a Mata Atlântica. Seu modo de ocupação tradicional do território, sempre em mobilidade (Estrela da Costa 2015, 2022), permite que se estabeleçam encontros: alguns bons, outros maus, alguns com trocas imediatas, outros com predação e consumo produtivo (Fausto [2001] 2014), e outros ainda que engendram longos processos de domesticação, sedução, amansamento, encantamentos. E o que os interessa particularmente em suas experiências relacionais é o potencial de que daí surjam ou sejam adquiridos seu bem mais precioso: os cantos
Compartilhando reflexões geralmente consideradas residuais, no contexto de uma abordagem teórica ... more Compartilhando reflexões geralmente consideradas residuais, no contexto de uma abordagem teórica e descritiva que toma um campo como objeto, este ensaio não traz, propriamente, uma descrição etnográfica a respeito dos coletivos de pixação em capitais brasileiras com os quais a autora teve oportunidade de trabalhar nos últimos anos. Narra-se, aqui, um processo no qual esse campo vai se definindo, na medida em que o lugar da etnógrafa vai sendo constituído por sua própria experiência de ser afetada por este campo. A pixação como inscrição - poética e política - da diferença na cidade, e a etnografia como inscrição da diferença no plano antropológico, encontram-se e afetam-se neste percurso.
Palavras chaves :Pixação, etnografia, método afetivo.
Sharing reflections generally considered residual in the context of a theoretical and descriptive approach taking a field as an object, this essay does not bring, itself, an ethnographic description about the "pixação" gangs in Brazilian capitals with which the author had the opportunity to work in recent years. What is narrated here is a process in which this field is settled, while the place of the ethnographer is being made by her own experience of being affected by this field. Pixação as a poetical and political inscription of the difference in the city, and ethnography as an inscription of the difference in the anthropological plan, meet and affect themselves in this path.
Keywords :Pixação, ethnography, affective method.
Examinando realizações cinematográficas entre ameríndios e a crescente demanda por formação de ci... more Examinando realizações cinematográficas entre ameríndios e a crescente demanda por formação de cineastas e circulação de seus filmes, percebemos que, se a apropriação de instrumentos metodológicos e meios de produção ainda é restrita e controlada, o cinema, de natureza relacional e dinâmica, permite, como tecnologia de produzir e descrever eventos a partir do experiência sensível, que realizadores indígenas o coloquem com mais autonomia à serviço de seus modos coletivos de formular narrativas, produzir relações e experiências sensíveis e fazer circularem saberes. As referências advindas da tradição científica-cristã são acolhidas, mas seu olhar e sua escuta – especialidade dos povos xamânicos – não são capturadas pelo modo de produção de imagens e saberes do cinema e da antropologia advindos desta tradição. Veremos como o exercício rigoroso de olhar sob ângulos distintos para que relações emerjam e se complexifiquem das análises mitológicas de Lévi-Strauss e da Ciência do Concreto é uma habilidade fundamental não só para a antropologia, mas, principalmente, para a realização cinematográfica.
Resumo: Ao contrário de uma lógica que divide o mundo entre humanidades subjetivas e uma natureza... more Resumo: Ao contrário de uma lógica que divide o mundo entre humanidades subjetivas e uma natureza objetiva universal, pensamentos ameríndios nos trazem novas formas de ver relações entre humanos, animais e seus outros, e entre visível
e invisível. O olhar e a escuta assumem dimensões relacionais no xamanismo, nas caçadas, nas pescarias e também no cinema. A partir dessa chave, examinando alguns filmes em que a pesca aparece, especialmente entre o povo indígena Maxakali, aproximamos a atitude do cineasta-etnógrafo àquela de um pescador.
Palavras-chave: Documentário Etnográfico. Maxakali. Filme-Ritual. Filme-Pesca.
Abstract: Unlike a logic that divides the world between subjective humanities and a universal objective nature, Amerindians thoughts bring us new ways of seeing relations between humans and animals, and between visible and invisible. The exercises of seeing and hearing assume relational dimensions in shamanism, in hunting and fishing, and also in the cinema. From this key, by examining cases where fishing appears in some films, especially among the indigenous people Maxakali, we approach the attitude of the director-ethnographer to a fisherman.
Keywords: Ethnographic documentary. Maxakali/Tikmu’un. Ritual-film. Fishing-film.
Résumé: Contrairement à une logique qui divise le monde entre les humanités subjectives et une nature universelle objectif, certaines pensées amérindiens nous apportent des nouvelles façons de voir les relations entre les humains, les animaux
et leurs autres, et entre le visible et l’invisible. Le regarde et l’écoute gagnent dimensions relationnelles dans le chamanisme, la chasse et la pêche, ainsi que dans le cinéma. À partir de cette clé, en examinant quelques films où l’activité de la pêche apparaît, en particulier parmi les populations autochtones maxakali, nous
approchons l’attitude du cinéaste-ethnologue à celle d’un pêcheur.
Mots-clés: Documentaire ethnographique. Maxakali/Tikmu’un. Film-rituel. Film-pêche.
18o Congresso Mundial IUAES, 2018, Florianópolis. Conference Proceedings Anais. FLORIANÓPOLIS: Tribo Ilha, 2018. v. 18. p. 260-265. , 2018
Resumo: Os Tikmũ´ũn/Maxakali recusam radicalmente limites e padrões impostos pelo violento proces... more Resumo: Os Tikmũ´ũn/Maxakali recusam radicalmente limites e padrões impostos pelo violento processo de colonização da região. Falam seu idioma, manejam remédios e venenos dos brancos, gastam seu dinheiro com fogos de artifício, cachaça e rituais quase diários, endividando-se em estabelecimentos comerciais que os exploram criminosamente. Mantém um corpus mítico-sonoro com dezenas de rituais e milhares de cantos que celebram e atualizam relações com seres encantados-cantores da Mata Atlântica-yãmĩy-, e descrevem, em experiências xamânicas dias e noites a fio, com exuberância de detalhes, animais, plantas, lugares e eventos que dão vida a seus territórios hoje contaminados e devastados por pastagens. As cidades e fazendas em torno-muitas delas antigas aldeias, onde os pajés ainda escutam cantos ressoando, indicando a presença de yãmĩy ancestrais-são hoje território de relações hostis e abusivas com comerciantes e fazendeiros. O desejo de estabelecer e alimentar alianças com esse aspecto à princípio invisível da alteridade, que se compõe com o costume de caminhar até locais antigos e novos, (re)encontrar parentes de outras etnias, aliados xamânicos-e seus cantos e saberes-, os próprios brancos-e a cachaça, o forró, o açúcar-, frequentemente faz com que grupos de Tikmũ´ũn saiam das aldeias e caminhem, por dias ou semanas, sob chuva ou sol, avançando por cercas e estradas, percorrendo seu território. Ao fim das viagens, como ao fim dos rituais, cantam lamentando de saudades. Palavras Chave: "Tikmũ´ũn/Maxakali";"Territorialidade";"Xamanismo";"Circulação" Os Tikmũ´ũn/Maxakali compõem seus modos de pensar e experimentar o mundo, sua produção e partilha de saberes, suas relações entre si, entre seus outros (fazendeiros, parentes, aliados), e com os lugares por onde passam e habitam, com as relações que estabelecem e atualizam com os yãmĩyxop (o sufixo xop funciona como um coletivizador e dinamizador), os "povos-cantores", ou "povos-encantados" que adensam seu universo. Ou seja, não há separação entre o que seria uma esfera religiosa e performática (seus rituais, seus cantos e danças, suas pinturas) e dimensões relativas a sua ciência, política, estética. Todo dia é dia de ritual, e todas as pessoas são pais e mães que alimentam e conduzem yãmĩy, donos de cantos. É com os yãmĩy que os Maxakali caçam, cantam, brincam e realizam curas, e realizam suas práticas de memória, seus percursos territoriais, seus conhecimentos sobre o mundo, seus modos de se relacionar e se transformar, sua produção de subjetividades (Guattari, 2012 [1992]). Os cantos são polifônicos em todos os 1
recherches amérindiennes au quebec, 2018
PROA
Este relato narra a experiência de concepção e construção da plataforma virtual "Mirando Mundos P... more Este relato narra a experiência de concepção e construção da plataforma virtual "Mirando Mundos Possíveis: (Re)Existir e Curar", que reúne uma série de produções audiovisuais realizadas por povos indígenas durante o período da pandemia. O mosaico de vídeos criado a partir desta experiência emerge como uma potente expressão de como povos indígenas, em sua multiplicidade, oferecem perspectivas igualmente múltiplas acerca deste momento dilatado de rupturas. A criação desta plataforma insere-se em meio à recente trajetória de formação da Rede CineFlecha, uma rede que articula diversos coletivos indígenas de cinema junto a seus parceiros não-indígenas.
Resumo: No Brasil, a pixação tem-se desenvolvido de modo expressivo, como arte política e margina... more Resumo:
No Brasil, a pixação tem-se desenvolvido de modo expressivo, como arte política e marginal, desde os anos 70. Essencialmente contestador, incômodo, o pixo não só destrói: essa escrita inaugura uma visibilidade dos que a fazem, compondo a paisagem urbana. Pixadores são punidos como vândalos, formadores de “quadrilha”, e a lei e demais medidas alimentam a discriminação em torno deles (distinguindo a pixação do “graffite”, por exemplo, tratando uma como arte e outra como puro vandalismo). Examinamos aqui seu modo refinado de conhecer e percorrer o território da cidade, e suas formas de organização, que nada têm de quadrilhas criminosas, aproximando-se mais de reuniões artísticas. A partir da experiência etnográfica compartilhada com pixadores em Belo Horizonte e demais capitais, traçamos referências históricas, registramos estilos caligráficos e tipos de mensagens. Num processo de ampliação do olhar, percebe-se a elaboração sofisticada de um discurso que protesta - por meio do risco - contra o próprio Estado, levando às últimas consequências o questionamento do poder de polícia, da circulação da informação, do direito de ir-e-vir e da propriedade privada.
Palavras Chave: Pixação. Arte política.
“PIXO”: The poetic politic of scratches and risks
Abstract:
In Brazil, “pixação” has developed significantly since the 70s, as a political outsider art – similar to tagging. Essentially challenging, uncomfortable, the “pixo” not only destroys: that writing opens a visibility, composing the urban landscape. “Pixadores” are punished as vandals from “gangs”, and Law and policies feed discrimination around them (distinguishing pixação from “graffiti”, for example, treating one as art and another as vandalism) , but we examine their refined way to meet and go through the territory of the city, and their forms of organization, which has nothing to do with criminal gangs, approaching more to artistic meetings. From the ethnographic experience shared with pixadores in Belo Horizonte and other capitals, we draw historical references, recorded calligraphic styles and types of messages. In a process of understanding, we see the development of a sophisticated speech protesting - through risk - against the state, leading to its ultimate consequences the questioning of police power, the circulation of information, the right to go up and come and private property.
Keywords: Pixação, Political Art.
Dissertação de Mestrado by Ana Carolina Estrela da Costa
Este trabalho de mestrado propõe, a partir de descrições etnográficas produzidas entre o povo Max... more Este trabalho de mestrado propõe, a partir de descrições etnográficas produzidas entre o povo Maxakali, um breve exame de sua recente realização cinematrográfica no contexto cosmopolítico percebido e produzido durante a formação de cineastas e a realização de filmes. Tento conciliar uma reflexão a respeito de ações cosmopolíticas Maxakali, partindo principalmente das contribuições do antropólogo Renato Sztutman, com entendimentos acerca do cinema como experiência estética e política, conforme nos propõe o filósofo Jacques Rancière, e como possibilidade de criação etnográfica compartilhada, como sugerido pelo etnólogo-cineasta Jean Rouch. O objetivo é apresentar uma etnografia dos processos de formação de cineastas e nos quais esses filmes são feitos: os momentos de negociação, elaboração, produção das imagens e dos encontros que essas imagens provocam, nos quais tal tecnologia é apropriada por eles em ressonância com seus próprios modos de pensamento e organização. Veremos de que modo os pajés e os caciques parecem ter encontrado um lugar que parece sugerir uma íntima aproximação entre linguagens e ações no âmbito da política, do xamanismo e do cinema. Afinal, o cinema parece apropriado para a experiência de eventos-encontros que se produzem nas aldeias, e para o estabelecimento de novas alianças e trocas de saberes fora delas.
Palavras-chave: Maxakali, Cosmopolítica, Cinema.
Outros textos by Ana Carolina Estrela da Costa
antropologia e o cinema, campos, para ele, inseparáveis. Sua obra e pensamento encontram repercus... more antropologia e o cinema, campos, para ele, inseparáveis. Sua obra e pensamento encontram repercussão nos dois domínios, sendo que sua extensa produção de filmes etnográficos-mais de 120 filmes, a maioria produzida na África ocidental-se sobrepõe, do ponto de vista dos rebatimentos posteriores, aos seus escritos.
Os Tikmũ´ũn, também conhecidos como Maxakali, habitam uma pequena área designada pelo Estado no V... more Os Tikmũ´ũn, também conhecidos como Maxakali, habitam uma pequena área designada pelo Estado no Vale do Mucuri, no norte de Minas Gerais. Muito mais amplos, seus territórios tradicionais, devastados por uma colonização violenta, abrangem quase todo o Vale do Jequitinhonha, até sua foz na Bahia, alcançando áreas de trânsitos e trocas com povos Pataxó, no sul da Bahia, e de conflitos com povos Botocudo, na região do Vale do Rio Doce. Através dos séculos, os Tikmũ´ũn enfrentaram todo o tipo de ameaças ao seu trânsito: o extermínio da colonização, o surgimento das cidades, o avanço das pastagens, das doenças, o espólio das terras e a violência dos fazendeiros, e, mais recentemente, o proselitismo religioso infiltrado em instituições estatais, políticas públicas desastrosas, e todo o tipo de extorsão por parte de comerciantes locais. No entanto, seu sofisticado sistema cosmopolítico, através das alianças com os encantados-cantores yãmĩyxop, mantém vivos entre eles inumeráveis seres da Mata Atlântica, seus saberes, suas memórias, seus trânsitos, suas ligações com seu território. Mobilizados por saudades e desejos de (re)encontros, os Tikmũ´ũn continuam a traçar seus percursos, seja caminhando por semanas através das cercas e estradas, seja cantando por noites a fio com seus aliados de outros mundos.
O objetivo desta tese de doutorado é descrever modos como os Tikmũ´ũn percorrem e habitam seus territórios, e como propõem e atualizam relações entre si, com os Yãmĩyxop e outros aliados, em seus deslocamentos. A partir das relações cosmopolíticas entre as diversas gentes que partilham experiências sensíveis com os Tikmũ´ũn, nas quais o olhar e a escuta aparecem como aptidões fundamentais para o estabelecimento e a celebração de encontros e alianças, se desdobram processos de conhecimento, de produção de subjetividades e territorialidades.
r@u, 2023
Os Tikmũ'ũn 2 , também conhecidos como Maxakali, vivem confinados em pequenos territórios na regi... more Os Tikmũ'ũn 2 , também conhecidos como Maxakali, vivem confinados em pequenos territórios na região nordeste do estado de Minas Gerais. Ainda hoje, em suas viagens, costumam percorrer as cidades que foram construídas sobre as aldeias de seus antepassados, nas bacias dos rios Mucuri, Jequitinhonha e Doce, pelo sul da Bahia, leste de Minas Gerais e norte do Espírito Santo. A principal razão pela qual trilham seus caminhos ancestrais, dizem, é estabelecer novas alianças, mas também relembrar e celebrar alianças mais antigas com uma miríade de seres que outrora habitaram a Mata Atlântica. Seu modo de ocupação tradicional do território, sempre em mobilidade (Estrela da Costa 2015, 2022), permite que se estabeleçam encontros: alguns bons, outros maus, alguns com trocas imediatas, outros com predação e consumo produtivo (Fausto [2001] 2014), e outros ainda que engendram longos processos de domesticação, sedução, amansamento, encantamentos. E o que os interessa particularmente em suas experiências relacionais é o potencial de que daí surjam ou sejam adquiridos seu bem mais precioso: os cantos
Compartilhando reflexões geralmente consideradas residuais, no contexto de uma abordagem teórica ... more Compartilhando reflexões geralmente consideradas residuais, no contexto de uma abordagem teórica e descritiva que toma um campo como objeto, este ensaio não traz, propriamente, uma descrição etnográfica a respeito dos coletivos de pixação em capitais brasileiras com os quais a autora teve oportunidade de trabalhar nos últimos anos. Narra-se, aqui, um processo no qual esse campo vai se definindo, na medida em que o lugar da etnógrafa vai sendo constituído por sua própria experiência de ser afetada por este campo. A pixação como inscrição - poética e política - da diferença na cidade, e a etnografia como inscrição da diferença no plano antropológico, encontram-se e afetam-se neste percurso.
Palavras chaves :Pixação, etnografia, método afetivo.
Sharing reflections generally considered residual in the context of a theoretical and descriptive approach taking a field as an object, this essay does not bring, itself, an ethnographic description about the "pixação" gangs in Brazilian capitals with which the author had the opportunity to work in recent years. What is narrated here is a process in which this field is settled, while the place of the ethnographer is being made by her own experience of being affected by this field. Pixação as a poetical and political inscription of the difference in the city, and ethnography as an inscription of the difference in the anthropological plan, meet and affect themselves in this path.
Keywords :Pixação, ethnography, affective method.
Examinando realizações cinematográficas entre ameríndios e a crescente demanda por formação de ci... more Examinando realizações cinematográficas entre ameríndios e a crescente demanda por formação de cineastas e circulação de seus filmes, percebemos que, se a apropriação de instrumentos metodológicos e meios de produção ainda é restrita e controlada, o cinema, de natureza relacional e dinâmica, permite, como tecnologia de produzir e descrever eventos a partir do experiência sensível, que realizadores indígenas o coloquem com mais autonomia à serviço de seus modos coletivos de formular narrativas, produzir relações e experiências sensíveis e fazer circularem saberes. As referências advindas da tradição científica-cristã são acolhidas, mas seu olhar e sua escuta – especialidade dos povos xamânicos – não são capturadas pelo modo de produção de imagens e saberes do cinema e da antropologia advindos desta tradição. Veremos como o exercício rigoroso de olhar sob ângulos distintos para que relações emerjam e se complexifiquem das análises mitológicas de Lévi-Strauss e da Ciência do Concreto é uma habilidade fundamental não só para a antropologia, mas, principalmente, para a realização cinematográfica.
Resumo: Ao contrário de uma lógica que divide o mundo entre humanidades subjetivas e uma natureza... more Resumo: Ao contrário de uma lógica que divide o mundo entre humanidades subjetivas e uma natureza objetiva universal, pensamentos ameríndios nos trazem novas formas de ver relações entre humanos, animais e seus outros, e entre visível
e invisível. O olhar e a escuta assumem dimensões relacionais no xamanismo, nas caçadas, nas pescarias e também no cinema. A partir dessa chave, examinando alguns filmes em que a pesca aparece, especialmente entre o povo indígena Maxakali, aproximamos a atitude do cineasta-etnógrafo àquela de um pescador.
Palavras-chave: Documentário Etnográfico. Maxakali. Filme-Ritual. Filme-Pesca.
Abstract: Unlike a logic that divides the world between subjective humanities and a universal objective nature, Amerindians thoughts bring us new ways of seeing relations between humans and animals, and between visible and invisible. The exercises of seeing and hearing assume relational dimensions in shamanism, in hunting and fishing, and also in the cinema. From this key, by examining cases where fishing appears in some films, especially among the indigenous people Maxakali, we approach the attitude of the director-ethnographer to a fisherman.
Keywords: Ethnographic documentary. Maxakali/Tikmu’un. Ritual-film. Fishing-film.
Résumé: Contrairement à une logique qui divise le monde entre les humanités subjectives et une nature universelle objectif, certaines pensées amérindiens nous apportent des nouvelles façons de voir les relations entre les humains, les animaux
et leurs autres, et entre le visible et l’invisible. Le regarde et l’écoute gagnent dimensions relationnelles dans le chamanisme, la chasse et la pêche, ainsi que dans le cinéma. À partir de cette clé, en examinant quelques films où l’activité de la pêche apparaît, en particulier parmi les populations autochtones maxakali, nous
approchons l’attitude du cinéaste-ethnologue à celle d’un pêcheur.
Mots-clés: Documentaire ethnographique. Maxakali/Tikmu’un. Film-rituel. Film-pêche.
18o Congresso Mundial IUAES, 2018, Florianópolis. Conference Proceedings Anais. FLORIANÓPOLIS: Tribo Ilha, 2018. v. 18. p. 260-265. , 2018
Resumo: Os Tikmũ´ũn/Maxakali recusam radicalmente limites e padrões impostos pelo violento proces... more Resumo: Os Tikmũ´ũn/Maxakali recusam radicalmente limites e padrões impostos pelo violento processo de colonização da região. Falam seu idioma, manejam remédios e venenos dos brancos, gastam seu dinheiro com fogos de artifício, cachaça e rituais quase diários, endividando-se em estabelecimentos comerciais que os exploram criminosamente. Mantém um corpus mítico-sonoro com dezenas de rituais e milhares de cantos que celebram e atualizam relações com seres encantados-cantores da Mata Atlântica-yãmĩy-, e descrevem, em experiências xamânicas dias e noites a fio, com exuberância de detalhes, animais, plantas, lugares e eventos que dão vida a seus territórios hoje contaminados e devastados por pastagens. As cidades e fazendas em torno-muitas delas antigas aldeias, onde os pajés ainda escutam cantos ressoando, indicando a presença de yãmĩy ancestrais-são hoje território de relações hostis e abusivas com comerciantes e fazendeiros. O desejo de estabelecer e alimentar alianças com esse aspecto à princípio invisível da alteridade, que se compõe com o costume de caminhar até locais antigos e novos, (re)encontrar parentes de outras etnias, aliados xamânicos-e seus cantos e saberes-, os próprios brancos-e a cachaça, o forró, o açúcar-, frequentemente faz com que grupos de Tikmũ´ũn saiam das aldeias e caminhem, por dias ou semanas, sob chuva ou sol, avançando por cercas e estradas, percorrendo seu território. Ao fim das viagens, como ao fim dos rituais, cantam lamentando de saudades. Palavras Chave: "Tikmũ´ũn/Maxakali";"Territorialidade";"Xamanismo";"Circulação" Os Tikmũ´ũn/Maxakali compõem seus modos de pensar e experimentar o mundo, sua produção e partilha de saberes, suas relações entre si, entre seus outros (fazendeiros, parentes, aliados), e com os lugares por onde passam e habitam, com as relações que estabelecem e atualizam com os yãmĩyxop (o sufixo xop funciona como um coletivizador e dinamizador), os "povos-cantores", ou "povos-encantados" que adensam seu universo. Ou seja, não há separação entre o que seria uma esfera religiosa e performática (seus rituais, seus cantos e danças, suas pinturas) e dimensões relativas a sua ciência, política, estética. Todo dia é dia de ritual, e todas as pessoas são pais e mães que alimentam e conduzem yãmĩy, donos de cantos. É com os yãmĩy que os Maxakali caçam, cantam, brincam e realizam curas, e realizam suas práticas de memória, seus percursos territoriais, seus conhecimentos sobre o mundo, seus modos de se relacionar e se transformar, sua produção de subjetividades (Guattari, 2012 [1992]). Os cantos são polifônicos em todos os 1
recherches amérindiennes au quebec, 2018
PROA
Este relato narra a experiência de concepção e construção da plataforma virtual "Mirando Mundos P... more Este relato narra a experiência de concepção e construção da plataforma virtual "Mirando Mundos Possíveis: (Re)Existir e Curar", que reúne uma série de produções audiovisuais realizadas por povos indígenas durante o período da pandemia. O mosaico de vídeos criado a partir desta experiência emerge como uma potente expressão de como povos indígenas, em sua multiplicidade, oferecem perspectivas igualmente múltiplas acerca deste momento dilatado de rupturas. A criação desta plataforma insere-se em meio à recente trajetória de formação da Rede CineFlecha, uma rede que articula diversos coletivos indígenas de cinema junto a seus parceiros não-indígenas.
Resumo: No Brasil, a pixação tem-se desenvolvido de modo expressivo, como arte política e margina... more Resumo:
No Brasil, a pixação tem-se desenvolvido de modo expressivo, como arte política e marginal, desde os anos 70. Essencialmente contestador, incômodo, o pixo não só destrói: essa escrita inaugura uma visibilidade dos que a fazem, compondo a paisagem urbana. Pixadores são punidos como vândalos, formadores de “quadrilha”, e a lei e demais medidas alimentam a discriminação em torno deles (distinguindo a pixação do “graffite”, por exemplo, tratando uma como arte e outra como puro vandalismo). Examinamos aqui seu modo refinado de conhecer e percorrer o território da cidade, e suas formas de organização, que nada têm de quadrilhas criminosas, aproximando-se mais de reuniões artísticas. A partir da experiência etnográfica compartilhada com pixadores em Belo Horizonte e demais capitais, traçamos referências históricas, registramos estilos caligráficos e tipos de mensagens. Num processo de ampliação do olhar, percebe-se a elaboração sofisticada de um discurso que protesta - por meio do risco - contra o próprio Estado, levando às últimas consequências o questionamento do poder de polícia, da circulação da informação, do direito de ir-e-vir e da propriedade privada.
Palavras Chave: Pixação. Arte política.
“PIXO”: The poetic politic of scratches and risks
Abstract:
In Brazil, “pixação” has developed significantly since the 70s, as a political outsider art – similar to tagging. Essentially challenging, uncomfortable, the “pixo” not only destroys: that writing opens a visibility, composing the urban landscape. “Pixadores” are punished as vandals from “gangs”, and Law and policies feed discrimination around them (distinguishing pixação from “graffiti”, for example, treating one as art and another as vandalism) , but we examine their refined way to meet and go through the territory of the city, and their forms of organization, which has nothing to do with criminal gangs, approaching more to artistic meetings. From the ethnographic experience shared with pixadores in Belo Horizonte and other capitals, we draw historical references, recorded calligraphic styles and types of messages. In a process of understanding, we see the development of a sophisticated speech protesting - through risk - against the state, leading to its ultimate consequences the questioning of police power, the circulation of information, the right to go up and come and private property.
Keywords: Pixação, Political Art.
Este trabalho de mestrado propõe, a partir de descrições etnográficas produzidas entre o povo Max... more Este trabalho de mestrado propõe, a partir de descrições etnográficas produzidas entre o povo Maxakali, um breve exame de sua recente realização cinematrográfica no contexto cosmopolítico percebido e produzido durante a formação de cineastas e a realização de filmes. Tento conciliar uma reflexão a respeito de ações cosmopolíticas Maxakali, partindo principalmente das contribuições do antropólogo Renato Sztutman, com entendimentos acerca do cinema como experiência estética e política, conforme nos propõe o filósofo Jacques Rancière, e como possibilidade de criação etnográfica compartilhada, como sugerido pelo etnólogo-cineasta Jean Rouch. O objetivo é apresentar uma etnografia dos processos de formação de cineastas e nos quais esses filmes são feitos: os momentos de negociação, elaboração, produção das imagens e dos encontros que essas imagens provocam, nos quais tal tecnologia é apropriada por eles em ressonância com seus próprios modos de pensamento e organização. Veremos de que modo os pajés e os caciques parecem ter encontrado um lugar que parece sugerir uma íntima aproximação entre linguagens e ações no âmbito da política, do xamanismo e do cinema. Afinal, o cinema parece apropriado para a experiência de eventos-encontros que se produzem nas aldeias, e para o estabelecimento de novas alianças e trocas de saberes fora delas.
Palavras-chave: Maxakali, Cosmopolítica, Cinema.
antropologia e o cinema, campos, para ele, inseparáveis. Sua obra e pensamento encontram repercus... more antropologia e o cinema, campos, para ele, inseparáveis. Sua obra e pensamento encontram repercussão nos dois domínios, sendo que sua extensa produção de filmes etnográficos-mais de 120 filmes, a maioria produzida na África ocidental-se sobrepõe, do ponto de vista dos rebatimentos posteriores, aos seus escritos.